Tarefa delicada escrever sobre o divórcio. Com frequência, as separações causam muita tristeza, culpa, decepção, sensação de fracasso, de perda de tempo, sofrimento dos filhos e, principalmente, briga pela guarda, partilha e pensão.
Há inclusive quem veja nele uma forma de enriquecer às custas do outro, a conclusão de um projeto de vida onde até mesmo as heranças de família e os bens particulares de cada um, anteriores ao casamento, são disputados sob as mais descaradas alegações.
Mesmo assim, me perdoem os que consideram se divorciar um pecado, é melhor um divórcio do que se sentir sem saída, desejando ser viúvo ou viúva, e deixar passar em vão o bem mais caro e precioso de cada um, que é o seu tempo de vida. Às vezes, quando a libertação finalmente acontece, pode ser tarde demais.
Nessas circunstâncias, é bem mais sensato encarar essa forma de conclusão do casamento como algo positivo, uma chance para que ambos refaçam as suas vidas, e busquem ser felizes da forma que desejarem e puderem, depois de curada a “dor de cotovelo”, se houver.
O que é o divórcio?
Divórcio é uma das duas formas legais de se dissolver um casamento válido, a outra é a morte.
Não há mais um tempo mínimo para que o divórcio possa ser requerido. Basta estar casado para se divorciar, sem a necessidade de uma separação prévia como ocorria no passado.
E o que é melhor, para o divórcio não é preciso alegar e provar que a responsabilidade pelo término do casamento é de determinado cônjuge, que descumpriu algum dos seus deveres. O divórcio é um direito potestativo, isto é, que depende da vontade de apenas uma das partes. Não adianta o outro “chato” dizer que não quer. É um direito de quem quer se separar.
Além de dissolver o casamento, alterar o estado civil das pessoas, estabelecer a guarda dos filhos e dos animais de estimação, determinar a pensão alimentícia, o divórcio ainda define a partilha de bens que, frise-se, somente poderá ser modificada se for descoberto que havia mais bens, caso em que será necessária a realização de uma sobrepartilha.
Formas de divórcio
O divórcio poderá ser consensual ou litigioso, poderá ser judicial ou extrajudicial.
Divórcio Consensual
É aquele em que as partes chegam a um acordo, antigamente era chamado de “divórcio amigável”. Pode ocorrer tanto da forma extrajudicial ou judicial.
Como nem sempre é fácil chegar-se a um consenso, pode ser muito útil a realização de uma mediação antes de se definir qual a forma de divórcio será adotada.
A imparcialidade, a isonomia entre as partes, a oralidade, a informalidade, a autonomia da vontade das partes, a busca do consenso, a confidencialidade e a boa-fé são princípios que regem a mediação e precisam ser observados.
O mediador será alguém imparcial escolhido pelas partes, que buscará facilitar um acordo entre elas, para que voltem a conversar com o intuito de uma solução consensual. Serão as próprias partes que encontrarão a melhor alternativa para a resolução dos pontos a serem definidos no divórcio. Isso, quando há boa-fé das partes e a raiva não está cegando a razão, pode ajudar muito no desenlace de pontos sensíveis como o valor da pensão, se será guarda unilateral ou compartilhada, e especialmente na partilha de bens.
Uma vez estabelecido o consenso pelas partes, com ou sem a ajuda dos seus respectivos procuradores, ou por meio de uma mediação, as partes poderão optar por um divórcio consensual judicial ou extrajudicial, o que economizará tempo, dinheiro, paciência e dores de cabeça colossais.
Divórcio extrajudicial
Para que ocorra o divórcio extrajudicial não pode haver filhos incapazes, isto é, menores de 18 anos, ou um nascituro, que nada mais é que um bebê em gestação.
Além disso, caso um dos cônjuges seja interditado, o divórcio também não poderá ocorrer da forma extrajudicial, e um terceiro deverá ser nomeado para representar o cônjuge em juízo, na qualidade de curador. Por exemplo, se um dos cônjuges for esquizofrênico, o divórcio precisará ser judicial.
A escritura do divórcio extrajudicial não dependerá de homologação judicial e constitui título hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras. Mesmo sendo extrajudicial, é imprescindível a assistência das partes por advogado ou por defensor público, para que o tabelião possa lavrar a escritura. Pode ser inclusive um único advogado representando as duas partes.
Se houver bens a serem partilhados, eles deverão ser relacionados e apresentada a respectiva documentação, para que haja o recolhimento dos tributos, e seja lavrada a Escritura Pública de Divórcio, sem necessidade de posterior homologação judicial.
O procedimento para o divórcio extrajudicial está detalhado na resolução 35/07 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que é super clara e de fácil entendimento inclusive para leigos.
A partilha evidentemente dependerá do regime de bens adotado, e eventual pagamento de pensão alimentícia também poderá ser ajustado.
A este passo, para entender como será a partilha e a definição dos alimentos, recomendo a leitura dos meus artigos “Casamento, união estável, regime de bens e possibilidades” e “Pensões alimentícias: quem tem direito e quem deve pagar”, publicados aqui na Sler.
Divórcio Judicial
Ele será obrigatório quando houver filhos menores ou interditados, em razão da definição da guarda e visitação dos menores, fixação dos alimentos, quando um dos cônjuges for interditado, e também quando não houver acordo entre os cônjuges.
O divórcio judicial costuma ser mais demorado, doloroso e caro, especialmente se ao invés de ser um divórcio judicial consensual, for um divórcio litigioso.
Destaque-se, ainda, que vários procedimentos determinados no Código de Processo Civil (CPC) para os processos contenciosos de divórcio, também se aplicam para o reconhecimento e extinção de união estável.
Divórcio Litigioso
Nos processos judiciais, mesmos que litigiosos, a busca de uma solução consensual é um imperativo e, para tanto, verifica-se a presença de mediadores judiciais e de conciliadores que poderão ser profissionais de outras áreas de conhecimento.
Enquanto as partes estiverem se submetendo a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar, a requerimento das partes, a o juiz poderá determinar a suspensão do processo.
Os processos litigiosos são mais complexos e o juiz ao receber a petição inicial irá determinar sobre os pedidos referentes à tutela provisória que podem ser os mais variados dependendo de cada caso. Por exemplo, podem versar sobre a decretação liminar do divórcio uma vez que ninguém é obrigado a permanecer casado, a fixação de alimentos provisórios e da guarda provisória dos filhos, eventuais partilhas antecipadas, posse, venda de bens, bloqueios da valores etc., e então ordenar a citação do réu para comparecer à audiência de mediação e conciliação.
Ressalto que as partes deverão estar acompanhadas de seus advogados ou de defensores públicos na audiência de mediação e conciliação, que poderá dividir-se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do direito.
O Ministério Público (MP) somente intervirá quando houver interesse de incapaz e deverá ser ouvido previamente à homologação de acordo, ou quando figurar como parte vítima de violência doméstica e familiar.
Muito importante, quando o processo envolver discussão sobre fato relacionado a abuso ou a alienação parental, o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, deverá estar acompanhado por especialista.
Será competente o foro
I) de domicílio do guardião de filho incapaz;
II) do último domicílio do casal, caso não haja filho incapaz;
III) de domicílio do réu, se nenhuma das partes residir no antigo domicílio do casal;
IV) de domicílio da vítima de violência doméstica e familiar
Nesse tipo de processo, muitas acusações e alegações são trocadas pelas partes, costuma haver a necessidade de prova testemunhal, perícias, e não raro ambas as partes saem perdendo muito.
Divórcio Consensual
No divórcio consensual basicamente haverá a homologação do que for acordado pelas partes, e estando tudo em ordem o juiz irá homologar o divórcio. A petição de divórcio deverá ser assinada por ambos os cônjuges, e nela deverão constar:
I) as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns;
II) as disposições relativas à pensão alimentícia entre os cônjuges;
II) o acordo relativo à guarda dos filhos incapazes e ao regime de visitas; e
IV) o valor da contribuição para criar e educar os filhos.
Caso os cônjuges não cheguem a um consenso sobre a partilha dos bens, o divórcio pode ser homologado e a partilha realizada posteriormente.
Aplicam-se as disposições relativas ao processo de homologação judicial de divórcio, no que couber, ao processo de homologação da extinção consensual de união estável.
Eu sei que não é fácil separar-se com elegância, e às vezes é preciso “engrossar o caldo” e “revolver muita lama”, o que é dolorido e até vergonhoso, mas não precisa ser sempre assim. Um pouco de delicadeza, lealdade e respeito valem muito mais a pena.
Lembre-se, na maioria dos casos está sentado do outro lado da mesa alguém que você já amou, que a você se dedicou, que um dia lhe fez feliz, e que em alguns casos é o pai ou a mãe dos seus filhos. Se tornar um inimigo é algo que lhe diminuí como pessoa, mas se uma baixaria acontecer, lute sem vacilar pelos seus direitos com a ajuda de um bom advogado, mas não seja antiético, não minta. Seja justo!
Gosto demais desse trecho do filme “Os Desajustados”, cujo roteiro, escrito pelo Artur Miller foi vencedor do Prêmio Pulitzer.
“Eu odeio brigar com qualquer pessoa. Quando você ganha, você perde. Você sabe, no seu coração”