A pessoa eclética nasce assim, não é uma opção. Isso impede que você seja colecionador de seja-lá-o-que-for, porque qualquer obsessão temática se tornará tediosa. Você jamais será um especialista em dark metal, um subgênero de heavy metal, ou estudioso do ciclo circadiano do boto vaquinha (a saber: o menor mamífero marinho da Terra) ou da Regência Trina do Segundo Reinado, do Brasil Imperial.
Mas tem lá suas vantagens. Você daria um bom enciclopedista, se tal profissão já não estivesse morta. Ou.. o que mais, deixa eu pensar… Ah, sim, ter muitas opções de programas de TV. (Não quer dizer que você vá curtir Hulk e Faustão, isso é outra coisa). Mas você poderá ir do “Que História é essa Porchat” para “Quilos Mortais”, depois “Veterinários do Alasca” e dali para o canal Curta ou o Arte1. Poderá amar com a mesma intensidade filmes como Cidadão Kane, Homem-Aranha e Wakanda Forever. Quer melhor sonífero do que as séries do Dick Wolf?
Particularmente, às vezes, assisto o ID – Investigação Discovery. E tem sido inevitável fazer o paralelo entre o programa “Vivendo com o Inimigo”, que relata história de pessoas que dividem o mesmo teto com assassinos, e os sinais que emitem os primeiros dias do Governo Lula. Não tenho certeza se estou sendo muito paranoico ou a mídia está com receio de encarar de frente os alertas e assumir os perigos que rondam o presidente Lula. Certamente, não será o governo a assumir publicamente, seria admitir que não está no controle de tudo, uma temeridade para a estabilidade de qualquer governo. Mas imagino que essa esteja sendo uma pauta prioritária nos bastidores do Planalto. Avalie você agora.
Cena 1: No fatídico 8 de janeiro, um batalhão da Polícia Militar (PM) do Distrito Federal se dirige à frente do Quartel General da Força, no Setor Militar Urbano, onde manifestantes estavam acampados, com ordens para desocupar o lugar. Ao chegar, encontram dois blindados urutus e um batalhão da Polícia do Exército (PE) posicionados para impedir a entrada da PM, sob a alegação de que aquilo seria “zona militar”, caberia apenas ao Exército proceder a desocupação quando e se recebesse tal ordem. Este talvez tenha sido o momento mais tenso dos últimos tempos da República. Duas forças militares do Estado, frente a frente, em posição de combate, em lados opostos. Se aquilo era mesmo “zona militar”, o Exército, cujo comandante em chefe é o presidente da República, acaba de confessar que cedeu a sua “zona” para abrigar manifestantes golpistas em favor do ex-presidente. Após negociações, a PM e a PE retiram os acampados do local.
Confira na matéria do Metrópoles
Cena 2: Integrantes da Força Nacional, organização subordinada ao Ministério da Justiça, divulgam vídeo nas redes sociais mostrando um rapaz que acabava de ser apreendido, na Esplanada, com coquetéis molotov e outros artefatos. “Esquerdista (…) estava infiltrado jogando bombas nas pessoas do bem pra dizer que é (sic) os bolsonaristas”, diz o policial que descreve a cena. A Força Nacional foi criada pelo Lula em 2004 e é acionada para conter atos que atentem contra a lei e a ordem e que possam sair do controle das forças locais. A tese dos infiltrados foi a primeira versão que bolsonaristas tentaram vender para a mídia. Não colou, por óbvio, caso contrário, teriam sido mais infiltrados do que bolsonaristas. A gravidade de elementos da Força Nacional tentarem espalhar e reforçar a tese golpista é reveladora em si mesma.
Veja no Youtube AQUI
Cena 3: Depois das horas de complacência da PM do DF, permitindo que invasores tomassem conta dos prédios dos Três Poderes e vandalizassem livremente, por volta das 17h iniciou a movimentação de desocupação e prisão dos terroristas. No Palácio do Planalto, a PM encontrou cerca de 40 soldados do Batalhão Duque de Caxias, a Guarda Presidencial do Exército, subordinada ao Comando do Planalto, apáticos sob as ordens de um comandante hesitante. Em vídeo, o comandante das tropas da PM grita com o seu correspondente das Forças Armadas para que seus comandados entrem em forma. Na sequência, um coronel do Exército tenta evitar as prisões dos invasores e é repreendido pelo líder da PM.
Leia no Metrópoles nesse link AQUI e AQUI. O vídeo da discussão sobre as prisões está AQUI.
Cena 4: Desde o início do novo governo há suspeitas de que o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que tem como missão proteger o Palácio do Planalto, e cujo titular é vizinho de porta do presidente Lula, ainda esteja sob o comando de aliados do golpismo. Por esta razão, antes da posse, integrantes do GSI foram impedidos de entrar na sede da transição. A Polícia Federal também faz movimentos para retirar a ABIN – a agência de inteligência – do guarda-chuva do GSI. Esta mesma agência, na manhã de 8 de janeiro, emitiu alertas ao GSI de que estava em curso a incitação à invasão violenta aos prédios públicos no DF. “A inação do Gabinete pode estar relacionada à atuação dos militares para desestabilizar a democracia no Brasil”, avalia a sucursal da emissora alemã Deutsche Welle (DW) no Brasil.
Leia na Deutsche Welle AQUI.
Portanto, o que se viu foi uma ‘falha’ nas quatro linhas de proteção dos palácios presidenciais. A primeira é a PM, subordinada ao governo distrital. E as outras três são compostas por militares e subordinadas ao Ministério da Justiça (Força Nacional) e à Presidência da República (GSI e Guarda Nacional).
As novas convocações de manifestações, a derrubada de torres de energia e o “mandado de prisão” contra o ministro Alexandre de Moraes, inserido no sistema do próprio STF, mais do que um acinte, mostram que os sinais pululam e indicam que Jair Bolsonaro, definitivamente, não é uma carta fora do baralho, como se gostaria de imaginar. Sem cercadinho, ele continua pautando o debate nacional, como o fez nos últimos 4 anos. E o que estamos vendo é uma organização criminosa golpista, infiltrada pelas instituições, com chefes poderosos economicamente e institucionalmente, que jogam uma turba alucinada à frente como cortina de fumaça. E nós olhamos jocosamente a massa insana orar para os pneus, enquanto o movimento vai esgarçando os limites das tais quatro linhas da Constituição, expressão asquerosamente pisada e repisada pelo ex-presidente.
Não é o primeiro mandato de Lula como presidente, mas é como se fosse. Nem Lula e nem o Brasil são os mesmos. É preciso que as verdadeiras forças do bem atuem rápida e precisamente para identificar, dar nomes e prender os mandantes e os golpistas infiltrados nas instituições para evitar que o ovo da serpente ecloda, espalhando por fim o mal por todo o País. Afinal, essa não é uma luta de Lula, é do Brasil, é de todos que defendem valores conquistados duramente pela civilização até hoje.
Com tudo isso, com licença, vou assistir um capítulo do Chicago Fire para conseguir dormir.