Quando a banda Patu Fu lançou a música Sobre o Tempo, lá em 1995, eu estava na casa dos vinte anos. Fechei os olhos embalada pela melodia gostosa, pela letra simples e pela voz suave da Fernanda Takai cantando “tempo, tempo, mano velho, falta um tanto ainda eu sei, pra você correr macio” e de repente, quando abri novamente as pálpebras, já havia passado três décadas. E aqui estou, já com meus cinquenta e alguns.
Às vezes me pego a personificar esse “mano velho”. Imagino-o como um tecelão sentado à frente do seu enorme tear, escolhendo as cores da minha vida e pouco a pouco fazendo o entrecruzamento de fios de urdume e trama. Horizontal e vertical, vertical e horizontalmente, em um movimento hábil e ininterrupto.
Em outros vejo-o como um jardineiro que, ao esperar pelo momento perfeito para plantar, vê as estações passarem sem que uma única semente seja lançada à terra.
Estas imagens mentais do tempo emergem de acordo com meu estado de espírito que algumas vezes oscila entre a vontade de realizar e a armadilha de procrastinar. Porém, acho que realizo mais do que procrastino, por isso, me identifico mais com a imagem do tecelão do que com a do jardineiro inexperiente.
Uma vez, há muitos, muitos anos, me lembro de ter dúvidas entre fazer ou não um novo curso. Tinha uma consulta em um dentista que era amigo da família. Recordo de ter comentado com ele sobre o assunto antes de sentar na cadeira. Quando já estava anestesiada e de boca aberta ele me disse: “O tempo vai passar de qualquer forma, que passe com você estudando”. Não acho que tenha sido o homem a falar, e sim o tempo que falou através dele. O que ele disse me acompanha ainda hoje.
Sigo me desafiando a aprender coisas novas, a desenvolver novos projeto e me aperfeiçoar como pessoa. Não espero que o tempo diminua seu ritmo para acomodar minhas indecisões. Se estou indecisa, vou indecisa mesmo e vejo no que vai dar. Sei que é tentador adiar sonhos, planos ou projetos, mergulhando na crença de que há uma abundância de tempo. Não há. Por isso, assim como na música temos um pacto, o tempo e eu.
“Tempo amigo, seja legal
Conto contigo pela madrugada
Só me derrube no final”
O texto que você lê agora é meu presente de aniversário para nosso editor Luiz Fernando, idealizador da Sler, este projeto que abriga semanalmente minhas escritas e de outros colegas que insistimos em oferecer textos longos na contramão de uma crescente demanda por poucas palavras.
Tomo aqui a liberdade de afirmar que tanto o criador, quanto nós, as criaturas, autointituladas Slerianos, somos todos como o velho tecelão do tempo.
A diferença é que, ao invés de fios ou cordas, utilizamos as palavras, em um processo que toma uma boa parte do nosso tempo para produzir, e do seu, leitor, que insiste em nos ler. A sorte é que comungamos da ideia de que um tempo bem gasto jamais será um tempo perdido.
Parabéns amigo, vida longa à você e à Sler, que sigamos neste caminho de eternizar histórias.
Viva o tempo que ainda temos pela frente!