As redes sociais, trincheiras onde se abrigam os golpistas para atacar as instituições democráticas e ameaçar autoridades, começam a ser ocupadas pela Justiça.
O Globo deste domingo, 24/11, informa sobre o julgamento, no Supremo Tribunal Federal, de ações que tratam da responsabilização das redes sociais pelos conteúdos publicados e criam regras para o funcionamento das plataformas.
Embora venha no rastro da operação da Polícia Federal que prendeu um grupo de militares do Exército – entre eles o general Mário Fernandes, ex-integrante do núcleo duro do governo de Jair Bolsonaro – e da conclusão do inquérito que indicia 37 bolsonaristas – Jair inclusive – por participação em atividades golpistas, o julgamento já estava pautado antes desses dois fatos.
A regulamentação das redes sociais e a criação de regras de responsabilização das plataformas pelo que cada uma publica, aliás, já poderiam estar em vigor. E só não existem por pressão da bancada conservadora no Congresso Nacional que, há muito, impede a votação do Projeto das Redes Sociais.
Esse projeto já teve até urgência para votação aprovada e o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira, chegou a criar uma comissão especial para apreciá-lo. Mas o texto, até hoje, dorme em alguma gaveta…
O argumento dos conservadores para não votar a regulamentação das plataformas é sempre o mesmo: a ameaça à liberdade de expressão. Fingindo defender um direito, confundem a opinião pública espalhando desinformação, ataques à democracia e incentivam golpes de estado que acabariam com todos os direitos de todos os cidadãos.
Não há um inquérito, entre todos esses abertos desde o advento do bolsonarismo para investigar tentativas de golpe, que não mostre – com abundância – a atuação de milícias digitais especializadas no uso de alguma dessas plataformas virtuais para a disseminação de mensagens antidemocráticas e ameaças golpistas.
Aproveitando essa falta de regulamentação, os golpistas nunca tiveram nenhum pudor em usar as redes para divulgar suas mensagens. Foi assim nos atentados em Brasília no 12 de dezembro de 2022, dia da diplomação de Lula. Foi assim para manter a manipulação coletiva dos que inchavam os acampamentos em frente a quartéis em todo o país. Era nas redes e pelas redes que pregavam o golpe.
Foi pelas redes, com uma forte crença na impunidade, que muitos confessaram – em fotos e vídeos – participação na invasão das sedes dos poderes em Brasília no 8 de janeiro de 23. E é pelas redes que se queixam dos julgamentos que levaram muitos para trás dos muros da Papuda.
Os processos em pauta no STF não dizem respeito direto à política. Um deles é até bem singelo. Uma dona de casa de São Paulo acionou a justiça para cobrar indenização porque teve o nome e a imagem usados para a disseminação de conteúdos ofensivos. Ganhou em primeira instância e o caso está no STF.
O resultado do julgamento terá, com certeza, influência na atuação dos ativistas virtuais. É coisa demorada, para ter fim no ano que vem ainda. Mas pode terminar com regras claras de responsabilização das plataformas pela transmissão de mensagens que firam qualquer regra legal. Já tivéssemos essas regras, os idealizadores do Plano Punhal Verde e Amarelo talvez pensassem melhor antes de se organizarem em grupos de mensagens e de trocar informações nas redes sociais.
A operação da PF desbaratando o grupo de Punhal Verde e Amarelo, a conclusão do inquérito das tentativas de golpe e a iminência da manifestação da Procuradoria Geral da República com a provável acusação aos indiciados deve arrefecer bastante o ânimo de eventuais golpistas e nos livrar, pelo menos por enquanto, de novos empurrões na Democracia.
A Polícia Federal mostra, com essas recentes operações, como é urgente a criação de regras para o funcionamento das plataformas da Internet. Existissem regras, o pessoal do general Mário Fernandes não teria tentado desembainhar o punhal.
Aliás, pensando em punhal e sem menosprezar o comportamento antidemocrático e a capacidade de executar um golpe dessa doentia direita, me parece que a trama esteve mais para comédia pastelão do que para golpe de estado com assassinato de autoridades.
Veja, mesmo entrincheirados nas redes sociais, os golpistas se deixaram identificar em documentos gravados, conversas e mensagens de celulares, impressão de documentos, nomes registrados em portarias de palácios…
Lembro aqui o que Gabeira questionou na Globo News. Eles planejaram a morte de Lula e Alckmin por envenenamento. Isso obrigaria a executar os dois ao mesmo tempo. Ou será que, envenenado Lula, o vice e seu entorno não tomariam nenhuma medida preventiva contra eventual tentativa de envenenamento?
E aqui pergunto eu: uso do punhal no título do malsucedido plano macabro é porque os golpistas pretendiam voltar ao tempo dos combates corpo-a-corpo da Primeira Guerra Mundial?
Muita gente tenta minimizar a gravidade do Plano Punhal Verde e Amarelo. O senador Flávio Bolsonaro diz, sem ficar vermelho, que pensar em matar não é crime… O senador cariucho general Mourão, ex-vice-presidente de Bolsonaro, por exemplo, disse – em conversa com Lauro Jardim, de O Globo – que escrever bobagem não é crime, mas também dá a medida da insanidade cometida pelo grupo preso na semana passada: fanfarronice.
Mas é fanfarronice só porque não deu certo. Felizmente, no Dia da Bandeira, a PF arriou a bandeira do general e seus seguidores.
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Foto da Capa: Gerada por IA