Como contei na semana passada, tive a oportunidade de participar de dois eventos nessa última vez em que viajei a Sampa: fui na 4ª edição do Fórum ESG ABRH Brasil, sobre o qual tratei na minha última coluna (aqui), e na 6ª edição da Longevidade Expo + Fórum, onde estive desde a primeira edição, testemunhei suas transformações e crescimento. Hoje, ela pode se orgulhar de ser o maior evento brasileiro na área. Entretanto, meu sentimento é contraditório. Explico a seguir…
Pra quem não é da “bolha da longevidade”, o que você tem a ver com isso?
No texto “Quem serão os 60+ em 2070”, falei sobre a oportunidade que o Brasil está atravessando com seu segundo bônus demográfico e, com ele, poder transformar-se em um país mais próspero. Estudos apontam que podemos chegar ao nível de países como Portugal e Espanha, por exemplo.
O que é bônus demográfico?
O bônus demográfico é um fenômeno observado em determinados países ou regiões, que ocorre quando a proporção de pessoas em idade ativa (geralmente entre 15 e 64 anos) é maior em relação às populações mais jovens e mais velhas. No Rio Grande do Sul, por exemplo, já há uma população 60+ maior do que com menos de 14 anos, ou seja, esse bônus o Estado não usufrui mais.
Primeiro bônus, segundo bônus… não vai ter o terceiro.
No entanto, para que o bônus demográfico traga benefícios reais, é fundamental haver políticas públicas adequadas, como educação de qualidade, oportunidades de emprego e sistemas de saúde eficazes. Caso contrário, o potencial não será totalmente aproveitado, e os desafios demográficos futuros podem se agravar. Em grande parte, já vivemos isso, pois o Brasil já viveu um “primeiro bônus” e perdeu a oportunidade. No entanto, ele vive um “segundo bônus” e ainda pode aproveitar essa chance.
Então, quando a gente fala de longevidade (a duração da vida para além da sua expectativa) da gente e das futuras gerações, e o crescimento das faixas etárias mais velhas e a diminuição das mais novas na nossa pirâmide demográfica, tem tudo a ver com o nosso futuro como país.
Assim, espero que tenha conseguido demonstrar a você por que falar a esse respeito é importante para todo mundo, não apenas para quem é da “bolha da longevidade”.
Resposta e solução
Penso que uma das formas de o Brasil vir a se tornar “um Portugal ou Espanha” neste momento do segundo bônus demográfico é investindo na economia da longevidade.
Ainda há controvérsias sobre o conceito de Economia da Longevidade. No entanto, a Comissão Europeia adotou o conceito da Oxford Economics, “Economia da Longevidade é a soma de toda atividade econômica para atender às necessidades daqueles com mais de cinquenta anos, incluindo tanto os produtos e serviços que eles consomem diretamente como a atividade que esse gasto pode gerar”. É importante ressaltar que, por causa da sua transversalidade, a condução e estruturação de projetos em busca de resultados precisam ser feitas de maneira coordenada, e por isso, é altamente indicado e desejável que o Governo seja o condutor da estratégia.
Meu desconforto
Por isso, palestras, eventos, feiras, simpósios são insuficientes. Sinto que o ritmo que estamos imprimindo não é o bastante. Me angustio com o tamanho dos nossos desafios e a desproporção das nossas respostas a eles. Precisamos de mais ação, mais respostas, mais soluções. Em rede nacional, pensado estrategicamente, em rede, entre todos os atores que estavam presentes na Longevidade Expo + Fórum. A propósito, a Longevidade Expo + Fórum 2024 estava ótima. Gostei muito!
Deixa a vida me levar. Só que não.
A França definiu como estratégia nacional atuar estrategicamente desde 2013 na Economia da Longevidade. A União Europeia tomou essa decisão desde 2015 e a Inglaterra a partir de 2018. Nos Estados Unidos, em 2019, a Economia da Longevidade representava US$ 7,1 trilhões dos US$ 21,3 trilhões do PIB daquele ano. Dá pra perceber que, se os grandes levam a sério o tema, é porque é bom, certo?
Ficando com o exemplo da França, referência mundial na área, onde a Economia da Longevidade representava 92 bi de euros/ano em 2019 e que vem trabalhando fortemente para ser um dos líderes mundiais nessa área. O Governo constituiu um Comitê Oficial de Silver Economy composto por 65 integrantes (empresas, coletivos locais, organizações profissionais) e trabalha com três forças tarefas (Inovação, Exportação e Formação), que, por sua vez, são desmembrados em Grupos de Trabalho (Território Urbano, Habitação e Inovação Tecnológica). Completam a ação os Conselhos Regionais e um Escritório Central. Tudo isso em parceria com aceleradoras, plataformas digitais, associações e Conselhos Municipais. Percebam que temos aqui um esforço e uma representatividade de atores das mais diversas áreas da sociedade e da economia.
Esse é um exemplo de que os resultados desse trabalho não virão como naquele cartaz “Trago seu amor em três dias”, e de que quanto antes começarmos a trabalhar, mais cedo o país iniciará a colher os frutos desse esforço conjunto. O que não dá pra fazer é “deixar a vida nos levar… e as oportunidades serem perdidas”
Ecossistema da longevidade
Na Longevidade Expo + Fórum é possível apreciar a potencialidade do setor com a presença das universidades, instituições públicas, empresas privadas, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, startups, pesquisadores, empreendedores, profissionais liberais… tudojuntoemisturado. Mas toda essa vibração e capacidade precisa de fomento, rede, fortalecimento e direção.
Hoje, no Brasil, apenas focando no mercado consumidor, os cálculos são de que os 32 milhões de 60+ movimentem R$ 1,6 trilhão/ano. Isso desconsiderando, por exemplo, a geração de empregos que o setor pode e/ou poderia gerar, pois poderíamos falar em políticas de habitação sênior, só para ficar em um exemplo em uma das áreas possíveis de serem abordadas em um talvez, quem sabe, possível Planejamento Estratégico para a Economia de Longevidade Brasileira.
Será que alguém topa esse desafio?
Foto da Capa: Longevidade Expo + Fórum / Divulgação
Todos os textos de Karen Farias estão AQUI.