Ignorância é palavra rude. Mal-usada ou mal-entendida pode causar conflito. Santa ignorância é mais leve, virou expressão popular. É uma figura de linguagem usada quando alguém demonstra falta de conhecimento ou entendimento sobre determinado assunto. Neste texto a utilizo para refletir meu estado de espírito.
Um dia desses no almoço em família tivemos uma discussão acalorada por eu ter dito que “hoje prefiro ser ignorante”. Éramos quatro sentados à mesa. Estava formado o campo de batalha de ideias.
Quando eu disse o que disse, quis somente expressar meu cansaço. Em um cenário onde as notícias gritam com as contradições da humanidade, estou em um momento que prefiro não ver a ter que confrontar a complexidade das questões.
Entrei na discussão de um jeito e saí dela instigada a refletir.
Ao assumir minha posição de ignorância consciente diante das guerras e disputas da atualidade, não tinha me dado conta de que essa postura carrega com ela o peso do privilégio negado a muitos. Sim, somos privilegiados, até por decidir não querer saber.
Isso me fez recordar um acontecimento de anos atrás. A mãe de um amigo, na época acho que ela devia ter quase setenta anos, me disse durante um jantar que tinha decidido se abster de ver, ouvir ou ler toda e qualquer notícia relacionada à violência. Essa decisão havia sido tomada no dia em que ela completou sessenta anos. Portanto, quando tivemos esta conversa, ela já estava há quase dez naquela jornada. Era uma mulher serena. Falava baixo, ouvia com paciência. Seus movimentos eram suaves. Hoje, acho que a entendo mais do que naquele momento. Ela era privilegiada e fez uma escolha.
Na encruzilhada do conhecimento e da ignorância, alguns escolhem o caminho de não se envolver profundamente nos conflitos. Aqui o privilégio dá os braços para o egoísmo, não nego, mas advogo em causa própria defendendo que essa postura pode ser necessária em alguns momentos, especialmente para preservar a saúde mental. Esse é o ponto que me conecta àquela senhora.
Resolvi fazer como ela. Não leio, não vejo e nem escuto. Mesmo sabendo que ao abraçar a ignorância fico à margem de entender e aprofundar temas tão atuais e importantes, essa é minha posição agora. Sei que é um refúgio temporário que não me protege das consequências dos fatos, mas vou ficando por aqui, por enquanto.
Entretanto, verdade seja dita, sou ignorante também em coisas muito menos profundas:
Não sabia quem era Luiza Sonza e nunca tinha ouvido a música “Chico” até que se instalou um frenesi generalizado no ano passado.
Também não tinha conhecimento do evento “burning man” até uma amiga citar em uma conversa de WhatsApp. Fui checar e continuo sem entender o “experimento social”.
Não sei quem é o novo namorado da Taylor Swift e tampouco sei quem são as mães dos filhos do Neymar.
BBB, então, sou ignorante potência máxima!
Enquanto espero me redimir do meu afastamento intelectual dos temas do mundo, tão logo consiga lidar com tantas atrocidades, dos outros citados acima prefiro ficar no obscurantismo.
Santa ignorância!
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