Mirra Andreeva é uma jovem tenista, de 17 anos. Nasceu na Rússia, mas reside em Cannes, na França, a mesma França onde ela acaba de realizar um grande feito. Em Paris, Andreeva chegou pela primeira vez à semifinal de Roland Garros, um dos 4 maiores torneios de tênis do circuito mundial, os chamados Grand Slams. A jovem russa derrotou, em três sets, a experiente bielorrussa Aryna Sabalenka, de 26 anos, a número 2 do mundo.
Ao final do jogo, entrevistada no meio da quadra por um jornalista francês, a adolescente, em inglês sincopado, esbanjou charme. E muita sinceridade. Ao agradecer à sua treinadora, a espanhola Conchita Martinez, Andreeva confessou, com ar maroto, que costuma esquecer a estratégia traçada em detalhes pela técnica. E, no calor dos jogos, procura tão somente ver onde tem espaços vazios e jogar a bola ali, com muita força, como quem brincasse seriamente. Improvisa, enfim.
Conchita, flagrada pela câmera, sorriu para o mundo, acolhendo a inocência de sua pupila. Chegou a fazer com as mãos sobre o peito a imagem de um coração pulsando. As cenas chegaram ao Brasil, onde me puseram a pensar no que eu mesmo faço, em meu pequeno quadrado, muitos anos depois do final da adolescência. Escrevo, analiso e, para fazê-los, estudei e ainda estudo o que posso. Dedico-me a conhecer as principais referências do fazer literário e as noções mais importantes do analítico. Traço planos para cada texto e análise, mas a coisa deslancha é lá quando esqueço a estratégia e sigo a rota da espontaneidade para achar o ritmo mais expressivo de um texto ou algum sentido mais profundo para uma pessoa. Daí é que o poema acontece, com uma forma um tanto sua e meio nova, desatada de sua intenção redonda inicial. E o paciente chega à alguma conclusão original que destranca a sua vida prática, e não estava presente em nenhuma teoria das tantas que estudei.
Nessa hora, não consigo evitar um sorriso maroto, como aquele que já esbanjei há muito tempo, e este que Mirra Andreeva esbanja hoje, aos 17 anos.
Foto da Capa: Mirra Andreeva/Entrevista ao canal Roland Garros/Youtube/Repodução
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