Estava caminhando nas ruas estreitas do centro histórico e ouço alguém chamar meu nome. Olho pra trás e na janela do segundo andar, com um largo sorriso, está Lucinha. “Oi, Pat, já te chamei umas três vezes”, disse ela com aquele delicioso sotaque baiano. Eu olhava pra cima com o braço tapando o sol. Ela, com o queixo apoiado na mão, parecendo uma boneca namoradeira. Trocamos algumas palavras e combinamos um encontro.
Mais alguns passos e cruzo com uma antiga cliente do restaurante. “Hi Patrícia, how are you doing?”. Tudo certo! Respondi. Ainda dei um “olá” para o dono do mercadinho, um tchauzinho para a atendente do Café e um abraço na filha de uma amiga que estava ao lado do Carrossel.
Sim, Cascais tem um carrossel na praça, daqueles que parecem tirados de um filme. Funciona incondicionalmente todos os dias. Faça chuva ou faça sol. No inverno, é lúdico e dá uma certa nostalgia. No verão, o burburinho da rua e o falatório dos turistas abafam o som e fazem com que perca um pouco da magia, mas ainda assim ninguém fica indiferente.
Todos os encontros aconteceram em uma pequena caminhada até a praia. Dia quente de verão e em poucos minutos vou dar um mergulho e volto antes do próximo compromisso.
Cascais fica a quarenta minutos de carro de Lisboa e a quinze de Sintra. É uma antiga vila de pescadores que se tornou um dos lugares mais procurados para se viver em Portugal. Mudei pra cá em 2015, após passar seis anos em Madri. Se gosto mais ou menos do que da capital espanhola? São “gostares” diferentes.
Apesar de ser um local com muitos atrativos, o que me encanta mesmo são as histórias, as pessoas que conheci por aqui. Woody Allen que se cuide! Se um dia me atrevo a escrever um roteiro para um filme, vou cobrar caríssimo para ceder os direitos de fimagem. Você duvida? Então vou dar só uma palinha.
Ela entrou e pediu um café e um croissant. Aparentava ter uns setenta anos. Talvez um pouco mais. Discreta e muito educada, deixou escapar nas entrelinhas da conversa alguns fatos do passado. Ao sair, escreveu em um pedaço de papel o nome e o telefone. “Guarda meu contato”, me disse com delicadeza. Não resisti. Fui fazer umas pesquisas e… O título deste capítulo poderia ser: A namorada (secreta) do rei de um país vizinho. Dizem que foi um tórrido caso de amor proibido quando eram jovens. Não digo mais nada. Passamos ao próximo.
Hello darling! “Vamos fazer um “garden party” e gostaria que você viesse”, disse ela em inglês com sotaque francês. Nossos encontros são esporádicos. Ora vou a sua casa, ora ajudo como voluntária no projeto social que criou para ajudar crianças em situação de vulnerabilidade.
Ela não anda, ela desfila. Uma famosa ex-modelo nunca passa despercebida, apesar de tentar se esconder atrás de enormes óculos escuros e de um boné que não tira da cabeça. Desfilou para grandes estilistas e hoje faz das calçadas de pedra portuguesa seu catwalk.
Tive um professor na Espanha que falava bastante sobre a teoria dos seis graus de separação. O estudo científico desenvolvido pelo psicólogo Stanley Milgram diz que são necessários no máximo seis laços de amizade para que duas pessoas quaisquer estejam ligadas no mundo. A teoria aplicada por aqui me liga – e por muito menos do que os seis graus – à atriz Nastassja Kinski e ao seu pai, Klaus Kinski. E, é claro, ao diretor Roman Polanski. Como? Segredo de autor.
Esbarrar com o presidente da República é fato corriqueiro. Marcelo Rebelo de Sousa optou por não se mudar para a residência oficial em Belém e continua a morar em sua casa bem aqui no centrinho histórico.
O roqueiro Bryan Adams também já viveu em Cascais quando criança, dos 9 aos 12 anos. Volta e meia ele retorna para matar a saudade e dá o que falar.
Tem história de sobra aqui no meu caderninho. Famosos que ainda são famosos, mas querem anonimato. Famosos decadentes que tentam a todo custo se manter em evidência. Tem nobres que perderam o título e plebeus que se julgam da nobreza. Tem pessoas de mais de cento e vinte nacionalidades diferentes. Tem lavagem de dinheiro, corrupção e traição. Tem todos os ingredientes e personagens para um roteiro de vidas que se cruzam em uma vila banhada pelas gélidas águas do Atlântico.
Netflix, entra já na disputa pelos direitos, pois os detalhes picantes destas histórias eu só revelo no roteiro. Cascais jamais será a mesma.
Foto da Capa: Reprodução da Internet
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