Muito se tem falado sobre como a pandemia mudou o trabalho. Há cerca de dois anos, o trabalho remoto, ou teletrabalho para os portugueses, faz parte da pauta das discussões exigindo adaptações de pessoas e empresas, mas também dos governos.
Os trabalhadores tiveram que aprender a viver e trabalhar no mesmo ambiente. Foi preciso internalizar regras simples como tirar o pijama para marcar o início da jornada, preparar o almoço e fazer uma refeição tranquila mesmo estando a dois passos de um e-mail importante e até mesmo desligar o computador no final do dia para poder relaxar à noite sem cair na tentação de terminar uma ou outra tarefa no sofá.
Já as empresas precisaram transformar seus modelos de comando e controle, adotando jornadas mais fluidas a assíncronas. Além disso, aspectos operacionais como gestão de equipamentos e financiamento de insumos (luz, telefone, internet) atravessaram a pauta de departamentos de gestão de pessoas, ajudando a criar uma nova categoria de trabalhadores: os nômades digitais.
Mas as mudanças não ficaram circunscritas ao binômio empregado-empregador. O Estado também precisou agir rapidamente (ou nem tão rápido assim) para dar suporte ao novo cenário.
Na Europa como um todo, e em Portugal especificamente, onde acompanhei este movimento de perto, governos correram para intermediar relações trabalhistas e sociais. Regras sobre horários, horas extras, pagamento de insumos e até mesmo normas sobre obras domésticas foram instituídas, de forma a preservar do barulho esse “novo” ambiente de trabalho.
Agora, passadas as primeiras urgências, os governos estão se voltando para algo maior: preparar suas cidades para receber os trabalhadores sem base fixa, que operam a partir de qualquer lugar do mundo, precisando apenas de um notebook e acesso à internet. Contratados por empresas globais, que viram as vantagens dos times multi sede, essas pessoas rodam o mundo procurando por novas experiências sem precisar deixar a carreira para trás.
Os nômades digitais se fixam em um determinado local por diferentes motivos e períodos de tempo, vivendo a cultura local e levando recursos financeiros e intelectuais para lugares que, de outra forma, não teriam acesso a essas intervenções. Para um país como Portugal, com pequenas vilas pitorescas e dezenas de cidades precisando atrair jovens em idade economicamente ativa, esse movimento é providencial.
Por isso, o país até mesmo transformou o Ministério da Economia em Ministério da Economia e Transição Digital, que vem trabalhando para colocar o país na vanguarda da transformação digital. Enquanto isto, freguesias (algo como as subprefeituras no Brasil) se organizam para promover programas específicos para atrair trabalhadores globais. Almada, Ericeira, Carvoeiro, Ilha da Madeira e Portimão são exemplos de localidades que têm investido em infraestrutura digital e até mesmo ambientes de trabalho coletivo para permitir que os viajantes conciliem suas tarefas com um local onde se pode curtir o clima, a natureza e consumir os produtos regionais.
Mas, não é porque estamos falando da Europa que a perfeição existe. Apesar de contar com uma das melhores malhas viárias do continente, Portugal vem sofrendo com problemas no setor aéreo. Com aeroportos pequenos para a demanda atual, greves nas companhias aéreas europeias e um apagão do Serviço de Emigração e Fronteiras (SEF – que deveria ter sido extinto em 2021), o país registra filas quilométricas, serviços precários, inclusive para o provimento dos tão badalado visto para Nômade Digital, que pretende facilitar a vinda de profissionais altamente qualificados, mesmo que para curtos períodos em terras lusas.
Outro ponto fraco do continente é o 5G. Recentemente, a União Europeia revelou que seus membros precisam acelerar a adoção da tecnologia para atingir a meta de implantação fixada para 2025. Nesse momento, era esperado que os Estados-Membros deveriam assegurar a cobertura 5G ininterrupta em áreas urbanas e ao longo das principais rotas de transporte, algo que está longe de acontecer.
E, mesmo com o cumprimento da meta, a Europa ainda estaria atrasada, com algo em torno de 35% das ligações móveis suportadas em 5G. Isso porque, em três anos, a América do Norte espera ter o mesmo índice em 51%, a Austrália em 53% e a China com 48%.
Agora é correr (algo nada europeu) atrás.