Há uma razão para o ditado: “Você nunca pode voltar para casa”. Não é a mesma coisa. As pessoas mudam, as cidades mudam. Algumas coisas parecem familiares, mas sempre falta algo. Você nunca pode voltar para casa. O lugar para onde você quer voltar existe apenas no passado. Não é mais um lugar, é um nexus de um lugar e um tempo.
Nasci em Brasília e foi aqui que passei muitos anos da minha vida. Entre idas e vindas, a última vez que saí foi definitiva – parece forte usar essa palavra, mas acho difícil que haja um retorno. Há quinze anos moro fora do Brasil e, quando volto para visitar, sinto como se entrasse em uma espécie de limbo, algo que restou da minha própria memória. Você nunca pode voltar para casa. A euforia do retorno vai pouco a pouco cedendo espaço à nostalgia.
As avenidas principais ainda se estendem largas sob o céu interminável, mas o caminho já não é velho conhecido. Está entrecortado, invadido por retornos intermináveis. Aquela cidade de linhas retas virou um emaranhado de ruas, cruzamentos, estacionamentos e carros, muitos carros. Passo por lugares familiares, mas a alma da história está dispersa. Caso Brasília tivesse esquinas, eu diria que cada uma delas fez uma dobra invisível no tempo e fragmentou a minha história. O lugar em si continua a existir, mas aquilo que o tornava “meu” se desfez no tempo e no espaço.
Tenho sempre um roteiro que procuro seguir, mas a cada volta, um pouco do que esperava reencontrar já não está mais lá. O misto quente da padaria não tem o mesmo sabor, a casa onde vivíamos mudou de cor. O parque está diferente, a orla do lago agora está cheia de novos negócios. A cidade continuou, novas histórias foram construídas e eu, que não estava presente para vê-las nascer, estranho. Você não pode voltar para casa.
Porém, tem algo que ainda me encanta. O céu azul com nuvens de algodão que me acolhe silenciosa e incondicionalmente. E por isso volto. E voltarei muitas vezes. Porque tenho certeza de que há um pedaço de mim que ficou preso aqui, entre o concreto das superquadras e o cheiro das primeiras chuvas de setembro e o colorido dos Ipês. Volto porque partir me ensinou que, embora não possa realmente voltar para casa, parte de mim permanece eternamente tentando.
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Foto da Capa: Artur Dias / CC BY-SA 4.0