Seguidamente, sobretudo quando algum comentarista quer fazer alguma crítica negativa sobre o seu trabalho como treinador, Renato Portaluppi é chamado de o maior ídolo da história do Grêmio. Usam essa deferência para separar a sua importância como personagem do passado do clube do seu desempenho no presente.
Sempre que ouço esse elogio, fico tentado a dizer que há vários ídolos na história do Grêmio e nomear um como o maior não é tarefa tão simples. Quando o jornalista Adolfo Bloch foi entrevistar uma vez o poeta Carlos Drummond de Andrade, iniciou a conversa dizendo que estávamos diante do maior poeta brasileiro. Drummond perguntou se Bloch tinha trazido a fita métrica. Para o poeta mineiro, não tinha esse negócio de maior ou menor. Era impossível medir. Havia vários poetas de que gostava e cada um com suas qualidades e, mais do isso, com suas diferenças.
No futebol, é possível fazer um ranking objetivo. Talvez na poesia também se possa, contando o número de prêmios, o peso de uma outra distinção, a recepção crítica, mas, mesmo assim, as opiniões a partir de um determinado ponto começam a se dividir. Quem valoriza um tipo de realização elege um autor que se alinhe com essa sua visão estética. Quem valoriza outro aspecto prefere um outro.
Na objetividade do desempenho futebolístico, Renato foi campeão, como jogador pelo Grêmio, da Libertadores e do Mundial. Como treinador, também do tricolor gaúcho, conquistou a Copa do Brasil, a Libertadores, a Recopa Sul-americana, quatro campeonatos gaúchos de duas recopas gaúchas. É o treinador com mais jogos no comando do Grêmio.
De fato, somando sua atuação como jogador e treinador, ele se torna imbatível, pois o peso das conquistas, com um mundial e duas libertadores, torna o ídolo símbolo dos maiores triunfos do clube.
Mas há várias outras conquistas sem Renato, como a Libertadores com o Felipão, os títulos do campeonato brasileiro, um com Felipão e outro com Ênio Andrade como técnicos, as quatro outras Copas do Brasil, treinadas por Cláudio Duarte, Tite, Felipão e Evaristo de Macedo. Sem falar nos tantos títulos do Gauchão ao longo da história de cento e vinte anos do clube.
De minha parte, e creio que isso valha para outras pessoas, há uma dimensão afetiva. Os meus maiores ídolos do Grêmio são os jogadores do time campeão gaúcho de 1977. Do ponto de vista afetivo, o impacto se deve a ter sido a primeira taça que vi o tricolor erguer. E eu já estava com quatorze anos! O Inter era octacampeão gaúcho. Ou seja, desde os meus seis anos o Grêmio não ganhava. Como se não bastasse, o Inter era bicampeão brasileiro, com um time que tinha Falcão, Carpegiani, Batista, Dario, Valdomiro…
Em 77, derrotamos essa máquina colorada. O técnico: Telê Santana, o mesmo da seleção brasileira de 82, a mais cultuada depois da de 70, mesmo sem ganhar o título da Copa do Mundo. Os jogadores do tricolor: Corbo, Eurico, Oberdan, Ancheta, Ladinho, Vitor Hugo, Yura, Tadeu Ricci, Tarciso, André e Éder. Jogava com aquela consciência tática dos times do Telê, bola de pé em pé, com uma mecânica de jogo que deixava o adversário em apuros. Dava gosto de assistir.
Quem é mais velho ou mais moço do que eu deve ter seu time do Grêmio, ou do clube para o qual torce, com os jogadores e técnicos que são, afetivamente, seus maiores ídolos. Essa fita métrica, para usar a expressão do Drummond, é pessoal e intransferível.