“Se és capaz de pensar – sem que a isso só te atires,
de sonhar – sem fazer dos sonhos teus senhores.
Se, encontrando a Desgraça e o Triunfo, conseguires
tratar da mesma forma esses dois impostores.”
Rudyard Kipling/Se
Se, um dia, continuares pensando nela, depois que ela saiu.
Se fores capaz de captar o eco de seu cheiro ou as imagens de um lastro que ela deixou pela casa, sem deixares de sonhar que ela volte.
Se ela voltar mais tarde e, passado o jantar com ela, imaginares como será o café da manhã, depois de uma noite real.
Se não precisares pensar sobre nada disso e puderes ficar sentindo sozinho o que foi bom durante o tempo que tiveram – e têm ainda -, apaziguado com ela por dentro, porque estiveste com ela, e agora escutas o acalanto de uma ideia de estar outra vez.
Se estiveres tenso por não saber quando será.
Se mantiveres a tensão, com todos os dentes da ilusão afiados, diante da incerteza da volta dela e de todos os excessos e faltas da presença.
Se, desde já, os excessos forem sentidos com graça e benevolência do que se tentou, ainda que em demasia.
Se as falhas forem experimentadas com a esperança de serem preenchidas com o tempo e o aprendizado de mais tempo compartido com o outro.
Sem cobrança.
Sem compromisso.
Sem interesses que não sejam o sentido único e lúdico de um sentimento de estar com.
Se estando sem, puderes te sentir seguro para outras empreitadas, enquanto a esperas (ou a procuras) e, em uma dessas empreitadas, estiveres diante de um texto que não te foi solicitado.
Se, terminado o texto, continuares pensando nele com a ideia de, após muita releitura, poder acrescentar uma vírgula, retirar um ponto, ajeitar um advérbio e, sobretudo, arredondar a imagem que possa se aproximar do que tentaste expressar sobre o que acontecia e não acontecia fora dele.
Se, diante do excesso de palavras, na luta pela expressão, puderes sonhar com um sentido novo para cada uma delas.
Se, diante da faltas delas, puderes sonhar um novo texto em que faltará menos ou quase nada sobrará.
Se, mesmo depois de rejeitado o texto ou, em outro caso, se for aceito e editado, continuares pensando naquela imagem, com ou sem a vírgula, mas que possa melhorá-lo só porque desejas a expressão mais verdadeira, independentemente de quem o lerá.
Então, tua é a Terra com tudo o que existe no mundo, e – o que ainda é muito mais – tu és um homem, meu filho!
Foto da Capa: Freepik