Enquanto políticos arrogantes, comprovadamente corruptos, circulam livremente pelo país e nada os detém, jovens negros são agredidos pela polícia quase todos os dias. Apesar das falcatruas, alguns políticos e seus aliados estão ancorados e protegidos pelo tal “foro privilegiado”. Já os negros, os pobres, os moradores de rua e a população LGBTQi+ não têm foro nenhum que os proteja. Pelo contrário! Estão sempre na mira da polícia e do julgamento da sociedade.
Foi a partir desta lógica perversa que a PM carioca escancarou, mais uma vez, o racismo que move os policiais, justo aqueles que deveriam estar nas ruas para proteger a população independente de cor, gênero, raça, opção sexual ou qualquer outra diferença, e não sair apontando armas sem saber o que realmente acontece.
Impossível não falar de atitudes que escancaram os podres poderes e as desigualdades
Recentemente, um grupo de adolescentes – um menino branco e três negros, entre 13 e 14 anos – chegou a um prédio do bairro Ipanema, no Rio de Janeiro, por volta das 19h, para deixar um amigo na porta de casa e sofreram uma abordagem abrupta e desmedida da polícia militar. O raciocínio dos policiais que passavam pela rua em uma viatura e pararam para ver o que estava acontecendo foi o habitual, violento e preconceituoso. Só podem ter deduzido que o branco estava sendo assediado pelos negros que o acompanhavam. Resultado: a viatura subiu na calçada e parou. Os policiais militares desceram do carro já com fuzis e pistolas nas mãos apontadas para os três negros. Sem perguntar nada, encostaram o grupo no muro do condomínio para revistar. Os meninos negros não entendiam o que os policiais falavam porque eram estrangeiros, filhos de diplomatas, e estavam passeando pela “cidade maravilhosa”. O menino branco disse que era de Brasília e fazia turismo com os amigos.
Segundo a mãe de um deles, que é servidora pública em Brasília, ela alertou os meninos para que não andassem com celular na mão, cuidassem das mochilas e não ficassem sozinhos. Jamais imaginou que “a polícia seria a maior das ameaças”. E desabafou: “É traumático, triste, é doloroso. Estão assustados e machucados, com marcas que nem o tempo apagará”. A viagem que os quatro amigos haviam planejado há meses, acompanhados dos avós de um deles, foi uma experiência assustadora. Os policiais, quando se deram conta do erro, liberaram os meninos e alertaram para que não andassem na rua porque seriam abordados novamente. Abordados novamente! É isso mesmo! E já é um decreto.
Praticamente uma sentença: negros não podem fazer turismo no Rio!
Esse poder desmedido, agressivo e discriminatório da polícia é inaceitável e provoca muito medo. Mais uma vez – e já são tantas! – constatamos que numa sociedade historicamente racista, que escravizou, abusou dos serviços e depois rechaçou, não basta ser antirracista. É preciso estar sempre vigilante, denunciar e afastar quem não consegue respeitar o outro na sua condição. A cruel herança colonial reverbera. E a casa grande ainda sonha com a senzala, não aceita o protagonismo dos negros e culpa o pobre pela pobreza ancorada no discurso da meritocracia.
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E o que dizer de moradores de rua que são espancados? Por que é tão difícil a empatia, o respeito e uma tentativa civilizada de ajudá-los?
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É duro admitir, mas a discriminação só aumenta no Brasil
Nem bem saímos do Dia Internacional do Orgulho LGBTQi+, 28 de junho de 2024, em que as comemorações em várias cidades do país levaram multidões para as ruas, li e ouvi alguns comentários insuportáveis sobre o abuso dos homossexuais que ousam fazer a apologia de uma vida “em pecado”, “contra os desígnios de Deus”. Seria cômico se não fosse trágico! Uma boa camada da população ainda não consegue ver a ousadia e a beleza de um movimento libertário, que leva as pessoas a escolher o gênero com o qual se identificam para viver. Um movimento que celebra a diversidade e estimula uma reflexão necessária sobre a opressão e a violência sofrida por quem não corresponde ao padrão tido como “normal”. No Brasil, os índices de assassinatos e agressões são alarmantes e geram muita insegurança para grupos que só querem viver em paz e amar respeitando o seu desejo e a sua condição.
“Qualquer maneira de amor vale a pena / Qualquer maneira de amor vale amar”, diz a canção de Milton Nascimento e Caetano Veloso, “Paula e Bebeto”, de 1975. Quando vamos assimilar esta verdade e respeitar as diferenças?
Foto da Capa: Reprodução da Internet
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