Acabei de ler a biografia de Kleiton e Kledir. Foi escrita pelo jornalista e fã Emílio Pacheco e lançada pela editora Bestiário.
Já li as biografias de Chet Baker, Paul McCartney, Bob Dylan, pra citar a de alguns músicos. E também os volumes da coleção O livro do disco, da editora Cobogó, dedicados a Nara Leão e ao Jorge Benjor. Todos trabalhos excelentes, recompondo os ambientes de formação dos artistas, contextos históricos e estéticos, sempre ampliando a visão que temos desses grandes talentos.
Mas a dos guris me tocou de perto. Sim, geograficamente, pois a trajetória musical do início, com o grupo Almôndegas, se deu em grande parte em Porto Alegre. Mas também com uma proximidade geracional, embora eu tenha dez anos a menos do que o Kledir e doze a menos do que o Kleiton.
Contudo, os pilares da minha geração estão na dos dois. A contracultura vivida a partir do extremo sul do Brasil. A ditadura militar, hoje chamada de civil-militar, a redemocratização. O apogeu da MPB, a criação de uma cena e de uma música local, gaúcha e porto-alegrense, a virada para o rock dos anos oitenta.
Tudo isso vivido intensamente por eles também foi vivido, ao meu modo, por mim. Fui lendo e pensando “ah, nesse ano, eu estava na sexta série, no colégio Presidente Roosevelt; nesse outro, no primeiro ano do segundo grau, no Infante Dom Henrique; agora já estava no vácuo, no ano em que me diverti à beça, pois terminei o segundo grau em 1980 e só fui entrar na UFRGS, na Letras, em 1982.
O que estavam fazendo os irmãos K&K em 82? Shows por todo o Brasil, colhendo os frutos do sucesso do primeiro e do segundo discos lançados por eles. Na verdade, tinham já dez anos de estrada e de composição para chegar a um tipo de música que abordava os ritmos gaúchos, latino-americanos, a mpb e o rock de uma forma própria.
Também me tocou o caminho cheio de altos e baixos que uma carreira, mediada pelo temperamento e o amadurecimento de cada um, tem. Além das trajetórias individuais, que renderiam duas outras biografias, corre em paralelo a história recente da indústria do disco, do mercado da música. Do apogeu dos grandes investimentos, das vendagens de cem mil cópias, das gravações em estúdios nos Estados Unidos ao cenário totalmente independente na produção contemporânea.
Por fim, em nenhuma das biografias outras que citei acima, consta meu nome. Na de Kleiton e Kledir, lá estou eu numa parceria com o primo dos Ramil, Pery Souza, Planeta Poft, no cd Par ou Ímpar da dupla. Também em outras duas parcerias com o Kleiton, Ovo e Coro, citadas no livro, que estão no seu Spotify.
E, pra matar a saudade, ou melhor, para reavivar esse tempo registrado no livro, dia 24 de março tem show dos Almôndegas no Araújo Vianna, em Porto Alegre, com Kleiton, Kledir, Gilnei, Quico, João Baptista e Zé Flávio. Eu vou!