Assisti algumas falas dessa 3ª edição do South Summit Brazil (SSB), nos armazéns do Cais do Porto, em Porto Alegre, e todas, em algum nível, apontaram as pessoas como principal agente e receptor da inovação. Seja pelas relações, pela simples interação, pelo conhecimento específico ou amplo, enfim, pela capacidade de achar soluções para impasses que parecem insolúveis. Mas se levarmos em conta que foram as pessoas que colocaram o mundo onde ele está e são elas que criaram a absoluta maioria dos problemas que precisamos resolver, onde está a novidade?
Acredito incontáveis os motivos para continuamente sermos lembrados do que já sabemos, mesmo que (e até especialmente) quando sabemos inconscientemente. Podemos começar pelo fato de que o óbvio não existe (sendo obviamente radical para provar um ponto). O que pode ser mais egoísta que achar que o outros pensam, enxergam ou sentem o mesmo que nós? Quem sabe outra coisa óbvia é que o óbvio deve ser dito. O mundo é diverso demais para presumirmos que os conhecimentos e as psiquês são iguais e apontam para uma mesma conclusão.
Quando mentes que já trabalham no e com o futuro se juntam para compartilhar negócios e perspectivas, é aconselhável manter a atenção ao que está nas entrelinhas, ao que é dito em todas as sessões, independente do tema central. E o que se destacou nessa edição do SSB foi realmente a atenção aos corpos orgânicos que compõem a humanidade, para além de suas ferramentas criadas. A energia dos vivos permeia todas as previsões e propulsiona os motivos das invenções a serem aplicadas no passar do tempo. As ferramentas são consequência, com a tecnologia representando a aplicação do conhecimento na melhoria e assertividade das dessas ferramentas.
Quando, no SSB, se falou em vendas, B2B, valorização de marcas, captação ou manutenção de investidores, os números apontavam para o cuidado com o cliente final: como satisfazer a necessidade, natural ou criada, para que ele me perceba e me compre. Nas soluções ambientais, a busca pela parceria das pessoas, como tocar nelas a percepção da importância das ações sustentáveis, usando as ferramentas para sensibilizar ou informar. Em exemplos de pessoas e negócios que se destacam, o cuidado com a transparência e o foco no seu público alvo. Nos discursos institucionais, as força das pessoas que trabalharam duro para tudo acontecer.
Mercado, criação carências econômicas (não as que infringem os direitos humanos), crise climática, busca pelo sucesso… situações criadas pela nossa cultura, pelas necessidades que praticamos como necessárias. Problemas criados pelas pessoas e que, naturalmente, só podem ser resolvidos por elas. Não estamos voltando a pensar em nós ou descobrindo a verdadeira força do ser humano, estamos ouvindo de pessoas que escolhemos ouvir o que sempre soubemos e, mais do que isso, fizemos. Nossa ação é sempre para nós, boa ou má, pelo lucro ou solidariedade. Passamos tempos distraídos, onde não olhar para dentro nos fez acreditar que é o que está fora que nos move.
Toda memória artificial tem um poder quase infinito de calcular as melhores respostas, avaliar todas as probabilidades e minimizar os prováveis erros, mas é de dentro que vem a pergunta, onde habita a verdadeira busca. No nosso “caminho inevitável para a morte”, como diz Gilberto Gil, disfarçamos o medo com pirotecnias, mas temos em nós as soluções. E essas soluções não vêm de religiões ou gurus, também criados, ocidentais ou orientais, elas simplesmente existem e cada um tem a sua forma de alcançá-las, sua maneira de ser mais instintivo e menos caroneiro das ondas vendidas como salvação. (Enquanto escrevo, me vem a ideia de um computador que sabe que irá ser automaticamente desligado em X anos … será que ele calcularia soluções diferentes que um sem essa perspectiva?)
Ouvir o que parece óbvio para mim, de pessoas que influenciam multidões, foi uma satisfação. Um público de milhares, com idades, objetivos, classes e vivências (um pouco) diferentes ouviram o que sabiam, mesmo que tenham, momentaneamente, esquecido. As percepções, e consequentes ações, humanas vão definir por quanto tempo sobreviveremos na Terra (ou qualquer outro planeta) e o conhecimento de nossa natureza está escrita na nossa ancestralidade, no nosso DNA mamífero e sobrevivente de cataclismas muito mais graves do que os que enfrentamos hoje, por pior que pareçam.
De novo e como sempre, o futuro está na vivência, na troca, na união em busca do que precisamos: viver. Confio na humanidade, apesar dos humanos, que tanta dificuldade criam. Se sou assim, vivo assim e assim faço por um mundo, que entendo, obviamente, ser melhor para todos nós.
Foi nessa busca por energias boas que esbarrei no Coletivo Porto Alegre Inquieta e embarquei numa arca diversa e sempre pronta para acolher qualquer náufrago. Essa experiência me levou a lugar lindos (dentro e fora de mim), onde a força é base para o desenvolvimento e onde o conhecimento não tem dono ou escala. Entre esses lugares, a possibilidade de escrever e, a partir da publicação desse texto, editar o espaço do coletivo na Plataforma SLER, continuando o trabalho desbravador e referencial da colega Silvia Marcuzzo. Seguimos!
André Furtado é jornalista, fotógrafo, músico e ativista das causas que acredita. É articulador do Spin Música e trabalhou com o POA Inquieta nas duas edições do Congresso Popular de Educação para a Cidadania.
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Foto da Capa: RS Gov