Atualmente, é relativamente fácil manter o contato pelas redes sociais com os amigos de infância e da adolescência. Mas quem viveu na época que não existia internet, depois que terminava o ensino médio, quando a turma de amigos se dispersava, muitos contatos se perdiam. Eu vivi a maior parte da minha adolescência na cidade de Santa Maria e estudava no Colégio Maneco (escola pública), e a grande maioria dos meus colegas ingressou em algum curso na universidade (UFSM). Na época, as escolas públicas ofereciam um ensino de melhor qualidade do que as escolas privadas.
Santa Maria é uma cidade universitária e, nos anos 70/80, viveu um movimento de muita efervescência cultural e política. Era época da luta pela redemocratização do movimento estudantil e do Brasil como um todo. Em 1984 foi a grande campanha das “Diretas Já” que resultou na primeira eleição direta para presidente do Brasil em 1989. As experiências vividas, muitas de tensão e enfrentamento, serviram para unir aquela geração que se envolveu e lutou por um Brasil melhor para todos.
Concluído o período de universidade, as pessoas se dispersaram, foram fazer sua vida profissional, se espalharam pelo Brasil e pelo mundo. Com alguns mantive contato, e de outros, pouco tive notícias. Os anos passaram tão rapidamente que eu não percebi que algumas amizades com pessoas muito queridas tinham ficado sem contato. Quando encontrava amigos comuns, ficava sabendo que a fulana ou o fulano tinha tantos filhos e estava morando em tal cidade, mas não muito mais do que isso.
Recentemente, comecei a procurar as pessoas que foram muito importantes para mim na adolescência e no período de graduação na universidade. Hoje está mais fácil de localizá-las. Numa viagem que fizemos de carro até o Nordeste, fui tentando contato com quem morava nas cidades próximas por onde passávamos. Consegui rever alguns amigos e, depois de décadas, quando nos encontramos, a conversa fluiu como se tivéssemos nos visto na semana anterior. Foram encontros deliciosos.
Agora, no mês de setembro, fui a Florianópolis num congresso e aproveitei para rever alguns amigos e lá bati um recorde. Convidei uma amiga, que havia reencontrado pelas redes sociais, para tomar um café e ela logo nos chamou para passar o final de semana na sua casa. Fiz as contas e havia 44 anos que não me encontrava com essa amiga. Eu pensava, como será reencontrá-la depois de tanto tempo? Pelo que eu tinha visto nas redes sociais, ela continuava com valores semelhantes aos do tempo que a conheci e o restante a gente conseguiria resolver mais facilmente.
Chegamos na casa da amiga e ela não precisou nem se apresentar, sentamo-nos e conversamos por sete horas seguidas. Quando alguém ia ao banheiro, logo voltava e perguntava: “Onde foi que parou a conversa?” À noite conhecemos os filhos dela. No dia seguinte, continuamos conversando, vimos fotos antigas, recordamos dos amigos, encontramos outra amiga que fazia 15 anos que eu não a via, passeamos. Um final de semana inesquecível.
Nestas conversas relembramos de coisas que as minhas memórias tinham colocado lá no fundo do baú, e que me trouxeram tantos bons sentimentos. É verdade que nos entristecemos com o rumo tomado por alguns amigos, com a morte prematura de outros, assim como nos alegramos com o sucesso de alguns que estão muito bem. É verdade que alguns amigos queridos do passado hoje possuem valores tão diferentes dos nossos que a conversa só pode se restringir às memórias do passado, pois ao falar do presente, as divergências afloram.
Nossos primeiros amigos são valiosos. Eu tenho escolhido reencontrar amigos queridos do passado que compartilham ainda hoje valores semelhantes aos meus. Podemos ter gênios, opiniões e gostos diferentes, mas quando os valores são opostos, a conversa fica difícil.
Reencontrar amigos é “uma terapia” que nos conecta com a nossa história. Segundo o psicanalista Christian Dunker: “Nossos amigos podem ser a forma de reencontrar, delicadamente, pistas apagadas de nós mesmos.” Então fica aqui a dica, procure seus amigos de infância e adolescência que possuam valores semelhantes aos seus.
Foto da Capa: Acervo do Autor
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