Já falei em algum dos meus escritos por aqui que uma das grandes lições que o tempo me ensinou foi do quanto são ineficazes e tolas as nossas convicções. Junto com esse aprendizado, veio o de que afirmações que incluem elementos totalizantes são facílimas de desmontar. A menos que se trate de uma hipérbole, qualquer frase que se baseie em sempre, nunca, tudo, nada vale tanto quanto uma nota de três reais.
Lembro de como era mais fácil minha vida quando eu tinha muitas certezas. Se alguém discordava de mim, costumava ganhar quando não meu desprezo, minha condescendência. E eu saía do encontro me achando mais inteligente, mais capaz, mais observadora, mais culta. Enfim, eu me achava melhor do que o outro. Hoje, sei que certamente não sou “essa Coca-Cola toda”, mas me sinto mais sábia. (Ou no mínimo menos insuportável.)
Tive a sorte de ter tido um pai que me ensinou o valor de uma boa discussão, especialmente aquela em que há contraditório. Ele me ensinou na prática a defender minhas ideias, a me abastecer de informações e argumentos, a encontrar as fragilidades na argumentação contrária. Mas também deixava claro que não havia problema algum em mudar de ideia, em capitular diante de um raciocínio mais convincente. “Em um bom debate”, dizia ele, “todo mundo ganha.” Como morreu quando eu mal havia completado 22 anos, ele não estava aqui para ver quando finalmente compreendi a grande verdade disso.
Pena que os bons debates estejam rareando
Ao menos nas redes sociais, vivemos em um mundo cada vez mais em preto e branco, onde se confunde debate com embate e contraditório com ofensa, e o respeito pela individualidade alheia só existe se obedecer às regras específicas que escolhi seguir. As agressões contra os discordantes são onipresentes em qualquer lado do espectro ideológico e se apresentam das mais diversas formas. Há desde a violência física, crua, bárbara até a psicológica, mais difícil de comprovar e, portanto, combater.
Das muitas teimosias que carrego rumo ao meio século de existência, destaco a insistência em acreditar que todo debate é válido. Por isso, não é raro que eu ainda procure contra-argumentar quando ouço, vejo ou leio a defesa de algo que considero equivocado. Com respeito, com embasamento, com escuta ativa. Ao contrário do que costumava fazer quando mais jovem, não entro mais na discussão para vencê-la ou ser derrotada, mas para ver que tipo de aprendizado posso tirar dela. Infelizmente, num mundo repleto de causas intransigentes, identidades pétreas e convicções inflexíveis, esse exercício tem se mostrado crescentemente infrutífero.
“É cansativo”, ouço com frequência dos conhecidos e amigos que compartilham comigo esse gosto pelas trocas intelectuais. O efeito disso é o silenciamento sistemático de quem gosta de debater. Ou a circunscrição dos debates a grupos selecionados, em que um dos tópicos mais frequentes, infelizmente, é “pena que não podemos levar isso ‘lá para fora’”. E a autocensura vira o abrigo dos covardes (ou, vá lá, dos sensatos).
Foto da Capa: Cottonbro Studio/Pexels/editada