A desigualdade social e de renda no mundo nunca foi tão grande, fazendo com que aqui no Brasil a gente conviva com um número cada vez maior de pessoas em extrema pobreza, em favelas e pelas ruas. Já estamos convivendo com as emergências climáticas. Casos de barbárie sobre violência, seja a que vem da própria polícia ou a de bandidos, saltam das notícias diárias. Pesquisas e mais pesquisas divulgadas com resultados apontando as desigualdades de gênero, idade, raça, etnia, entre tantas outras que convivemos no país. Isso sem falar nas cenas de guerras e terror que não param de invadir nossas telas e horrorizar a nossa mente.
Conforme relatório do Fórum de Segurança Pública do Brasil, a cada oito minutos um estupro é cometido no Brasil, 70% deles contra meninas de até 13 anos. A cada dia somos abordados por notícias de rapazes e moças, velhos e velhas, meninos e meninas, vítimas de racismo e de etarismo, precisando pedir comida nas sinaleiras para sobreviver. Crianças e jovens saindo da escola porque precisam trabalhar. É a seca na Amazônia, passando pela onda de calor no Sudeste e as inundações no Sul do País.
Se todos somos tão empáticos, por que nossos problemas sociais se aprofundam em vez de irem se resolvendo? Se eu me importo com você e se você se importa comigo, as coisas deveriam – com o tempo – melhorar. Certo?
Se, como dizem, no passado era melhor, aquelas pessoas devem ter educado pessoas melhores do que elas, mais empáticas, mais bem intencionadas e comprometidas em melhorar o mundo, correto? Então, o que aconteceu?
A empatia é pra todos?
O ser humano é um ser social por natureza. Sem toda uma rede de apoio não sobreviveríamos. Nascemos sem saber nada. Somos o primata que mais tempo leva para se tornar autônomo e independente. Em contrapartida, somos o que possui a maior capacidade e flexibilidade de aprendizado.
Lá, no “Tempo das Cavernas”, nós precisávamos lidar com muitas ameaças e éramos um dos seres vulneráveis do ecossistema. Então, desenvolvemos nosso corpo para a “resposta luta-fuga”, adaptando-o a prever, antever e se prevenir de ameaças, respondendo automaticamente a elas.
Com o passar do tempo, e a complexidade das relações que fomos estabelecendo, fomos sofisticando nossas formas de nos conectar uns com os outros. Por conta da necessidade, isso também quer dizer que a empatia é algo que foi aprendida, e que se origina da nossa Inteligência Emocional. A Inteligência Emocional, conforme Daniel Goleman, cientista e pesquisador que primeiro desenvolveu e divulgou seu conceito, é a capacidade de reconhecer os sentimentos próprios e de outros, de forma a motivar a si mesmo e regular emoções em si mesmo e nos relacionamentos. A IE também é uma habilidade presente em diferentes graus nas pessoas e que pode ser aprendida.
Existem 3 Tipos de Empatia
Para quem quiser entender mais e melhor sobre Inteligência Emocional, recomendo a leitura dos livros de Daniel Goleman. Fui sua aluna na disciplina a esse respeito e, para mim aqui, basta informar que – na sua teoria – a empatia está contida no tópico de Consciência Social, que tem a ver com entrar em sintonia com as necessidades, expectativas, comportamentos e estados emocionais de outras pessoas. É senso comum tratarmos a empatia como um conceito único e apenas positivo, porém ela se desdobra em três tipos e pode apresentar uso negativo. Siga adiante.
Empatia Cognitiva
É o processo de compreensão racional, a capacidade de compreender a perspectiva da outra pessoa. Nesse exercício de empatia, em vez de sentir, a pessoa pensa nos sentimentos que o outro sente. Uma pessoa de natureza curiosa nutre a empatia cognitiva: por que pensa no que pensa, por que faz o que faz, o que funcionava para ele e o que não funciona.
Há algum aspecto negativo? Sim, quem exerce esse tipo de empatia poderá utilizá-la para manipular a outra pessoa, na medida que irá entender como ela pensa e, não necessariamente, utilizará essa compreensão com boas intenções.
Empatia Emocional
Esse tipo é o que geralmente conhecemos como conceito de Empatia. A capacidade de sentir o que a outra pessoa sente. Ela se origina de partes remotas do nosso cérebro, abaixo do córtex (a amígdala, o hipotálamo, o hipocampo e o córtex orbitofrontal), que nos permitem sentir rápido sem pensar profundamente. As emoções são contagiosas e essas partes nos sintonizam, despertando em nosso corpo o estado emocional dos outros: literalmente sentimos a dor (ou a alegria) do outro.
E onde está o perigo? Em sentir demais, até o esgotamento. Um exemplo disso vem de profissionais da área da saúde e da segurança pública, áreas que atuam com muitos desafios para quem precisa se conectar com as dores de outras pessoas. Assim, aprender a controlar nosso impulso de sentir empatia em relação aos sentimentos de outras pessoas pode nos ajudar a tomar decisões melhores quando o turbilhão de emoções de alguém ameaça nos dominar.
Mas de que adianta entender o que o outro sente e sentir o que o outro sente, se não souber o que é necessário ser feito?
Preocupação Empática
Esse é o terceiro tipo de empatia. É a capacidade de sentir o que a outra pessoa precisa de você. Desta maneira, é a empatia desenvolvida por uma mãe, por exemplo, quando consegue diferenciar o choro do seu bebê, entendendo se ele está com fome, cólica, fralda suja ou sono.
Conforme sugerido em pesquisas, à medida que uma pessoa sobe na carreira, a capacidade de manter relações pessoais vai sendo prejudicada. Isso indica que a preocupação empática é um sentimento ambíguo. Vivenciamos intuitivamente o sofrimento do outro como se fosse nosso próprio sofrimento. Mas, ao decidir se atenderemos às necessidades dessa pessoa, ponderamos deliberadamente sobre o quanto valorizamos o bem-estar dela. Conseguir essa combinação de intuição e deliberação tem grandes implicações. Aqueles que sentem compaixão demais podem acabar sofrendo, como descrevi acima. Aqueles que se protegem, enfraquecendo seus sentimentos, podem perder a capacidade de sentir empatia. A preocupação empática exige que controlemos nossa própria angústia sem nos tornarmos insensíveis à dor dos outros.
Com quem mais empatizo…
Assim, por estudos, sabe-se que é mais fácil sermos mais empáticos com as pessoas mais próximas, aquelas que pensam mais parecido e que estão afetivamente mais conectadas conosco. Dessa maneira, dentro das nossas bolhas sociais.
Como, realmente, exercitar empatia (com menos filtros)
Autoconsciência. Exercite o autoconhecimento. Sem conseguir reconhecer e nominar suas próprias emoções e sentimentos, compreendê-los, será muito difícil dar espaço para focar no que estiver acontecendo com o outro.
Curiosidade. Mantenha-se uma pessoa curiosa sobre as pessoas ao redor e a vida em geral. Isso fará você buscar entender melhor as pessoas, contextos e circunstâncias. Permita-se perguntar e aprender com diferentes pontos de vista e perspectivas de vida.
Desafie-se. Procure viver experiências que sejam desafiadoras e que façam fazer coisas diferentes da rotina: uma comida que nunca provou, um local que até hoje nunca visitou, uma nova habilidade, um hobby ou um novo idioma. Se confrontar com algo desconhecido estimula a humildade, característica essencial na empatia.
Viaje. Viaje mais, especialmente para novos lugares e culturas, pois oferece melhor apreciação pelos outros. A leitura também é uma forma de viajar sem sair do lugar.
Converse. Troque ideias com outras pessoas sobre problemas e preocupações, observando e tentando se imaginar vivendo as situações que elas vivem.
Repense. Considere que muitos dos nossos estereótipos e preconceitos são ocultos e interferem em nossa capacidade de ouvir e ter empatia. Geralmente, eles se concentram em fatores visíveis como idade, raça e sexo. Considere isso e reavalie sobre seus próprios preconceitos para aprender a lidar com eles, e até superá-los.
Hoje se fala muito em empatia, mas pratica-se pouco ela por muito do que expus nesse texto. Gostaria que escolas, empresas, universidades, instituições ensinassem educação emocional, incluindo a empatia em seus currículos e programas de formação. Dessa forma, se não conseguimos ainda ser a sociedade que esperamos, quem sabe a gente fosse capaz de construí-la?
Foto da Capa: Freepik