O três de dezembro está marcado no calendário como Dia Internacional da Pessoa com Deficiência. A data, proposta pela ONU, busca conscientizar sobre direitos, como o acesso à educação, saúde e trabalho.
As pessoas com deficiência têm dificuldades para ter acesso a direitos básicos. Basta um degrau para impedir que uma pessoa em cadeiras de rodas entre um prédio. O direito de frequentar o espaço público pode ser tolhido quando a música alta expulse um autista da praia ou de um shopping. A falta de um tradutor de Libras traz dificuldades para a consulta médica de uma pessoa surda que faça uso daquela língua. A exclusão também vem das atitudes das pessoas presentes nesses ambientes.
Na “minha bolha” das redes sociais, onde estão muitas pessoas ligadas de alguma forma à causa da inclusão, o assunto principal nessa semana de reflexão foi o menino autista que não compareceu à formatura escolar por não haver sido comunicado da solenidade.
O assunto me tocou muito, pois sou pai de um autista. Meu filho tem hoje 20 anos e está cursando jornalismo. Mas o trajeto nas escolas foi cheio de dificuldades, como de tantos outros e outras que conheci em meu caminho. Eu aprendi com ele o que é “ser esquecido”. Ser deixado de lado do grupo dos pais do whatts app ou ter que mover montanhas para saber o que seria necessário levar para as atividades escolares.
Isso, sem falar no e-mail. Passei literalmente por isso. Ser acusado de falta de interesse por… não ter lido um e-mail. Ir diariamente à escola levar e buscar o filho, participar de uma ou mais reuniões com a coordenação todos os meses, nada disso era suficiente. Afinal, não havíamos respondido um e-mail.
Quando ouvi que a escola do Distrito Federal e muitas pessoas nas redes estavam acusando a família de não ter prestado atenção em um e-mail, foi como se passasse um filme em minha cabeça. As diversas situações de culpabilização das famílias por falhas que não são delas. A rotina de culpar as famílias é seguido pelo ritual de culpabilização materna, uma solução à mão para quase qualquer situação e que termina com a mãe sendo jogada à fogueira.
Com o sacrifício da mãe, tal qual um bode expiatório, purgam-se todos os pecados da comunidade. Esqueçam da falta de rede de apoio, da falta de atividades adequadas na escola, nas vezes em que uma aflição real foi tratada como birra, de quando a criança implorava por acolhimento e era punida. Resolve-se tudo com o apedrejamento moral da mãe do aluno ou aluna.
Transferir a culpa para o lado mais fraco da corda é fácil como fazer um pix. Ainda me espanto com a rapidez que as famílias e mães são condenadas assim como com os raros pedidos de desculpas de escolas e outras instituições. As notas oficiais poderiam só pedir desculpas e dizer que vão rever procedimentos daqui para a frente, mas, ao contrário, desfiam autoelogios, falam dos valores que supostamente cultuam e, por fim, dizem que tem vários casos de sucesso de inclusão.
Ou seja, mais uma vez, a culpa é do aluno, da mãe ou da família. Ou de todos juntos, que não estavam à altura de uma escola tão inclusiva.
Não é raro que as famílias, além do processo de exclusão, ainda sofram a acusação de estarem sendo injustas com a escolas e que não deveriam reclamar tanto assim. Nesses, ainda ecoa a ideia de que a inclusão é um favor, não um direito.
Nas redes sociais e na vida, quando uma situação dessas ocorre, dezenas de outros casos vem à tona. De exclusões em atividades da escola, sejam formaturas ou passeios. De bullying, de agressões protagonizados por colegas, mas, também, por professores. Quando a história da minha família saiu na imprensa, dezenas de pessoas me procuraram para relatar situações semelhantes que enfrentaram.
O debate surge dessa repercussão pública, de fatos que se repetem no cotidiano, mas que são invisíveis para quem não os vive. Diante do ultraje gerado pelos reiterados casos de racismo e xenofobia em caros colégios particulares, pais e educadores apontaram a necessidade de uma maior diversidade no ambiente escolar. Eu, particularmente, acredito que isso seja parte da solução. Mas, por favor, abram as portas e façam isso funcionar. Não basta só mandar um e-mail.