Começou com um sinal fraco da Net e o síndico chamando uma consultora que recomendou aos condôminos uma troca para o plano por fibra. Ela foi mais adiante e revisou os gastos de cada um. Esses costumam estar sempre elevados e o meu estava: por exemplo, eu pagava pelo pay per view quatro vezes mais do que andavam gastando os novos aderentes dos últimos dois anos. Ficou de mudar o plano, mas não o fez. Dois meses depois, liguei direto para a empresa, expliquei o ocorrido, realçando que havia ficado dois anos pagando mais do que o correto, sem contar os dois meses em que tudo parecia resolvido e que também paguei. A atendente disse que estava fazendo a mudança ali na hora. Quer dizer, disse que fez, pois, dois meses depois, o preço do plano continuava inalterado, e eu pagando. Então, fiz o que sempre me aconselharam os experts em se defender da violência capitalista selvagem dessas empresas prestadoras de serviço de telefonia e internet.
Liguei para o setor de cancelamento, onde fui rapidamente atendido. A funcionária mostrava-se disposta, finalmente, a resolver. Atenta, prestativa, ares de eficiente, mas um aspecto fundamental lhe faltava. Sempre que eu reclamava da forma como havia sido tratado, dos dois anos e quatro meses pagando a mais, das duas tentativas malogradas de mudar o plano, ela o ignorava. Ou seja, quando eu expressava o meu incômodo, ela não o escutava, logo, não me compreendia, por mais que, a partir de agora, garantisse a solução.
Aquela conversa parecia, como diz Quintana, dois monólogos alternados. Eu externava a queixa, ela o ignorava, contrapondo que tudo já estava resolvido. Lá pelas tantas, fui ainda mais claro, agradecendo a solução, mas dizendo que eu precisava que ela acolhesse o meu desagrado e o compreendesse claramente (aqui um jogo de palavras com o nome da empresa). Ali ficou óbvio, sem paranoias em contrário, que ela seguia um protocolo e fazia parte deste protocolo 1. Não perder o cliente e 2: não reconhecer, em uma ligação gravada, que a empresa falhou, provavelmente de propósito, com cobranças indevidas.
Quando desliguei, recusei-me a avaliar o atendimento. Não queria prejudicar diretamente uma moça vítima do mesmo sistema, e que também precisava ser compreendida, mas não havia espaço para a minha avaliação. A nota final considera que, neste mundo de coachs e propostas rápidas de solução, entre medicações milagrosas e estratégias secas, não há espaço para o que mais precisamos, desde o nascimento: ser compreendidos. Ser compreendido é mais importante do que resolver alguma coisa. Em seguida, retomei o meu trabalho de psicanalista, acreditando mais ainda na serventia dele, por mais que seja tão fraquinho em propor alguma solução.
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Foto da Capa: Freepik / Pikaso