As palavras deste pai ecoam na minha cabeça desde o momento em que vi a reportagem da jornalista Clarissa Ward, correspondente da CNN, sobre a invasão de um Kibbutz no sábado, 07 de outubro, onde morreram mais de 100 pessoas. Eu não quero escrever sobre este conflito. Eu não tenho conhecimento e nem competência para escrever sobre o que está acontecendo.
Eu preferiria a ignorância total às notícias que invadem minha casa, minha tela de computador, meu celular, todos os dias, todas a horas, todos os momentos. Pensei em abdicar deste espaço de escrita esta semana por não encontrar assunto, por achar tudo o que pensava superficial demais, fútil demais, descontextualizado demais. Eu não quero escrever sobre mortes, sobre ataques, sobre guerras, sobre tragédias. Talvez minha melhor escolha tivesse sido não escrever, mas eu vi o vídeo.
Emily tinha oito anos e morava com o pai em um Kibbutz ao sul de Israel. Na sexta-feira à noite, foi dormir na casa de uma amiga. As famílias eram vizinhas. As câmeras de segurança mostram o momento em que o Kibbutz Be`eri foi invadido às 7 horas da manhã de sábado. Durante dois dias Thomas Hand (foto da capa), um irlandês que vive em Israel há mais de trinta anos, ficou sem notícias da filha. Ele foi resgatado, ela estava desaparecida. Na quarta-feira ficou sabendo que a filha tinha sido assassinada, juntamente com outros moradores da mesma comunidade.
“Eles disseram: nós encontramos a Emily, ela está morta. Eu disse sim! Eu disse sim e sorri. Para mim esta era a melhor possibilidade, dentre as que conhecia naquele momento.”
Thomas representa aqui a dor de milhares de pais e mães. Emily, milhares de vítimas. Não vou falar de lados, pois há dor em todos os lugares, em todas as terras, em todas as pessoas.
Não quero falar da geopolítica, dos direitos, das invasões, das disputas de poder. Não quero falar de ideologia. Não quero falar de religião. Nem de ódio, nem do horror.
Quero falar simplesmente de uma coisa tão utópica quanto o desejo de ver um mundo pacífico, sustentável e igualitário.
O mundo -nós- estamos doentes. Como um vírus, que nos destrói um pouco a cada dia, somos induzidos ao medo, revolta, desconfiança, discriminação, desejos de vingança. Ficamos mais reativos, opinativos, agressivos. Em momentos como estes, em que sofremos pelo sofrimento dos outros, é extremamente difícil exercitar nosso olhar para a possibilidade de haver Paz.
Entretanto, precisamos continuar conversando sobre ela e, mais do que nunca, precisamos nos envolver na sua construção.
Como? Mudando nossa forma individual de ser e pensar. Se esse vírus tem um antidoto, ele só pode estar em nós.
Recorro a música de Flaira Ferro. Sei que ler essa letra dói, pois é um convite à uma observação profunda sobre o mais íntimo que carregamos dentro. Leia, releia, adapte e reflita.
Quero me Curar de Mim
Sou a maldade em crise
Tendo que reconhecer
As fraquezas de um lado
Que nem todo mundo vê …
Fiz em mim uma faxina
E encontrei no meu umbigo
O meu próprio inimigo
Que adoece na rotina …
Eu quero me curar de mim
Quero me curar de mim
Quero me curar de mim …
O ser humano é esquisito
Armadilha de si mesmo
Fala de amor bonito
E aponta o erro alheio …
… Não posso mudar o outro …
Eu quero me curar de mim
Quero me curar de mim
Quero me curar de mim …
… Pra me encher do que importa Preciso me esvaziar
Minhas feras encarar
Me reconhecer hipócrita …
Sou má, sou mentirosa
Vaidosa e invejosa
Sou mesquinha, grão de areia Boba e preconceituosa … Sou carente, amostrada Dou sorriso e sou corrupta Malandra, fofoqueira Moralista, interesseira E dói, dói, dói me expor assim Dói, dói, dói despir-se assim … Mas se eu não tiver coragem
Pra enfrentar os meus defeitos
De que forma, de que jeito
Eu vou me curar de mim
Se é que essa cura há de existir Não sei, só sei que a busco em mim Só sei que a busco …
Me curar de mim Me curar de mim Me curar de mim Me curar de mim
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