Embora o conceito de sustentabilidade seja conhecido há décadas e tenha relação com uma ampla gama de aplicações, é fato que seus efeitos práticos ainda são pouco perceptíveis, por mais que o mundo todo agora se diga preocupado com o assunto. Muito se fala nas famosas 4 dimensões da sustentabilidade: ambiental, social, econômica e político-institucional. Mas ainda é difícil para os gestores, tanto públicos quanto privados, transpor essas dimensões para situações mais diárias, mais próximas de suas rotinas e problemas mais urgentes. Parece sempre algo por demais grandioso, caro, demorado, até mesmo inacessível, especialmente para pequenos empreendimentos ou localidades. Para outros, parece algo inútil, já que não haveria possibilidade de mudar o mundo a partir de pequenas contribuições individuais. O que pode ser feito, então, para aproximar esse importante conceito das preocupações cotidianas? Como fazer com que gestores, empreendedores e profissionais em geral se apropriem devidamente da sustentabilidade e a integrem a suas responsabilidades e práticas diárias? Eis o desafio.
O primeiro passo envolve compreender que sustentabilidade não é apenas cuidar do meio ambiente. Embora muitas empresas associem especificamente suas ações de sustentabilidade ao departamento ambiental, a sustentabilidade, em sua essência, é multidisciplinar. Trata de agir com responsabilidade e bom senso em relação a questões ambientais, sim, mas também sociais e econômico-financeiras. Priorizar uma sem considerar suas implicações sobre as demais não é sustentável.
O segundo passo é estabelecer correlação. Ou seja, compreender onde e como a sustentabilidade se manifesta no fazer diário. Ou ainda: identificar quais aspectos do fazer diário mostram-se afetados pelas dimensões da sustentabilidade. Essa é, provavelmente, a principal questão: onde a sustentabilidade pode ser percebida, onde ela influencia e pode ser influenciada. Uma tentativa muito em moda e bastante válida é a popularização das práticas chamadas de ESG (Environmental, Social and Governance). Tais práticas, no entanto, referem-se basicamente aos impactos que as atividades da empresa causam no planeta e na sociedade. São orientadas “de dentro para fora” da organização. Servem, principalmente, para mostrar à sociedade (e aos clientes, em especial) que essa organização (empresa, localidade) está fazendo sua parte para melhorar sua relação com o ambiente e as pessoas. Mas o impacto organizacional é apenas parte do “problema” da sustentabilidade. A outra parte tem relação com o fato de que o mundo, ainda que agora mostre-se preocupado com a sustentabilidade, está atrasado no processo. Porque os danos já foram causados e suas consequências já se fazem presentes, gerando riscos de insustentabilidade cada vez maiores. Obviamente, para alcançar um estado de sustentabilidade, deve-se fazer o possível para melhorar a relação com o planeta e seus habitantes. Ao mesmo tempo, deve-se aprender a conviver com os desafios de um mundo que já mudou e segue mudando cada dia mais. Nesse sentido, a organização precisa lidar com os impactos “de fora para dentro”, ou seja, aprender a gerenciar melhor todos os aspectos externos a ela e que afetam seu desempenho e sua perspectiva de existência futura, com especial atenção às mudanças climáticas e socioambientais em curso.
Por falar em futuro, o terceiro passo consiste justamente em compreender que falar de sustentabilidade envolve tratar de futuro. E da construção do futuro desejado a partir do aprimoramento das práticas presentes. No presente, o que é importante para o empreendimento, localidade ou segmento? Uma resposta possível: atratividade, viabilidade e competitividade. Acrescente-se a esses três fatores a perspectiva de continuidade e se obtém a sustentabilidade. Detalhando: atratividade é a capacidade de chamar atenção e ser desejado pelos consumidores, pelos potenciais compradores. Viabilidade é a possibilidade real de execução, de existência. Envolve aspectos mercadológicos, econômico-financeiros, técnico-operacionais, jurídicos. Já a competitividade refere-se à capacidade de se destacar dentre os demais e sobrepujar concorrentes, ganhando a preferência dos consumidores potenciais de seus produtos ou serviços. Um negócio ou uma localidade devem obter uma combinação eficiente de atratividade, viabilidade e competitividade para que possam existir no mercado. Ser apenas atrativo não garante viabilidade nem competitividade. Viabilidade é um estado transitório, pode ser perdida se for comprometida a atratividade ou a competitividade. Também não se pode ser competitivo sem ser atrativo e viável. Mas tudo isso ainda se encontra essencialmente no tempo presente. Um empreendimento pode ser atrativo, viável e competitivo e, ainda assim, não ser sustentável. Porque, para assegurar a sustentabilidade, é preciso que ele consiga manter-se atrativo, viável e competitivo ao longo do tempo, em uma perspectiva de continuidade ou perpetuação.
Cada um desses fatores (atratividade, viabilidade, competitividade e continuidade) sofre influência das dimensões da sustentabilidade: ambiental, social, econômica e político-institucional. Isso significa que, para saber se um empreendimento, segmento ou localidade é sustentável, é preciso olhar para os impactos ambientais, sociais, econômicos e político-institucionais que incidem sobre sua atratividade, sua viabilidade, sua competitividade e sua perspectiva de continuidade. Obviamente, cada uma dessas dimensões envolve diversos aspectos. Não se deve generalizar, é preciso detalhar. Quais aspectos integram a dimensão ambiental? Água, clima, saneamento, solo, poluição sonora… e quantos mais? Quais representam a dimensão social? Saúde, segurança, moda, cultura local, patrimônio histórico e muitos outros. Definidos os aspectos de interesse, é preciso compreender a dinâmica de cada um em relação aos fatores de sustentabilidade. Quanto um aspecto ambiental, como a disponibilidade de água, por exemplo, afeta a atratividade de um produto ou serviço? Como afeta sua viabilidade? Quanto afeta a competitividade? Afeta tanto a ponto de prejudicar a continuidade? E como saber, como mensurar tais impactos? Através de indicadores que mostrem a situação de cada aspecto. E através da atribuição de valores de relevância para cada aspecto e fator analisado. Através de diagnóstico, enfim.
Portanto, um diagnóstico preciso, que permita conhecer cada aspecto relacionado a cada dimensão e fator, é processo extremamente necessário, estratégico para a continuidade das atividades e fundamental para a tão comentada sustentabilidade. Para que, de fato, ela deixe de ser uma bela teoria e se torne uma prática útil e imprescindível à sobrevivência dos negócios e das localidades.
Paulo Eduardo Macedo Ferretti é administrador de empresas. Mestre em Ambiente e Sustentabilidade, consultor para as áreas de turismo, planejamento estratégico, desenvolvimento regional, ESG e gestão para a sustentabilidade. (ferretticonsultoria@gmail.com)
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