Nas palavras da lei que Regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, Lei de Recuperação de Empresas e Falência (LREF), “A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.”.
Requisitos para que o devedor possa requerer a recuperação judicial
O devedor deverá, no momento do pedido, exercer regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e, atender aos seguintes requisitos, cumulativamente:
I – não ser falido e, se o foi, deverão estar extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;
II – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, se beneficiado da concessão de recuperação judicial;
III – não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial;
IV – não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos na LREF.
Também poderão requerer a recuperação judicial o cônjuge sobrevivente, os herdeiros do devedor, o inventariante ou o sócio remanescente.
Na recuperação judicial de companhia aberta, ou seja, aquela Sociedade Anônima que tem suas ações ou debentures negociadas em Bolsa de Valores ou no mercado de Balcão, será obrigatória a formação e o funcionamento de um conselho fiscal, enquanto durar a fase da recuperação judicial, e deverá ser considerado também o período de cumprimento das obrigações assumidas pelo plano de recuperação.
Sujeição à recuperação judicial dos créditos existentes na data do pedido, ainda, que não vencidos
Vale salientar que os credores do devedor em recuperação judicial conservarão seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.
As obrigações anteriores à recuperação judicial deverão respeitar as condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que concerne aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial.
Embora a lei mencione a sujeição de todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, nos casos de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias, ou de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio, seu crédito não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial e prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais, observada a legislação respectiva. Entretanto, nessas hipóteses, não se permitirá a venda ou a retirada do estabelecimento do devedor dos bens de capital essenciais a sua atividade empresarial, durante os prazos de suspensão do curso da prescrição das obrigações do devedor, da suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência; e da proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.
Nos casos de créditos que decorram exclusivamente da atividade rural deverão ser observados algumas condicionantes legais específicas.
Meios de recuperação judicial
Constituem meios de recuperação judicial
“I – concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;
II – cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;
III – alteração do controle societário;
IV – substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;
V – concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;
VI – aumento de capital social;
VII – trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;
VIII – redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;
IX – dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;
X – constituição de sociedade de credores;
XI – venda parcial dos bens;
XII – equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;
XIII – usufruto da empresa;
XIV – administração compartilhada;
XV – emissão de valores mobiliários;
XVI – constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.
XVII – conversão de dívida em capital social
XVIII – venda integral da devedora, desde que garantidas aos credores não submetidos ou não aderentes condições, no mínimo, equivalentes àquelas que teriam na falência, hipótese em que será, para todos os fins, considerada unidade produtiva isolada.”
Em caso de venda de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia.
Do Plano de Recuperação Judicial
Em caso de Recuperação Judicial, deverá ser apresentado em juízo pelo devedor, o “plano de recuperação”, no prazo improrrogável de 60 (sessenta) dias da publicação da decisão que deferir o processamento da recuperação judicial, sob pena de transformá-la em falência.
O plano de recuperação deverá conter:
I – discriminação pormenorizada dos meios de recuperação a ser empregados, conforme o art. 50 desta Lei, e seu resumo;
II – demonstração de sua viabilidade econômica; e
III – laudo econômico-financeiro e de avaliação dos bens e ativos do devedor, subscrito por profissional legalmente habilitado ou empresa especializada.
Após o recebimento do plano de recuperação, o juiz ordenará a publicação de edital contendo aviso aos credores sobre o recebimento do plano de recuperação e fixando o prazo para a manifestação de eventuais objeções.
Importante destacar que o plano de recuperação judicial não poderá prever prazo superior a 1 (um) ano para o pagamento dos créditos trabalhistas ou decorrentes de acidentes de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial.
O plano não poderá, ainda, prever prazo superior a 30 (trinta) dias para o pagamento, até o limite de 5 (cinco) salários-mínimos por trabalhador, dos créditos de natureza estritamente salarial vencidos nos 3 (três) meses anteriores ao pedido de recuperação judicial. Este prazo poderá ser ampliado em até 2 (dois) anos, se o plano de recuperação judicial atender aos seguintes requisitos, cumulativamente
I – apresentação de garantias julgadas suficientes pelo juiz;
II – aprovação pelos credores titulares de créditos derivados da legislação trabalhista ou decorrentes de acidentes de trabalho;
III – garantia da integralidade do pagamento dos créditos trabalhistas.
Do Procedimento de Recuperação Judicial
Os credores, ainda que individualmente, poderão, dentro do prazo legal, manifestar ao juiz sua objeção ao plano de recuperação
Se houver, por parte de qualquer credor, objeção ao plano de recuperação judicial, o juiz convocará a assembleia-geral de credores para deliberar sobre o plano de recuperação, o qual poderá sofrer alterações desde que haja expressa concordância do devedor e em termos que não impliquem diminuição dos direitos exclusivamente dos credores ausentes.
Se houver a rejeição do plano de recuperação judicial, o administrador judicial submeterá, no ato, à votação da assembleia-geral de credores a concessão de prazo de 30 (trinta) dias para que seja apresentado um plano de recuperação judicial pelos credores. Este prazo deverá ser aprovado por credores que representem mais da metade dos créditos presentes à assembleia-geral de credores.
Para que o plano de recuperação judicial, proposto pelos credores, seja submetido à votação, deverão ser cumpridas, de forma cumulativa, as condições legais exigidas pela LREF.
Atendidas as condições estabelecidas na LREF, o juiz concederá a recuperação judicial do devedor cujo plano não tenha sofrido objeção de credor, ou que tenha sido aprovado pela assembleia-geral de credores.
Cumpre informar que mesmo que o plano submetido à assembleia não tenha sido aprovado, o juiz poderá conceder a recuperação judicial, desde que, na mesma assembleia, tenha ocorrido, de forma cumulativa:
I – o voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à assembleia, independentemente de classes;
II – a aprovação de 3 (três) das classes de credores ou, caso haja somente 3 (três) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 2 (duas) das classes ou, caso haja somente 2 (duas) classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 (uma) delas;
III – na classe que o houver rejeitado, o voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores.
Rejeição do plano de recuperação e transformação em falência
Em caso de rejeição do plano de recuperação, o juiz irá transformar a recuperação judicial em falência. A provado o plano de recuperação judicial, haverá a novação dos créditos, isto é, as dívidas antigas serão transformadas em dívidas novas.
O juiz tem o poder de determinar a manutenção do devedor em recuperação judicial até que ocorra o cumprimento de todas as obrigações previstas no plano de recuperação que vencerem até, no máximo, 2 (dois) anos depois da concessão da recuperação judicial, independentemente do eventual período de carência. Todavia, durante esse período, o descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano acarretará a transformação da recuperação em falência.
Caso seja decretada falência, os credores terão seus direitos e garantias reconstituídos nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação judicial.
Outrossim, após a decretação da recuperação judicial, qualquer credor poderá no caso de descumprimento de qualquer obrigação prevista no plano de recuperação judicial, requerer a execução específica da obrigação inadimplida ou a falência.
Cumprimento das obrigações previstas no plano de recuperação judicial
Ocorrendo o cumprimento das obrigações previstas no plano de recuperação, o juiz decretará por sentença o encerramento da recuperação judicial, determinará o pagamento do saldo dos honorários do administrador judicial.
Art. 63. Cumpridas as obrigações vencidas no prazo previsto no caput do art. 61 desta Lei, o juiz decretará por sentença o encerramento da recuperação judicial e determinará:
I – o pagamento do saldo de honorários ao administrador judicial, III do caput deste artigo;
II – a apuração do saldo das custas judiciais a serem recolhidas;
III – a apresentação de relatório circunstanciado do administrador judicial, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, versando sobre a execução do plano de recuperação pelo devedor;
IV – a dissolução do Comitê de Credores e a exoneração do administrador judicial;
V – a comunicação ao Registro Público de Empresas e à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia para as providências cabíveis
Destaque-se que o encerramento da recuperação judicial não dependerá da consolidação do quadro-geral de credores.
Condução da atividade empresarial durante a recuperação judicial
Durante o período de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores poderão ser mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial, salvo se qualquer deles:
I – houver sido condenado em sentença penal transitada em julgado por crime cometido em recuperação judicial ou falência anteriores ou por crime contra o patrimônio, a economia popular ou a ordem econômica previstos na legislação vigente;
II – houver indícios veementes de ter cometido crime previsto nesta Lei;
III – houver agido com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credores;
IV – houver praticado qualquer das seguintes condutas:
a) efetuar gastos pessoais manifestamente excessivos em relação a sua situação patrimonial;
b) efetuar despesas injustificáveis por sua natureza ou vulto, em relação ao capital ou gênero do negócio, ao movimento das operações e a outras circunstâncias análogas;
c) descapitalizar injustificadamente a empresa ou realizar operações prejudiciais ao seu funcionamento regular;
d) simular ou omitir créditos ao apresentar a relação nominal dos credores
em relevante razão de direito ou amparo de decisão judicial;
V – negar-se a prestar informações solicitadas pelo administrador judicial ou pelos demais membros do Comitê;
VI – tiver seu afastamento previsto no plano de recuperação judicial.
Ocorrendo qualquer das hipóteses acima, o juiz destituirá o administrador, que será substituído na forma prevista nos atos constitutivos do devedor ou do plano de recuperação judicial.
Na circunstância do afastamento do devedor da condução da atividade empresarial o juiz convocará a assembleia-geral de credores para deliberar sobre o nome do gestor judicial que assumirá a administração das atividades do devedor, aplicando-se-lhe, no que couber, todas as normas sobre deveres, impedimentos e remuneração do administrador judicial.
O administrador judicial deverá ser um profissional idôneo, preferencialmente, advogado, economista, administrador de empresas ou contador, ou pessoa jurídica especializada.
O administrador judicial, sob fiscalização do juiz e do Comitê, deverá, dentro outros deveres que a LREF lhe impõe:
a) enviar correspondência aos credores, comunicando a data do pedido de recuperação judicial ou da decretação da falência, a natureza, o valor e a classificação dada ao crédito;
b) fornecer, com presteza, todas as informações pedidas pelos credores interessados;
c) dar extratos dos livros do devedor, que merecerão fé de ofício, a fim de servirem de fundamento nas habilitações e impugnações de créditos;
d) exigir dos credores, do devedor ou seus administradores quaisquer informações;
e) elaborar a relação de credores;
f) consolidar o quadro-geral de credores;
g) requerer ao juiz convocação da assembleia-geral de credores nos casos previstos nesta Lei ou quando entender necessária sua ouvida para a tomada de decisões;
h) contratar, mediante autorização judicial, profissionais ou empresas especializadas para, quando necessário, auxiliá-lo no exercício de suas funções;
i) manifestar-se nos casos previstos nesta Lei;
j) estimular, sempre que possível, a conciliação, a mediação e outros métodos alternativos de solução de conflitos relacionados à recuperação judicial respeitados os direitos de terceiros
k) manter endereço eletrônico na internet, com informações atualizadas sobre os processos de falência e de recuperação judicial, com a opção de consulta às peças principais do processo, salvo decisão judicial em sentido contrário;
l) manter endereço eletrônico específico para o recebimento de pedidos de habilitação ou a apresentação de divergências, ambos em âmbito administrativo, com modelos que poderão ser utilizados pelos credores, salvo decisão judicial em sentido contrário;
m) providenciar, no prazo máximo de 15 (quinze) dias, as respostas aos ofícios e às solicitações enviadas por outros juízos e órgãos públicos, sem necessidade de prévia deliberação do juízo:
- fiscalizar as atividades do devedor e o cumprimento do plano de recuperação judicial;
- requerer a falência no caso de descumprimento de obrigação assumida no plano de recuperação;
- apresentar ao juiz, para juntada aos autos, relatório mensal das atividades do devedor, fiscalizando a veracidade e a conformidade das informações prestadas pelo devedor;
- apresentar o relatório sobre a execução do plano de recuperação;
- fiscalizar o decurso das tratativas e a regularidade das negociações entre devedor e credores;
- assegurar que devedor e credores não adotem expedientes dilatórios, inúteis ou, em geral, prejudiciais ao regular andamento das negociações;
- assegurar que as negociações realizadas entre devedor e credores sejam regidas pelos termos convencionados entre os interessados ou, na falta de acordo, pelas regras propostas pelo administrador judicial e homologadas pelo juiz, observado o princípio da boa-fé para solução construtiva de consensos, que acarretem maior efetividade econômico-financeira e proveito social para os agentes econômicos envolvidos;
- apresentar, para juntada aos autos, e publicar no endereço eletrônico específico relatório mensal das atividades do devedor e relatório sobre o plano de recuperação judicial, no prazo de até 15 (quinze) dias contado da apresentação do plano, fiscalizando a veracidade e a conformidade das informações prestadas pelo devedor, além de informar eventual ocorrência das condutas que autorizam o afastamento do devedor da condução das atividades empresariais.
O administrador judicial será alguém nomeado pelo juiz, e exercerá as funções de gestor enquanto a assembleia-geral não deliberar sobre a escolha do novo gestor.
Se o gestor indicado pela assembleia-geral de credores, recusar ou estiver impedido de aceitar o encargo para gerir os negócios do devedor, o juiz convocará, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, contado da recusa ou da declaração do impedimento nos autos, nova assembleia-geral.
Frise-se que após a distribuição do pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar bens ou direitos de seu ativo não circulante, salvo mediante autorização do juiz, depois de ouvido o Comitê de Credores, se houver, com exceção daqueles previamente autorizados no plano de recuperação judicial
Do Financiamento do Devedor e do Grupo Devedor durante a Recuperação Judicial’
Durante a recuperação judicial, o juiz poderá, ouvido o Comitê de Credores, autorizar a celebração de contratos de financiamento com o devedor, garantidos pela oneração ou pela alienação fiduciária de bens e direitos, seus ou de terceiros, pertencentes ao ativo não circulante, para financiar as suas atividades e as despesas de reestruturação ou de preservação do valor de ativos.
Como dito no início do artigo, essa é uma visão sucinta, para que pessoas não familiarizadas com o mundo do direito, possam ter uma ideia do que se trata a recuperação judicial, tão falada nos noticiários das últimas semanas, que saliento admite inclusive a forma extrajudicial, que dependerá de homologação judicial