Só me resta, então, voltar às perguntas que já fiz em outros tempos e em outros períodos eleitorais. Como os candidatos percebem o lugar que habitamos? Como planejam a cidade que vão administrar? Sob o princípio da preservação do nosso patrimônio, do meio ambiente, cada vez mais necessário, e do bem-estar das pessoas que nela vivem? Ou sob a lógica privatista? A partir da natureza viva, atraente e inclusiva, que estimula os sentidos e a respiração, essenciais para o nosso andar? Ou a partir do “quem dá mais leva”?
Minhas últimas andanças pelo centro de Porto Alegre, pelo bairro onde moro e pelos bairros vizinhos foram de uma decepção generalizada. Lixo de todo tipo espalhado, fios tomando conta das calçadas, ruas esburacadas, passagens obstruídas e nenhuma atitude concreta de limpeza. Esta é a realidade da cidade onde vivemos e nos relacionamos cotidianamente, seja para o trabalho ou para o lazer. Em 1905, o escritor brasileiro João do Rio falava em ‘flanar’ pela cidade. Hoje está difícil ‘flanar’ porque a paisagem não é nada acolhedora.
Pelo que entendo – e muito mais que não cabe em um único texto – ao candidatar-se para assumir o comando de um município os políticos deveriam ter por princípio o conhecimento real do que funciona bem e dos problemas, cercar-se de profissionais que entendam a vida urbana e a relação com os habitantes. Feito isso, partir para ações efetivas. Mas as promessas de campanha na maioria são apenas promessas. Não se concretizam. Quem circula pelas ruas no dia a dia, mulheres, homens, jovens, adolescentes ou crianças, precisa de conforto e tranquilidade. Ruas, calçadas e praças seguras, limpas e agradáveis para que o andar em direção ao trabalho, à escola, às compras, aos negócios e ao lazer seja leve, acessível e prazeroso. E pessoas que só têm o espaço público para acolhê-las? Quem se importa com elas?
Em relação à acessibilidade, volto ao que diz a arquiteta Flavia Boni Licht, mestra no assunto: “Independente da idade ou da condição física, a acessibilidade é o direito que todos devem ter de compreender um espaço, relacionar-se com os seus conteúdos e usar os seus elementos com autonomia e independência”. Estamos todos de acordo, não? Mas o poder público parece não perceber tais valores.
Muitos desafios e pouco interesse
É indiscutível o grande desafio que os candidatos têm pela frente, especialmente depois da tragédia provocada pelas chuvas e agora pelo cinza dos dias com o ar carregado pelas queimadas. Mas me parecem pouco interessados em aprofundar estas questões que são vitais. Os desafios passam, inevitavelmente, pelo entendimento do que acontece ao redor e interfere no cotidiano de todos nós e pela diversidade humana que habita o espaço urbano. O ponto justo seria jogar no lixo a velha política do “toma lá, dá cá” que facilita a corrupção, conhecer a cidade profundamente, pontos positivos e negativos, entender as demandas da população, planejar e executar. Inaugurar um jeito diferente, humano na sua essência, de promover o bem-estar e ativar o crescimento.
Abandonar as carapaças ortodoxas, como Flávia escreveu em 2009, para estabelecer um diálogo franco que compatibilize conceitos, encontre identidades, equilibre posições e construa um novo caminhar na direção do respeito ao ser humano e às suas invenções. Desburocratizar os serviços e fazer um bom uso do dinheiro público, investindo em educação, saúde, segurança e melhoria das condições de vida da população de baixa renda. A fome está estampada no rosto de muitas famílias que circulam sem rumo. Mas o que temos é mais do mesmo. Discursos cheios de promessas, mas vazios. Observem a infraestrutura oferecida para pessoas em cadeira de rodas e pessoas cegas. É mínima. As dificuldades de circulação são enormes. Quase nada acolhe a condição de alguém com uma deficiência física. Calçadas detonadas ou ocupadas por carros dificultam a passagem, o que se soma ao entorno das lixeiras e à quantidade de fios espalhados pelo chão. Vejo isso todos os dias! Os problemas são simples de resolver e certamente não custam tão caro, mas as prioridades são outras. O que move mesmo alguém que se candidata, anda pelos bairros, conversa com as pessoas e espalha esperança? E o que move esse alguém depois de eleito? O que de concreto acontece?
O desleixo é triste!
E quando partem para o investimento em obras para melhorar a infraestrutura não se dão ao trabalho de consultar técnicos e especialistas em questões como o descarte correto do lixo, a colocação de asfalto nas ruas, o calçamento adequado e, muito menos, consultar pessoas com deficiência para fazer o que é mais adequado. O descaso com o conhecimento, a experiência e a informação é total. Preocupam-se em rechear os discursos de promessas e depois em vangloriar-se dos feitos, quando o que fizeram não foi nada mais do que a obrigação mínima de alguém que detém um cargo público. Os conteúdos dos discursos não se sustentam. E está difícil respirar! Mas vamos ao voto. É a nossa chance de contribuir para mudar o que aí está. Ou, pelo menos, manifestar o nosso desejo.
Foto da Capa: Acervo da Autora.
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