Então a versão argentina da extrema direita ignorante e má repetiu o que fizera por aqui o protagonista do possível efeito orloff. Assim como aquele outro, o brasileiro, homenageou o maior de todos torturadores no plenário do Congresso Nacional, agora Javier “Maulei” relativizou a absurdamente a violenta ditadura argentina de entre 1976 e 1983, pouco se importando com o sofrimento das vítimas e dos familiares das vítimas. Uma crueldade monstruosa, desprovida completamente de empatia!
Mas devo fazer uma ressalva: no caso do Javier “Maulei”, claramente ele é mais “mau” do que “ignorante”, e até por isso eu criei esse apodo.
O sujeito é professor universitário de economia e defende a comercialização de órgãos como uma ação “livre” entre “adultos”.
Se diz “libertário”! Fofo ele!
Se esse cara é professor universitário de economia, então ele sabe muito bem que um miserável não é livre. Que a desigualdade tira a liberdade.
Pense comigo: se você tem um filho que passa fome, venderia um rim pra que ele possa comer? Eu venderia. E não o faria por ser “livre”.
Numa situação normal, eu jamais venderia um rim.
A miséria não me daria alternativa. E isso é tudo, menos liberdade.
Leia texto que escrevi sobre isso aqui mesmo na SLER: (“A distorção da palavra sistema”, em 25/8)
Pois voltemos à defesa monstruosa da ditadura. O Javier “Maulei”, assim como seus ídolos Rafael Videla e Emilio Massera, justificou toda aquela crueldade dizendo que havia uma “guerra” e houve “excessos”.
Esse sujeito, assim como o cara que homenageou torturador em pleno Legislativo, deveria ter os direitos políticos cassados imediatamente.
“Durante os 70, houve uma guerra em que as forças do Estado cometeram excessos”, disse ele, para espanto de qualquer pessoa lúcida.
E ainda acrescentou: “Não foram 30 mil os desaparecidos.”
Num número exato, ele sustenta que “só” foram “8.753”.
Pera aí um pouco! Que é isso, pessoal?!
Onde nós estamos?
A ditadura argentina foi de uma violência abominável!
Isso é escárnio.
Teve corpos jogados do Río de La Plata e no mar.
Tem gente ainda chorando essa tragédia.
Evidentemente, houve reações.
A Secretaria de Direitos Humanos promete publicar um informe oficial sobre as vítimas desse horror, para combater o “negacionismo”.
O discurso de “Maulei” é o mesmo que os criminosos da ditadura utilizaram para tentar justificar suas bandidagens e buscar a impunidade.
O número de 30 mil mortos e desaparecidos é fruto de levantamento rigoroso, com nomes e sobrenomes. Pode ser ainda maior, portanto.
As reações foram fortes.
A mais contundente, a que mais gostei, foi de uma senhora que entrevistei umas três ou quatro vezes na minha vida: Dona Estela de Carlotto, presidente das Avós da Plaza de Mayo.
“O povo tem que despertar”, disse a doce Dona Estela.
“Ainda que pensemos diferente em algumas coisas, precisamos nos perguntar se queremos que esse mentiroso, que mancha a história do nosso país, pode ser o presidente. Não pode ser!”
E acrescentou:
“Ele ofende de maneira brutal às famílias, que ficamos sem nossos filhos e a todas as avós que tivemos uma dupla dor.”
Pelo amor de Deus! Esse cara é monstruoso!
Em entrevista ao jornal Página 12, a “madre” Taty Almeida, disse:
“Nada diferente se pode esperar desse personagem, que não só é negacionista, mas tenta justificar o genocídio.”
Sim, a palavra “genocídio” cabe para o que fizeram os militares na Argentina. Houve uma ação deliberada de eliminar uma geração.
Dona Tati, do alto dos seus 93 anos e de tanto sofrimento, foi muito crua em sua observação, deixando transparecer seu pavor: “De que excesso (Milei) nos fala? Deus meu! Atirar mães, as freiras francesas e não sei quantos mais ao mar nos ‘voos da morte’ pode ser considerado uma guerra? Torturar mulheres grávidas até que tivessem os bebês para depois roubá-los e matá-las é uma guerra? Esses são os excessos a que ele se refere? Aos nossos filhos mataram, eles morreram sob coisas horríveis que lhes fizeram, e agora temos que suportar essas coisas?”
Charly Pisoni (que integra o grupo HIJOS, de filhos dos desaparecidos na ditadura), também para o Página 12, disse algo que também tem sua relevância. “O que importa é que se cometeram delitos atrozes e que assim já reconheceu o Estado em diferentes decisões judiciais”.
Sim! Mesmo que fossem 8 mil mortos e desaparecidos, a crueldade da carnificina ocorrida na Argentina é desumana e injustificável.
O presidente Alberto Fernández postou a frase “Nunca mais!” em suas redes sociais e perguntou como é possível a negação da ditadura que “torturou, assassinou, roubou bebês, gerou desaparecimentos e levou ao exílio milhares de argentinos”. Sim! Como é possível?!
Por favor, queridos amigos argentinos, detenham esse sujeito!
Shabat shalom!
Foto da Capa: Milei e Eduardo Bolsonaro / Reprodução