Com o fim do orçamento secreto, o Congresso, para não se deixar órfão, adotou um novo mecanismo para controlar uma fatia maior de dinheiro público. Pela primeira vez, uma comissão, sozinha, vai ter mais dinheiro do que seis ministérios do governo federal e mais recursos até que o Supremo Tribunal Federal. Parece que está criado um monstrengo mais forte e poderoso do que recém sepultado, o chamado orçamento secreto.
As comissões temáticas, colegiados que reúnem grupos de parlamentares onde são discutidos projetos antes da votação em plenário, terão R$ 7,6 bilhões em 2023. Quase tudo, no entanto, ficou concentrado em apenas numa comissão, a de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado, com R$ 6,5 bilhões. Uma verdadeira “supercomissão”. Em anos anteriores, os valores para comissões foram bem menores. Em 2020, por exemplo, os colegiados tiveram R$ 639,7 milhões; em 2021, os recursos foram zerados; no ano passado, foram R$ 329,4 milhões.
O destino final do dinheiro só será conhecido ao longo do ano, quando o governo liberar conforme o pedido dos senadores. Por isso, a presidência dessa “supercomissão” já é tão disputada. O comando deve ser definido a partir no decorrer desta semana. Até o ano passado, a comissão era controlada pelo PTB e pelo PL, partidos aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro. Agora, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em parceria com o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), age para isolar a ala adversária e ficar com os cargos nos colegiados.
No último dezembro, o STF considerou o orçamento secreto ilegal. Era o mecanismo que autorizava deputados e senadores indicar o envio de recursos para bases políticas sem critérios técnicos e sem identificação. Com a decisão da Suprema Corte, os recursos foram redirecionados pelos parlamentares para que tivessem a destinação chancelada por comissões.
Defensores das emendas de comissão dizem que esses recursos têm maior qualidade do que outras emendas. O relator do orçamento de 2023 no Congresso, senador Marcelo Castro (MDB-PI), defendeu esse modelo como uma saída mais racional após o fim do orçamento secreto. Uma emenda de comissão precisa bancar uma ação de caráter nacional e só é aprovada se receber o aval da maioria dos senadores do colegiado.
As emendas colocadas neste ano, porém, caíram na vala comum: foram indicadas para ações genéricas, como “apoio a projetos de desenvolvimento sustentável local integrado”, que banca desde tratores até a estrada para a fazenda do ministro e foi amplamente usada no orçamento secreto. Outras áreas ficaram para trás. As comissões de Educação das duas casas legislativas terão somadas R$ 283,5 mil, o que equivale a 4% do recurso que a Comissão de Desenvolvimento Regional capturou.
As emendas da “supercomissão” foram aprovadas em uma reunião de 15 minutos, no dia 9 de novembro do ano passado. Nessa fase, as comissões aprovam as indicações e encaminham para o relator-geral do orçamento, responsável pelo parecer final. Os R$ 6,5 bilhões carimbados pelo colegiado superam o orçamento da pasta das Relações Exteriores (R$ 4,8 bilhões); Meio Ambiente (R$ 3,6 bilhões); e os Ministérios da Mulher e dos Direitos Humanos somados (R$ 789,6 milhões); Minas e Energia (R$ 2,8 bilhões) e Comunicações (R$ 2,4 bilhões). A fatia também é maior do que todo o orçamento do Senado (R$ 5,7 bilhões), do Banco Central (R$ 3,9 bilhões) e do Supremo Tribunal Federal (R$ 851,7 milhões).