Sou egresso do sistema prisional, onde passei seis anos após ter cometido crimes de assalto. Essa experiência foi, na verdade, a preparação que eu precisava para mudar de vida. Li um livro pela primeira vez aos vinte e três anos, em uma cela, e foi nesse momento que comecei a traçar um plano para quando eu saísse.
Ao sair para o regime semiaberto, surgiu a oportunidade de trabalhar em uma empresa de reciclagem. Inicialmente, achei que aquele trabalho não era digno para mim, mas tive que escolher entre ele e voltar ao crime. Optei pela reciclagem; puxei carrinho na rua e enfrentei o preconceito da sociedade por trabalhar com o lixo das casas das pessoas.
Logo depois, em parceria com meu irmão, que também era egresso do sistema prisional, fundamos nossa própria empresa de reciclagem, onde proporcionamos oportunidades de emprego para outros egressos. Durante esse período, passei a dar palestras sobre a minha história de vida. Hoje, já se passaram quatorze anos desde que saí dos presídios. Tenho visitado escolas, comunidades, universidades e participado de eventos para contar minha trajetória. Já tive a oportunidade de viajar pelo Brasil e até para outros países, sempre com o objetivo de tocar o coração das pessoas e encorajar aqueles que se sentem desacreditados.
Baseado na minha história de vida e na luta diária por melhores oportunidades, criamos o projeto “Reciclando Vidas”, que visa buscar e oferecer oportunidades para egressos do sistema prisional. Nos últimos três anos, conseguimos ajudar muitos egressos a encontrar emprego e formação profissional. Neste ano, decidimos ter um espaço físico, uma sala de atendimento para nossos egressos, onde, por meio de parcerias, poderemos encaminhá-los para o mercado de trabalho.
No entanto, não queremos atuar apenas como um “site”. Nosso objetivo é entender melhor cada egresso que atendemos. Para isso, ofereceremos atendimento psicológico, assistencial e jurídico, a fim de compreender as demandas de cada pessoa. Também teremos a oficina “Consciência Coletiva”, onde todos passarão para entender seus direitos e deveres como cidadãos. Depois desse atendimento, encaminharemos os egressos para oportunidades de trabalho com nossos parceiros.
Contamos com profissionais parceiros nas áreas psicológica, social e jurídica. Além disso, buscamos parcerias com universidades para que alunos possam realizar trabalhos de extensão em nosso espaço. Também estamos em busca de colaboração com a Defensoria Pública e outras instituições, tanto públicas quanto privadas, para ampliar e qualificar nosso atendimento.
Pretendemos inaugurar nosso espaço em junho. É fundamental que a sociedade compreenda seu papel na ressocialização e inclusão dos egressos, entendendo que isso é uma questão de segurança pública. Quando damos oportunidades a essas pessoas, estamos enfraquecendo o crime organizado. Temos plena consciência de que nem todos no sistema prisional desejam uma nova chance, mas sabemos que há uma porcentagem que sim, e é por eles que lutamos por melhorias todos os dias. E isso posso afirmar com base na minha própria experiência.
Rodrigo Sabiah, egresso do sistema prisional, educador social e CEO do projeto Reciclando Vidas, projeto direcionado para atender egressos do sistema prisional em Porto Alegre.
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Foto da Capa: Acervo do Autor.