Aconteceu no tempo em que os bichos falavam. No lugar onde falam ainda, e um adulto pode cansar. Na Euro Disney, mais exatamente. Fui em pleno verão com a filha já crescidinha, mas ainda com fôlego e disposição de criança. As distâncias pareciam longas e quentes de uma montanha-russa à outra, sem contar o tempo de espera em cada uma delas. Só no tal chamado Portão de Entrada, foi meia hora de pé, sob um sol intenso, sem nem um tronco horizontal ou arremedo de graminha com uma nesga de sombra para descansar a carne fatigada. Quando divisei o artigo raro de uma poltrona, ela ficava dentro de uma Xícara maluca, e só com nova fila ou muita espera para entrar e descansar rodando. Quanto ao Dumbo, nem isso, mesmo que a sua cadeira de ferro parecesse macia como um leito king.
Foi então que encontrei o meu limite. Agora, looping ou trem de fantasmas aterradores eram coisa pouca, diante da minha fadiga hipoglicêmica. À beira da Space Mountain, a mais terrível das russas, depositei as armas: eu, de fato, não podia mais, que a filha fosse sozinha, e depois contasse a emoção que perdi, não por falta relativa de coragem, mas absoluta de corpo. Como quem acabava de encontrar o paraíso, deitei-me no chão faiscante, ali pertinho, à frente de uns tapumes vedando algum brinquedo em manutenção, longe dos restaurantes, onde haveria um oásis digno para o repouso, mas não havia força para alcançar. Esses eram mesmo raros, ao longo de todo o parque, mas, afinal, quem desejava descansar na Disney? Nem o pateta!
Dormi um sono pesado, sem sonhos, embora jurasse que fosse um pesadelo o policial me cutucando com o cassetete de borracha, enquanto o companheiro ajeitava a maca para me retirarem dali. E, como o meu francês fosse pior ainda na hora de acordar, não pude evitar que uma jovem vestida de princesa tomasse o meu pulso e medisse a pressão. Estava meio baixa, segundo vociferou aos colegas, mais ali recuperei parte do meu francês capenga para explicar que estava passando bem, só havia me deitado um pouco para descansar e, de fato, sentia uma falta de energia que haveria de passar com um hamburguer. Senti que acreditaram, embora o Mickey continuasse me olhando com cara de Pato Donald.
A multidão agora se desfazia, diante do que fora só o anúncio fake de uma tragédia mal-anunciada. Pouco depois, encontrei a filha trocando uma ideia com a Sininho que parecia lhe pedir que se acalmasse, pois o pai acabava de voltar da Terra do Nunca, de onde havia sido expulso, porque foi reprovado no exame físico.
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