Ao escrever abuso das perguntas, gosto da frase que antecede o ponto, para organizar um texto, uma ideia e também gosto de trazer gente, cito mulheres, professores, cantoras, educadores, artistas, filósofos. Somos feitos de muita gente.
E aqui, quem escreve é uma pessoa de branca pele e é disso que este texto se propõe: precisamos falar sobre branquitude.
“Colocar o branco em questão” é uma frase da obra “Entre o encardido, o branco e o branquíssimo: Branquitude, Hierarquia e Poder na Cidade de São Paulo”, de Lia Vainer Schucman, psicóloga social e professora, uma mulher de branca pele como eu e é por ela que me utilizo das referências para esta escrita. É de 1935, no ano em que a Lei de Segurança Nacional é sancionada pelo então presidente Getúlio Vargas, no ano da primeira cerveja em lata posta à venda nas estantes de um mercado em uma cidade de poucos habitantes no estado de Virgínia, nos Estados Unidos, no ano em que nasceu o rebolativo Elvis Presley, que se identifica o primeiro texto a colocar a branquitude no centro da discussão.
William Edward Burghardt Du Bois sociólogo, historiador, autor e editor norte-americano, escreveu e publicou a obra “Black Reconstruction in America”, que analisa e identifica a apropriação de benefícios, a partir do reconhecimento da divisão de raças, pela classe branca trabalhadora, ou seja, um olhar, um identificar, um reconhecer o racismo como ferramenta de deslocamento de “status”, da sobreposição a partir da diferença, da não igualdade como forma de absorver para si privilégios. Conceituar a branquitude parte do desconforto de assumir que somos frutos, hoje abacaxis ou laranjas, de um ontem (será ontem?) semear em racistas e preconceituosas terras.
Há uma importância em nomearmos as coisas, dar legitimidade e reconhecimento de existência e aqui, quanto à branquitude, não se trata de uma ou outra definição, mas de uma encruzilhada de elementos que justificam uma determinada posição e, especificamente no sentido etimológico da palavra, ou seja, lugar onde o corpo ocupa.
A branquitude como lugar a partir do outro é conceito encontrado nas ideias de Toni Morrison, escritora, editora e professora no livro “Playing in the Dark. Whiteness and the Literary Imagination” de 1992, em que ela usa a expressão unlikeness – dessemelhança, descrevendo a branquitude como uma identidade dependente, ou seja, um vínculo, um “a partir de quem”, através da exploração do ‘Outro’. E essa identidade, a compreensão sobre essa identidade, sobre esse conceito, sobre o branco, não no ser branco, mas no branco como lugar de estar, esse deslocamento de ser e de estar, está nas respostas, tudo está nas respostas.
Eu gosto de perguntas, lembra? Então, cá estão as perguntas e que te convido, com afeto, a responder. No cargo que você ocupa, quantas pretas pessoas já estiveram exercendo a mesma função? Quantas pretas pessoas exercem a profissão que você exerce e que você conhece? Qual a cor da pessoa que te indicou para você estar no cargo em que você está? Qual a cor da pessoa que investiu no seu negócio? Você já foi chefiado por uma preta pessoa? Qual a cor da sua líder de equipe? Qual a cor da líder ou do líder da sua escola/colégio/faculdade? Se responder foi desconfortável, obrigada. Foi para isso que esse texto foi escrito.
Chris Baladão, bicho raro, formada e por coração advogada, na época em que o curso levava sociais em seu nome, escritora por necessidade de expor a palavra, bailarina porque o corpo exige, professora porque a experiência da vida precisa ser compartilhada.