Tudo que é vivo precisa de cuidado. Grupo, família, qualquer elemento da natureza, principalmente o que é sensível. A atenção está intimamente ligada ao cuidado. O Google me diz: a palavra cuidado é um substantivo masculino. Demonstração de atenção; em que há cautela, prudência: cuidado ao atravessar esta rua! Aplicação e capricho ao realizar algo; zelo, esmero: trabalhava com cuidado.
Pois eis que nesses tempos BANI, como já escrevi tempos atrás aqui, creio que estamos atravessando um período que necessitamos ter mais apreço pela atenção, consequentemente, pelo cuidado. Para quem não lembra ou não sabe: BANI, vem de Brittle, Anxious, Nonlinear e Incomprehensible (frágil, ansioso, não linear e incompreensível). Substituiu o VUCA que é sigla/acrônimo de Volitility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity (volátil, incerto, complexo e ambíguo). Este último representa o período pós-guerra fria, até antes da pandemia.
Estou alguns dias no litoral, mais precisamente em Xangri-lá, no Litoral Norte gaúcho, e tenho acompanhado as movimentações e mobilizações com relação a possibilidade de mudança do plano diretor do município. E, andando pelas ruas, caminhando entre as alamedas, casas, pequenos prédios de dois andares, percebi algumas coisas que estão relacionadas ao cuidado e a atenção. Aqui a maior fonte de poluição é a sonora, provocada pelas máquinas de cortar grama da vizinhança.
A maior parte das casas recebe cuidados dos seus proprietários. No entanto, alguns veranistas têm falta de atenção/noção ou não se importam mesmo com a responsabilidade dos resíduos que geram. Para mim, um grande sobrado, com piscina, gramado entre outros atrativos é inconcebível que seus donos não separem seus resíduos, por exemplo. Esses dias, me deparei com um sofá em ótimas condições em uma das alamedas do balneário, que tem um planejamento diferenciado dos demais. Assim como qualquer cidade ou ecossistema é um organismo vivo. Que se não for bem gerenciado, vai causar problemas.
Ainda bem que temos instituições como o Ministério Público. O MP Estadual e o MP Federal acolhem denúncias, apontamentos de quem está atento e se preocupa com a natureza, com a qualidade de vida de uma região. É claro que tudo depende dos promotores que estão atuando. Mas se há um organismo como o MP para a coletividade, quem está atento às nossas necessidades individuais, à integralidade da nossa saúde?
Hoje, com tantas exposições a redes sociais, a profusão de estímulos da tela é vital para nossa qualidade de vida não nos deixarmos ser capturados pelo mundo virtual. E escrevo isso por mim mesma. É um mega desafio para quem é jornalista ligada, saber dar pausas nas interações. Isso porque quando perdemos a sensibilidade do que nos cerca, sendo iludidos ou até mesmo enganados por informações que não checamos, somos muito mais fáceis de sermos enganados.
No momento em que há interesses de curto prazo que só visam o lucro, que não se importam com o futuro de um local que quase sempre teve suas águas próprias para banho, é fundamental que os moradores e veranistas se deem conta do que está em jogo. A mesma analogia serve para Porto Alegre ou qualquer outra cidade, onde a especulação imobiliária gera e agrava problemas de saúde pública devido à falta de saneamento básico e planejamento urbano (e taí os tantos casos de praias de Santa Catarina nos últimos anos que não me deixam mentir). O Guaíba está poluído por nossa falta de cuidado e de atenção (especialmente na hora de votar!).
Enquanto estamos desatentos ao que é decidido no legislativo e colocado em prática no executivo, árvores cheias de vida são cortadas, novos edifícios são construídos tirando o sol e mudando o microclima da cidade. São singelos exemplos do quanto nossos governantes não estão tendo atenção e nem cuidado com medidas de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. Entendo que essas alterações no funcionamento dos sistemas vivos onde estamos inseridos são fruto da falta de cuidado com o nosso próprio futuro e de nossos filhos, netos.
Tudo isso tem tudo a ver com a falta de atenção de quem vive correndo, priorizando outras coisas. Tudo isso tem a ver com a necessidade de sobrevivência a qualquer preço. Tem a ver com a ausência de cuidado do que esse sistema enlouquecido nos submete. Tem gente que se aproveita desse contexto para obter muito dinheiro. Pois aqueles que vivem para vender, só pensam no lucro a qualquer preço (mesmo que gere poluição, perda de qualidade de vida).
Por tudo isso e mais um pouco, queridos e queridas leitoras, que tenho me dado conta que a atenção e o cuidado são substantivos vivos. É preciso que nos policiemos para termos cuidado principalmente conosco e com o que nos cerca. E muita atenção com os bioindicadores que a natureza nos proporciona. São serviços ambientais que ela nos presta.
Tenho sentido na pele, literalmente, o que faz a falta de cuidado, a falta de atenção comigo mesma. Muitas, tantas vezes é mais fácil observar o vizinho e não olhar para o nosso umbigo. Pois lhe convido a parar uns minutos. Três, cinco ou dez. Respirar fundo. E se sentir. Depois escutar, olhar atentamente o que está a sua volta. Pois quando saímos do ambiente barulhento e cheio de estímulos da cidade ou das telas, acordamos para outras realidades. Camadas de mundos, sintonias que vibram dentro e fora de nós. E aí, você consegue?