Todas as vezes que visito um lugar novo e penso em falar sobre esta experiência, me vem à cabeça o título da comédia romântica “Um lugar chamado Notting Hill”. E desta vez estou em Gorizia, no nordeste da Itália. Esse é meu Notting Hill da vez.
O outono começou quente por aqui. Finzinho de setembro de muito sol. Tínhamos acabado de fazer uma trilha para conhecer Solkan (foto da capa), a maior ponte de pedra em arco do mundo, que fica sobre o Rio Soca, na Eslovênia, e na volta paramos para descansar e tomar um sorvete. Ocupamos a última mesa disponível na calçada do pequeno bar de Nova Gorica, a parte eslovena da mesma cidade que na Itália se chama Gorizia. Sim, cidades irmãs separadas por uma demarcação geográfica. Atravessamos a fronteira caminhando e iríamos voltar da mesma maneira. Esta é uma cidade que pertence a dois países. No bar, enquanto tomava meu “gelato de tiramisu”, ouvia conversas em três idiomas distintos: italiano, esloveno e o friulano, este último reconhecido pelo estado italiano como língua independente desde 1999.
Gorizia fica na região do Friuli Venezia Giulia e é uma daquelas cidades que vive entre o passado e o presente. Situada no nordeste da Itália, coladinha na Eslovênia, já atravessou períodos conturbados e testemunhou encontros e desencontros culturais. A origem de Gorizia remonta ao século X e já foi uma das cidades mais ricas do Império Austro-Húngaro. Após a Primeira Guerra Mundial, foi anexada pela Itália.
Foi depois da Segunda Guerra que a cidade acabou sendo dividida em duas. De um lado, ficou a Gorizia italiana e, do outro, Nova Gorica, na antiga Iugoslávia, hoje Eslovênia. Atualmente, circular de um lado para o outro faz parte da rotina, mas nem sempre foi assim. A população não tinha livre trânsito. Em 2004, com a entrada da Eslovênia na União Europeia, essa barreira foi eliminada, mas não completamente. A livre circulação de pessoas era permitida, porém, apenas dentro de uma praça, projetada como espaço comum entre os dois países. Só em 2007, ano em que a Eslovênia entrou definitivamente para a área de Schengen as restrições acabaram.
Hoje, é possível passar de um lado para o outro livremente, sem notar onde acaba a Itália e começa a Eslovênia, a não ser por construções com arquitetura moderna e a presença de vários cassinos do lado esloveno.
Toda essa história acabou gerando uma enorme riqueza cultural. Gorizia é um “melting pot” de influências, onde a cultura italiana, eslovena, austríaca e até húngara se misturam de forma harmônica.
Apesar de pequena, é um lugar que se descobre aos poucos. A cada amanhecer, vejo uma nova Gorizia. Ao caminhar pelas ruas, fico fascinada com a arquitetura dos palácios barrocos, igrejas renascentistas e construções modernas. Além, é claro, do castelo medieval do século XI que reina absoluto no alto da colina.
Mas Gorizia também tem outros encantos. A região é conhecida pelos vinhos, especialmente o famoso Collio, produzido nos arredores. A gastronomia local também tem destaque, com pratos que combinam influências italianas e eslovenas.
Por falar nisto, por sorte ou obra do destino, amanhã começa a “Gusti di Frontiera”, que é o maior evento anual gastronômico e vínico da região. Não foi programado estar ainda por aqui, mas, claro, já decidi ficar.
E onde entra Notting Hill nesta história?
Assim como no bairro famoso de Londres, por aqui há também lojas e bancas de antiguidades, obras de arte, acessórios, roupas, flores e comidinhas e casas coloridas. Há ainda muito verde e uma atmosfera multicultural. E mais. Uma vez em Gorizia, você está a “dois passos” de Trieste e Udine. Resumindo: inclua Friuli Venezia Giulia no seu roteiro e apaixone-se.
Parafraseando um dos diálogos de “Um lugar chamado Notting Hill “:
Eu: Posso ficar mais um pouco?
Gorizia: Fique para sempre (se quiser).
Foto da Capa: wallpapers13
Todos os textos de Pat Storni estão AQUI.