Quando li a história das três universitárias adultas mal-educadas que debocharam da colega de 45 anos, afirmando que ela já deveria estar aposentada e não ocupando espaço em sala de aula, duas perguntas, até meio primárias admito, me vieram à cabeça:
– O que teria levado as três gurias de Bauru – supostamente bem-informadas, já que alunas de curso superior – a tão equivocada atitude?
– Como teriam reagido os pais delas que, provavelmente, têm mais idade, ou estão na mesma faixa etária da ofendida?
Aí, conversando com meu teclado, concluímos que as estudantes protagonizaram quase um milagre comportamental. Voltaram às décadas de 50/60 do século passado e, em seguida, retornaram para este 2023…
Assim, ó: ao considerar velha uma pessoa de 45 anos, as gurias de Bauru visitaram o tempo da vovó e do vovô, quando a expectativa de vida, por aqui, era de 50 anos e, portanto, quem chegava aos 45 era um idoso. Em seguida, diante da repercussão negativa do bullying, agem como as crianças birrentas deste século de telas e teclados. Trancam-se no quarto e ameaçam não voltar à faculdade…
Mas o que leva três jovens a se comportar assim? Para mim, esse comportamento é produto da cultura da tela, do pouco relacionamento social e do excessivo relacionamento virtual. Hoje, as pessoas conversam mais com máquinas, do que com outras pessoas. Perguntam mais para assistentes virtuais, que para amigas, amigos reais, professores e até mesmo para os pais. Seus olhos e suas mãos olham e tocam mais em teclas e telas do que em outras mãos e outros olhos.
Não pessoal… não sou contra a tecnologia. Afinal, estou aqui, há horas, diante de uma tela e de um teclado tentando produzir algo, pelo menos, razoavelmente legível e que vai ocupar espaço na Internet. O que estou querendo dizer é que o que deveria ser ferramenta de construção de relacionamento, instrumento para semear empatia, plantar conhecimento, está virando máquina de demolição, vento que espalha poluição…
Voltemos ao caso das gurias de Bauru. A repercussão varia entre a condescendência dos que consideram as críticas às três agressoras meros mimimis dos politicamente corretos até ameaças físicas…Tudo nas redes, claro, via celular, tablet, PC, notebook, que ninguém tem tempo pra uma conversa olho no olho…
Como será que se sentiram, afinal, os pais diante do bullying praticado pelas filhas e da – talvez mais imatura ainda – decisão de não voltar à faculdade com a justificativa de que estão sendo ameaçadas? Abriram uma conversa para mostrar às gurias que a vida, fora das telas, nos faz responsáveis por aquilo que praticamos e que o isolamento as livraria dos olhares e comentários dos colegas, mas não do próprio olhar no espelho?
E a faculdade, aproveitou o episódio para promover um debate sobre o bom uso das redes sociais? Ou ficou só na nota divulgada para confirmar o afastamento das três agressoras, como a dizer aos pais e alunos que pagam mensalidades: pronto não tem mais bullying, fiquem tranquilos?
Se ficou só na nota, não cumpriu missões básicas das entidades de ensino, que é promover o relacionamento humano e, nestes tempos de inteligência artificial, mostrar que sem o cérebro humano não há vida nenhuma.
Antes de desligar meu notebook divido uma dúvida com você que veio até aqui: é possível criar bons cidadãos simplesmente equipando, escolas, crianças e adolescentes com bons computadores sem ter pais, gestores e professores preparados para mostrar que o ChatGPT e o, ainda em gestação, Bard não são criaturas capazes de raciocinar como nós e são, isso sim, criações de gente que usa o nosso raciocínio para ganhar muito dinheiro?
Eu, se fosse pai das gurias de Bauru, as levaria de volta à faculdade. Não pela orelha como fariam os meus avós, que isso, hoje, pode dar até cadeia, mas mostrando a elas que não dá para viver só nas telas e nas redes e que não há idade-limite para aprender.