Precisamos de leveza. Respirar fundo ar puro. Tem sido muito pesado acompanhar as notícias, as trocas de opinião ou falta de respeito diante de tantas desgraças. O pior é que nós, reles e ordinários viventes do Sul Global, não decidimos nada desses horrores que estamos vivendo.
Um pouco mais de meia dúzia de endinheirados e líderes políticos (homens brancos) decidem os destinos da humanidade. Se vai ter guerra, se vão continuar a exploração de combustíveis fósseis… Esses caras definem mesmo a psicosfera de tantos lados de situações que interferem na nossa vida?
Há tantos desafios nesse momento da história da civilização. Talvez entre os mais cruéis estejam a “ebulição climática”, sua possibilidade de não retorno às temperaturas menos quentes, e as malditas guerras. Alguns decidem explodir os outros, mas os que morrem são inocentes civis. Então como não se abalar diante desses contextos?
Tenho tentado focar no local, fazer o que posso, no que está próximo de mim. Uma forma de resistir ao bombardeio midiático de tantas notícias que sempre escondem interesses. Confesso que acompanhar as questões locais, enquanto repórter, também não tem sido moleza.
Saiu esta semana uma reportagem minha no Extra Classe web, onde abordo a situação das Unidades de Triagem da Capital. Pra mim, foi uma bordoada saber que a prefeitura de Porto Alegre gasta com o nosso dinheiro R$ 4,6 milhões (valor de setembro) para “aterrar” tudo que a sociedade não quer perto em Minas do Leão. E mais R$2,8 milhões só para levar tudo de caminhões pela BR290, por 100km. Enquanto isso, as Unidades de Triagem recebem só R$ 5,4 mil por mês para manter operação, o que não dá para fechar a conta. Alguém já fez a conta de quantas toneladas de emissões de gases de efeito estufa produzimos só para tirar o “lixo” da nossa frente?
Realmente, quem acompanha a situação do que está nos rondando, pode acabar doente. Por isso, tenho procurado fazer ioga, completar palavras cruzadas, me abastecer de leituras edificantes, acompanhar canais do YouTube como o Corvo Seco, cantar no coral, treinar tênis de mesa, encontrar amigas e contemplar a natureza. Ao observarmos a magia do crescimento de uma flor que vira fruto, o transitar dos insetos e dos pássaros em volta das árvores é um alívio, um tipo de higiene mental.
Precisamos saber nos proteger de tanta insanidade. Saber o que acontece, mas não nos deixar afetar. Lembro do meu início de carreira, como “foca”, assim chamam os repórteres novatos, sem experiência, quando precisava cobrir pautas de Polícia nos velhos tempo de Correio do Povo, ainda p&b. Naquele tempo, pré-internet, pré-celular, era obrigatório ir em todas as delegacias do Palácio da Polícia. Fazer a “ronda”, ou seja, ligar para todas as DPs da Grande Porto Alegre para saber se havia alguma novidade, caso, que devesse ser feita a cobertura.
No começo, não foi difícil. Até vibrava quando tinha alguma pauta mais emocionante. Mas com o passar do tempo, fui sentindo minha energia afetada por tantas desgraças. Tive que aprender a me preservar sob o ponto de vista energético. Não me deixar contaminar com as tristezas e os crimes que tinha que registrar. Até que chegou um ponto que pedi para sair da editoria.
Hoje, passados uns 30 anos daquele tempo, os desafios são parecidos. Só que não preciso ir até os locais de investigação ou dos crimes. Sou cercada de telas e tenho acesso redes e veículos de imprensa que pouco se importam com o impacto do que jogam para a população. Sinto que precisamos saber qual é o nosso limite, o que conseguimos suportar. E depende do nosso autoconhecimento.
Enfim, em meio a essa infodemia, como é bom passear com os olhos nos meus minijardins, pelos meus vasos com árvores frutíferas. Preciso voltar a colocar a mão no barro, fazer cerâmica. Por uma questão de sobrevivência da qualidade de vida, é necessário se refugiar em tipos diferentes de trincheira.