Foi isso aí no título que me deu vontade de dizer quando comecei a ler, ver e ouvir as notícias sobre a operação Tempus Veritatis da Polícia Federal que, na antevéspera deste carnaval, fez desfilar perante o país inteiro o bloco desafinado de golpistas que esteve concentrado durante quatro anos no Palácio do Planalto.. Acho que o Brasil vai viver agora, tempos mais sossegados…
Uma dúvida que me assalta – perdão pelo lugar comum – é se a ideia de gravar a reunião golpista foi certeza de impunidade, só burrice mesmo, ou se o tenente coronel Mauro Cid é inteligente a ponto de ter decidido pela gravação pressentindo que aquilo era coisa de um grupo de trapalhões e já ir (opa, sem trocadilho) acumulando subsídios para a delação premiada que viria..
E olha que não foi a única. Em 5 de abril de 2020 já tinha sido gravada a famosa reunião do ministério que, entre outras barbaridades proferidas por vários ministros, mostrou o da Educação pedindo, pedagogicamente, a prisão dos ministros do STF…
Afinal, é preciso ter muita certeza de impunidade, ou muito pouca inteligência, para tramar um golpe numa reunião com mais de 20 pessoas, numa sala da sede do governo. E, ainda por cima, gravar todas as barbaridades ditas, como aquela do general Heleno propondo infiltrar agentes secretos nas campanhas eleitorais e a quem o então presidente e autocandidato a ditador respondeu com uma infantilidade maior ainda: não fale, general, … se pode vazar, vamos conversar em particular ali na nossa sala..
Falas gravadas e arquivadas para a posteridade, como aquela outra do general Heleno propondo atacar instituições e autoridades… Tudo isso gravado quando, desde o evento do Mensalão, a Polícia Federal apreende, quase semanalmente, celulares e computadores carregados de mensagens suspeitas, algumas que resultaram em prisão dos mensageiros…
Mas passou, não é mesmo? Não aconteceu o golpe. E eu acredito que esse temor todo, manifestado por tanta gente, desde a vitória do capitão Bolsonaro, em 2018, de que a extrema direita brasileira seria competente bastante e teria seguidores tantos que poderia dar um golpe de estado, finalmente, acabou.
E, se vê agora, o sonho deles de tomar o poder à força nunca esteve nem perto de ser consumado. Todo mundo já sabe, de cor e salteado, o que houve na reunião. Mas tem um detalhe que, parece, não recebeu o destaque merece: o então comandante do Exército, general Freire Gomes não aderiu ao movimento antidemocrático. Foi até chamado de cagão pelo golpista general Braga Neto… Como dar um golpe sem a participação do Exército? Ah! A Aeronáutica também não aderiu ao delírio bolsonarista.
Golpe sem tiro, como disse o Bolsonaro na tragicômica reunião? O golpe de 1964 também foi sem tiro… mas o Exército estava presente, nas ruas, em prontidão e as circunstâncias eram bem outras. No cenário, internacional, naqueles anos 60 do século passado, a guerra fria estava no auge, o comunismo era real, o mundo tinha passado pela famosa Crise dos Mísseis russos em Cuba que, por pouco, não descambou para um conflito nuclear..
Internamente, a mídia bombardeava o governo Jango, que prometia amplas reformas de base, Brizola, então governador do Rio Grande do Sul discursava contra os grandes interesses internacionais e tinha estatizado a companhia telefônica gaúcha, subsidiária da multinacional ITT.
A classe média nacional morria de medo do comunismo, o grande empresariado não queria ouvir falar de Jango, cuja posse, em 1961, em substituição ao renunciante Jânio Quadros, já fora uma concessão das forças armadas e da direita civil.
E hoje, pessoal? Que empresário importante, em algum momento, embarcou nesse barco do golpe? Que organização da sociedade civil se aliou aos golpistas? Que riscos claros de golpe corremos além do terrível quebra-quebra de 8 de janeiro de 23 quando aquela turba sem rumo, incentivada por falsos líderes escondidos no anonimato das redes sociais, quebrou o que pode em Brasília?
Então, pessoal, a tal extrema direita que teria ganho a eleição de 2018 e poderia até voltar ao poder em 2026 derreteu. Eu digo teria ganho a eleição porque, na verdade, quem deu a vitória à extrema direita foi o pessoal do voto nenhum/nem outro. Os que não queriam Bolsonaro, mas queriam menos ainda Lula…
Lembremos, se antes mesmo da operação Tempus Vetiratis, já tinha muita gente saindo da sombra bolsonarista – sentindo que a sombra era de nuvens de tempestade – rumo a outras legendas, imagine a debandada que vem por aí neste ano de eleição municipal… Quem vai querer aparecer na foto com o capitão inelegível? Com Valdemar Pepita de Ouro Costa Neto?
Acabou! Passou! Foi só um susto!
Alguém vai para a cadeia? Difícil saber. Mas uma pena eles vão cumprir: estarão na história como o mais atrapalhado grupo golpista do Brasil. E o capitão da reserva do Exército Jair Messias Bolsonaro será lembrado como protagonista de um governo cuja eleição foi, nas palavras dele mesmo, Bolsonaro, uma cagada. Uma cagada do bem, disse ele. Mas, digo eu, sempre terá sido um governo escatológico.
E, para quem acha que vivemos uma polarização de extremos, a oportunidade de abrir a terceira via está dada. Só não dá para vir atacando uma suposta extrema esquerda. Afinal, a extrema esquerda nunca passou nem perto do poder no Brasil. A esquerda progressista, sim. Como a direita civilizada, ou meia direita.
Antes de encerrar, uma sugestão: alguém por aí poderia enviar ao pessoal da Policia Federal um desses manuais de linguagem simples que alguns órgãos do governo usam para dar mais eficiência à comunicação pública.
Tudo bem… é chique usar essas expressões em Latim para nominar operações contra criminosos e suspeitos. Mas vamos combinar que poderiam ter sido criativos em português, não? Tempus veritatis quer dizer, literalmente, tempo da verdade. Então por que não foram direto de “Hora da Verdade”? Ou, para ser mais claro ainda e contemporâneo, quem sabe, “Perdeu, Golpista”?
Foto da Capa: Agência Brasil