A relação com a forma física e a busca pelo melhor para cada corpo infelizmente são questões que estão longe de serem resolvidas com soluções simples
Outro dia, num grupo de WhatsApp de ex-colegas de trabalho, enquanto desfiávamos implicâncias com vícios de linguagem, uma amiga comentou: “Gente, e estar? Estou candidato, estou presidente, estou etc. Pra que isso?” Depois de vários comentários rabugentos, uma das pessoas mais inteligentes e divertidas que conheço exemplificou usando a si mesma como exemplo, causando gargalhadas: “eu sou magra e estou gorda”. Ali nasceu o grande dilema filosófico que pretendo debater aqui.
Eu sou ou estou gorda? Fôssemos falantes de inglês, esta não seria uma questão, porque I am fat, e pronto. Mas não somos, então é preciso considerar o que a diferença entre os significados de ser e estar representa nessa minha complicada relação com o próprio peso – sobre a qual falei na minha última coluna de 2022, “Da difícil relação com o próprio peso em um mundo gordofóbico“. Eu estou gorda (e posso deixar de estar se conseguir encontrar a fórmula adequada de reeducação alimentar e regime de atividades físicas para mim) ou sou gorda (e mesmo que venha a emagrecer tudo o que me faz ser uma pessoa com sobrepeso seguirei tendo o que pessoas obcecadas com magreza tendem a chamar de alma gorda)?
Se pensarmos em gordo como alguém que tem mais gordura corporal do que a média dos seres humanos, eu sou gorda. Não tenho como fingir o contrário. Agora, se a palavra gordo se referir a ter mais gordura corporal do que a medicina considera a faixa ideal para uma vida saudável, eu estive muito gorda, mas estou cada vez menos.
Na coluna de 29 de dezembro passado, escrevi: “Ainda não perdi quilos significativos, mas parei de engordar e passei a me exercitar mais. Há duas semanas, comecei um programa de emagrecimento com um aplicativo que foca na contagem de calorias, com dicas sobre como se manter motivado no processo. A sugestão da semana foi expor o objetivo ao mundo, para ter apoio e torcida. (E, vamos combinar, alguma cobrança, que é o que eu gostaria de evitar, mas, enfim.)”
O tal aplicativo foi abandonado em seguida. Apesar de gostar muito de comer, cozinhar e aprender sobre alimentação e gastronomia, viver com foco constante no que vou comer ou já comi é algo que não combina com a minha realidade, tampouco com a minha maneira de me relacionar com a comida.
Em março, tendo conseguido atravessar as festas de fim de ano e as férias de verão mantendo o peso sem fazer dieta restritiva, procurei uma endocrinologista com o objetivo de eliminar os quase 13 quilos restantes dos 15 que ganhei no segundo ano da pandemia, prejudicando minha mobilidade, meu ânimo, meu sono e a minha saúde.
Sob orientação da Dra. Laura Greca, usei o Saxenda, que me ajudou a perder rapidamente a parte que, aparentemente, estava mais me prejudicando. Além de voltar a caber em roupas que tinham ficado apertadas, voltei a ter ânimo de me mexer (fazendo exercícios com o auxílio de aplicativos e me movimentando o máximo possível todos os dias), passei a dormir melhor e vi meus exames melhorarem.
Só que depois de perder esses cinco quilos iniciais, a coisa estacionou. Aos poucos, diminuí as doses e interrompi o uso do medicamento. As lições que ficaram, acho que serão permanentes. Com a inapetência provocada pelo remédio, aprendi que comia porções exageradas. Descobri o meu ponto de saciedade. Eu comia muito mais do que meu corpo precisava para ter energia suficiente para o meu dia a dia. Também me acostumei a tomar um copo d’água toda vez que sinto “fome”. Porque é verdade que a maioria das vezes em que nosso corpo grita “estou com fome!”, o que ele está sentindo mesmo é sede.
A moral da história? Não sei se estou ou sou gorda, e isso não faz diferença. Não quero emagrecer rapidamente fazendo uma dieta maluca ou assumindo um regime de exercícios que jamais vou conseguir priorizar entre meus tantos interesses. Mas não quero jamais voltar ao peso que tive quando comecei essa jornada em busca do emagrecimento, em 2022. E esta coluna é um compromisso que assumo comigo mesma. Pelo teu tempo, leitor, obrigada.
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