Ainda no calor das comemorações pelo Oscar ao filme “Ainda estou aqui”, começam a surgir as primeiras manifestações dos defensores da ditadura militar.
Ousam comparar os presos, torturados e assassinados pela ditadura militar, com os “livres pensadores”, que foram para as ruas quebrar a capital federal, literalmente, em 8 de janeiro de 2023.
O que é tão bem retratado no maravilhoso, didático e indispensável filme de Walter Salles, baseado no livro de Marcelo Rubens Paiva, é a tenebrosa realidade dos anos de chumbo.
O Estado Militar, por meio de órgãos oficiais como DOPS, DOI CODI, Cenimar, etc., promoveu por longos anos o extermínio por tortura e assassinatos de centenas de brasileiros, inclusive do deputado Rubens Paiva, com sua história retratada no filme agora oscarizado.
Vivi naquela triste época, perdi um querido amigo assassinado pela ditadura: Luiz Eurico Tejera Lisboa, com 24 anos. Susana, sua esposa, teve mais sorte que Eunice Paiva, conseguiu achar os ossos de seu companheiro numa vala comum em Perus…
Por anos, a ditadura militar eliminou os que lutavam por liberdade, por democracia. Muitos pagaram com a vida para que os meliantes de 08 de janeiro pudessem acampar em frente aos quartéis, gritando por golpe de estado… Eu fui corrida com cacetetes por estar num jipe, a uma quadra de um quartel em Santa Maria, cantando a música de Vandré: “Vem vamos embora que esperar não é saber / quem sabe faz a hora não espera acontecer…” Há quem ache que este verdadeiro hino à liberdade caiba agora aos meliantes de 08 de janeiro. Por favor, respeito à história!
Nas pesquisas efetuadas pela Comissão da Verdade, chegou-se ao número de 434 pessoas mortas e desaparecidas nos porões dos quartéis e órgãos de repressão! Ao longo do período em que durou a ditadura militar (1964/1985), o estado prendeu, torturou, sequestrou e estuprou milhares de brasileiros (estimados em 30 mil)!
As maldades foram terríveis, desde arrancar mamilos e unhas com alicate, estupros com tacos de beisebol, arame farpado, amassamento de testículos, etc… a mente insana de Ustra e seus seguidores não tinha limites para as atrocidades praticadas, como colocar crianças de 4 anos de idade na mesma cela que a mãe, torturada, espancada e nua!
No filme ‘Ainda estou aqui’, vimos uma adolescente ser presa… e isso não era raro!
Eunice Paiva passou a vida procurando os ossos de seu marido para lhe dar uma sepultura digna, não conseguiu, mas sua luta não foi em vão.
Este filme é obrigatório, todos precisam saber o que a ditadura militar fez em nosso país para que os assassinatos, sequestros e torturas nunca mais se repitam.
Devem ser repudiadas todas e quaisquer comparações entre os presos e torturados da ditadura militar e os presos de 8 de janeiro, que tiveram processos legais, advogados colocados inclusive pela OAB, direito de defesa.
DITADURA NUNCA MAIS!!!
Bernadete Laú Kurtz é advogada trabalhista, ex-conselheira estadual da OAB/RS; ex-presidente da Associação Gaúcha da Advocacia Trabalhista (AGETRA); Membro da Associação Americana de Juristas; Foi uma das fundadoras da Associação Brasileira da Advocacia Trabalhista (ABRAT) presidente da entidade na gestão 2022/2024.
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Foto da Capa: Acervo de Família