É fim de tarde da Sexta-feira Santa deste 2023. Escrevo assustado com toda a violência jogada na nossa cara pelas manchetes dos portais de notícias. Como numa Via Sacra, ou assistindo a um daqueles filmes de segunda categoria onde zumbis, saídos ninguém sabe de onde, aterrorizam todo mundo, vou passando pelas manchetes.
Em São Paulo, uma turba de viciados em craque saqueia uma farmácia. Outra faz o mesmo num mercado. No Rio, um homem – supostamente em busca de assistência médica – entra num hospital e esfaqueia sete pessoas. Outro incendeia um ônibus e impede que os passageiros fujam do fogo. De volta a São Paulo, um vídeo mostra guardas municipais atirando num motociclista já rendido. Na Indonésia, um brasileiro transforma a paradisíaca ilha de Bali no inferno de uma surfista ao agredi-la com socos simplesmente porque ela tomou a frente de um amigo dele e aproveitou melhor uma onda…
Agora, já é Sábado de Aleluia. Dou de cara com a história de um professor, em Joinville que, numa conversa com alunos, apoia o ataque à creche de Blumenau e berra que, fosse ele o atacante, teria matado mais crianças. Isso lá é coisa de gente, meu amigo?!?!? Mesmo que tivesse cochichado isso, a ameaça do professor soa como o berro de um monstro em qualquer ouvido.
Coisa de gente sã, me parece que não precisamos ser médicos, psiquiatras, psicanalistas pra dizer que não, né mesmo?
E eu lembro que, outro dia, escrevi num grupo de WhatsApp, algo que, até pra mim mesmo, soou meio piegas. Comentando o assassinato de um homem, num bar do Rio, logo depois do Fla-Flu no dia 1 de abril, sugeri que a gente aproveite a pausa nas pesquisas sobre inteligência artificial, proposta até pelos donos das big techs, e abra um debate sobre essa desinteligência natural que nos desumaniza todos os dias, a ponto de levar uma pessoa a dar nove tiros em outra por causa de uma pizza…
Agora já é Páscoa e, diante de todos esses dramas, algumas horas depois da tragédia da creche em Blumenau – passados uns 10 dias da outra, em São Paulo – vejo que a minha proposta faz sentido. Diga aí, você acredita que algum plano de segurança policial poderia ter evitado que o criminoso de Blumenau pulasse o muro da creche para matar quatro crianças e ferir outras cinco? Será que aumento da pena para quem cometer tais crimes, teria impedido o surto que, certamente, acometeu aquele homem? Ou que alguma vigilância mais rigorosa tivesse impedido o adolescente de 13 anos de invadir a escola e matar a professora?
Talvez… se a creche e a escola estivessem cercadas por PMs de mãos de dadas. Mas isso é impossível. Quem sabe, se tivéssemos um policial, ou um vigilante privado dentro de cada escola? Talvez… mas, aí, correríamos o risco de ter manchetes tipo “adolescente/homem morto por policial/vigilante quanto tentava invadir colégio”. Seria a mesma tragédia vista de outro ponto. Ou não?
E o professor de Joinville? Quantos mais iguais a ele andarão por aí, deseducando crianças e adolescente? É preciso um inquérito, uma investigação pra saber se ele deve ser exemplarmente punido por incentivo ao crime? Ou o vídeo gravado pelos estudantes é mais que suficiente para expurgá-lo do convívio social?
Nestes tempos ideologia do ódio, de desinformação, de muita conversa virtual, de muito toque na tela e nas teclas e quase nenhum toque na pele, me parece que um pouco de conversa cara a cara, mão na mão, olho no olho pode ser mais efetivo que todos os grupos de trabalho, as comissões, as audiências públicas em gabinetes oficiais.
Então, reforço a minha sugestão. A partir de hoje, todas as escolas e creches do Brasil estão obrigadas a reunir uma vez por mês, pelo menos, professores, pais de alunos, lideranças da comunidade, representantes das prefeituras e governos estaduais e especialistas em comportamento humano para conversas sobre a vida, sobre as relações familiares, sobre os problemas do bairro, sobre o ensino e a educação. E, principalmente, sobre o uso correto e civilizado das redes sociais, essas ferramentas de comunicação que estão se transformando em vírus de uma pandemia de violência.
Essas conversas podem ser bem mais eficazes na prevenção desses tristes desvios comportamentais que assolam as cidades do que patrulhas policiais circulando em volta das escolas.
Para encerrar, um apelo a suas excelências as senhoras e os senhores deputados federais: acelerem a aprovação de uma lei de regulação das redes sociais para punir com rigor quem divulgue fake news, desinformação e mensagens de ódio. E mostrem pra gente que não estão em Brasília só para garantir os seus próprios interesses, os interesses de grupos setoriais, nem só os interesses da sua região. Provem para o Brasil que estão aí para ajudar a fazer um Brasil mais justo e mais igual.