Quando eu assisti o comercial “Respeito na Medida”, do Açúcar Guarani, fiquei impressionado com o experimento social feito por eles e recomendo que você também assista clicando nesse link ou na imagem no fim do texto. Num primeiro momento, é perguntado para quatro adultos o nome de doces tradicionais que conhecemos e eles identificam tendo boas lembranças dos seus tempos de criança e de hoje fazerem para seus filhos e netos. Eles se deliciam comendo Maria Mole, Espera Marido, Nega Maluca e Teta de Nega. Depois entram no recinto as crianças e é perguntado a elas “que doce é esse”? Elas identificam o doce pelo conteúdo e então são convidadas a inventarem um nome para o doce que comeram. A Maria Mole recebeu o nome de “Quadrado de Coco”, a Nega Macula foi batizada de “Delícia de Chocolate”, o Espera Marido ganhou o nome de “Gravatinha de Coco” e a Teta de Nega se transformou em “Nuvenzinhas de Chocolate”. O mais legal foi ver a reação das crianças quando souberam os nomes que atribuímos para estes doces. Uma menininha se surpreende e pergunta: “Que nome é este, Espera Marido? A gente tem que esperar o marido para comer este doce?”. As crianças não gostam dos nomes tradicionais e não entendem por que demos esses nomes e que achamos tão normais. Finalmente, os adultos concordam que os nomes atribuídos pelas crianças fazem muito mais sentido.
O que faz estas crianças perceberem estes “preconceitos adocicados”? E por que até hoje utilizamos estes nomes racistas e machistas? Penso que esta nova geração vem despida dos preconceitos que a minha geração herdou dos nossos pais. Lembrei que os meus antepassados costumavam “pegar para criar” crianças pobres, geralmente negras, que na prática, eram empregados que trabalhavam full time em troca de cama e comida. Hoje seriam considerados escravos, mas na época se dizia quer eram membros da família ou eram afilhados dos patrões. Não estou falando do período da escravidão no Brasil, mas sim de como nos comportávamos 50 anos atrás, ou talvez bem menos do que isto. Eu cresci achando tudo isto normal. Ninguém se considerava racista, desde que os negros soubessem o lugar deles. Ninguém questionava o machismo existente, porque na cultura da época as mulheres da classe média ficavam em casa cuidando da casa, dos filhos e esperando o marido chegar. Talvez venha daí o nome do doce “Espera Marido”. Lembro que algumas mulheres usavam o CPF do marido, afinal, para que elas precisavam de CPF próprio?
Quem está na faixa dos 50, 60 ou 70 anos viveu ou conheceu as situações que mencionei. Algumas pessoas da minha geração superaram os preconceitos ou estão em fase de desconstrução. Outras não, ainda hoje transmitem aos filhos antigos preconceitos e ideias retrógradas, chamam isto de “preservar os valores familiares”.
Quando vivi na Alemanha entendi como foi que o país se livrou do nazismo. Ao final da guerra, a Alemanha derrotada continuava nazista. Foi a escola que mostrou à nova geração os horrores do nazismo, que levou as crianças para visitar campos de concentração e verem o que os seus antepassados fizeram com outros seres humanos. Contrariando a opinião de muitos pais, a escola ensinou que não existia supremacia da “raça ariana”. Óbvio que ainda existem extremistas nazistas, mas a grande parte da população alemã se envergonha desta parte da sua história.
Acho que faltou uma escola que ensinasse para a minha geração o que é o racismo, machismo e outros preconceitos. Na escola aprendi que em 1888 a Princesa Isabel libertou os escravos. Nunca visitamos uma comunidade quilombola ou assistimos filmes que mostrassem o Brasil como maior escravocrata do mundo e o último país a abolir a escravidão. Lembro apenas da “Escrava Isaura”, “A cabana do Pai Tomás e outras novelas da Globo que romantizavam a relação dos escravocratas com os escravos.
A escola, em qualquer lugar do mundo, tem o papel de formar cidadãos e a educação é um processo de conscientização e de superação de preconceitos. Se queremos que no futuro o Brasil seja um país desenvolvido econômica e culturalmente, precisamos combater qualquer sinal de preconceito, até mesmo no nome dos doces. Parabéns ao Açúcar Guarani pelo comercial que veiculou, parabéns aos adultos que admitem seus preconceitos e tentam se libertar deles e parabéns aos professores que, apesar das pressões, estão formando cidadãos melhores para mundo.
Fonte: “Respeito na Medida” do Açúcar Guarani