Se você se apegar à raiz da palavra “corrupção”, verá que ela vai muito além da questão econômica cuja acepção é corrente. Ou até, no fundo, pode ser também econômica de forma indireta, porque os interesses e adesões muitas vezes escondem uma invisível pecúnia. O fato é que restariam poucas figuras realmente impolutas neste país e, evidentemente, no mundo.
É interessante que a palavra “corrupção” deriva do latim “corruptĭo”, que tem o sentido de “deterioração”. Daí, o cheiro que sentimos por aí, mistura de putrefação com enxofre.
O Houaiss e o Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea, da Academia das Ciências de Lisboa, falam em deterioração, decomposição física e orgânica de algo ou putrefação, modificação, adulteração das características originais de algo, degradação dos valores morais, hábitos ou costumes e, claro, o ato ou efeito de subornar outrem em causa própria ou alheia, além de emprego, por parte de um grupo de pessoas do serviço público e/ou particular, de meios ilegais para, em benefício próprio, apropriar-se de informações privilegiadas.
Ampla a coisa, né?
E fedorenta.
Então, vamos aplicar isso à vida real e pensar em como essa corrupção pode ser ampla. Citemos três exemplos e sejamos isentos ao evitar o reducionismo a uma ideologia.
1) Grana. O usual. Nem requer explicações.
2) À direita, o cientista que endossa teorias terraplanistas, sabendo serem absurdas e contra tudo o que ele próprio estudou. O médico que trai todo o conhecimento comprovado e acumulado para estar alinhado a algum político ignorante e rejeita a vacinação em nome da “causa”, defendendo um placebo sem qualquer comprovação científica. O integrante de minoria que faz vista grossa à homofobia, ao machismo e ao racismo.
3) À esquerda, o suposto humanista que justifica grupo terrorista anticivilizatório adere a discursos nazistas repaginados em seu antissemitismo atávico, empunha bandeira de extremistas obscurantistas, ignora estupros, olha para o outro lado diante de degolas, sequestros e execuções. Chama de “racismo” um movimento de autodeterminação nacional e libertação de um povo sofrido, rejeitado, perseguido e violentado história afora.
Vou confessar. Votei pela primeira vez em 1982, quando marquei o xizinho no Pedro Simon, o representante dos valores democráticos naquela ocasião histórica. Eu tinha 18 anos e vivi o privilégio de, na idade exata, estar habilitado a votar depois da retomada das eleições diretas pra governador. E, desde então, sempre votei na esquerda ou na centro-esquerda. Até que vieram a ignorância do bolsonarismo e o jihadismo de uma esquerda tola (leia a coluna da semana passada). Resultado: mesmo que eu tenha algum candidato de que goste, ele levará corruptos para o centro do poder, porque, como vocês puderam ver nas definições acima, a esmagadora maioria das pessoas está corrompida, seja por grana, por fascismo ou por jihadismo. Anulei o voto em 2024 pela primeira vez na vida, e se o voto fosse facultativo, nem me daria o trabalho de ir mais às urnas. Aliás, foi-se o meu antigo hábito de ler a seção de política do jornal. Pouco me importa o que essas figuras fazem ou dizem. Até cogito fazer campanha “contra tudo o que está aí”.
Por quê?
Porque vem da minha amada Argentina o meu grito:
!Qué se vayan todos!
Estão quase todos corrompidos.
Uns simplesmente por grana, outros por justificação do candidato troglodita inadmissível e ainda aqueles intelectualmente desonestos que, diante do discurso fácil mainstream, defendem o indefensável, pelos tapinhas nas costas. São todos levianos, sejam eles fascistas, negacionistas, jihadistas ou bolivarianos, mas sobretudo irresponsáveis, capazes de fomentar até a violência e a morte em nome de uma bandeira neste asqueroso, engessador e emburrecedor mundo polarizado, cada um do seu jeito e muitos deles com verniz de falsos humanistas. Lixo! Basura! Desprezíveis! Soretes! Asquerosos!
Sempre há uma troca, mesmo que não financeira.
Mesmo que seja intangível, como a aceitação pelos seus pares.
Pela vigarice ou pelo comodismo, sempre ganham algo.
Manga de corruptos! No bolso ou na alma!
Basta de hipocrisia e maldade!
E, sinceramente, ainda sonho com o dia em que eles passarão e eu, assim como a turma da minha bolha lúcida, passarinho.
…
Outro dia, um antissemita desses levianos que pululam por uma esquerda ignorante e leviana quis debater comigo.
Assim respondi, publicamente, numa rede social:
As pessoas perguntam por que um cara cordato como eu grita. Grito porque preciso. Grito porque a mentira não pode se normalizar, e meu sangue é uma combinação de jornalismo e afeição ao justo. Mais: esses elementos naturais e atávicos foram temperados e organizados por minhas formações universitárias: Jornalismo e Direito. !Mira vos! Nada de acaso nisso. Então, digo aqui algumas certezas, contidas neste lema escrito pelo Fernando Brandt e pelo Milton Nascimento e cantado pela minha banda brasileira predileta desde sempre, o 14 Bis: “Pois não posso, não devo/Não quero viver como toda essa gente insiste em viver/Não posso aceitar sossegado/Qualquer sacanagem ser coisa normal.” Dito isso, vamos lá ao maior exemplo de todos: rejeito, esperneio, até agrido e rompo sem possibilidade de volta, com quem nega o direito absolutamente essencial e de uma legitimidade que poucas outras nações têm, de Israel existir e se defender. Esse discurso antissemita (sim!!!), que vejo naturalizado por aí, é uma aberração que precisa ser combatida com ardor. E estou aqui pra isso, com paixão e formação, sangue e cérebro. Não admito! Sou grosseiro, deselegante, agressivo. Não é ideologia. É racismo antissemita, tão grave quanto outros racismos e preconceitos, explícitos ou estruturais, completamente naturalizado nas redes sociais e na vida cotidiana. Por que esse texto? Porque teve alguém querendo debater. Não debato esse assunto tanto quanto um negro ou um homossexual não debateriam uma afronta. É igual! Só está naturalizado, desgraçadamente. Mas jamais pra mim.
…
Shabat shalom!
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