Vamos de rima? Faço esta introdução em prosa pra explicar que há muita e literal liberdade poética e assumida subjetividade nas linhas pretensamente divertidas que seguem. Proponho uma brincadeira em versos nesta coluna e peço que, mesmo você sendo de outra “tribo”, embarque na sua leveza sem levar este texto tão a sério, sem se afetar, apesar de que a ironia traduz, sim, uma verdade muito subjetiva do autor (mas não leve isso a ponta de faca). Permito-me confessar e peço compreensão, porque a paixão não tem lógica, você verá logo adiante a que me refiro. Na semana passada, escrevi um texto tão duro, tão difícil, que me permiti nesta semana brincar com as palavras e a paixão. Só peço que você brinque comigo ao lê-lo sem o preconceito e a ranzinzice que muitas vezes são despertadas nesse tipo de traquinagem que de alguma forma, por alguns mais afetados e emocionalmente armados, pode, absurdamente, ser vista como “provocação” (o que, definitivamente, não é). Beijos!
…
Aqui vai:
Recorro ao poema e à poesia
Para contar algo que, enfim,
Numa prosa eu não ousaria
Aqui escrevo uma brincadeira
E alguns vão ler até o fim
E dizer “que baita besteira!”
Mas me adianto já pedindo
Que entendam a galhofa
E, por favor, me leiam rindo
Anda meio fora de estrofe
Falar do que antigamente
Se chamava “Efeito Orloff”
Desta vez até é o contrário
Aqui entrou o Lula
E lá venceu o “libertário”
Aqui varreram o Bolsonaro
E lá expurgaram o Alberto
O descompasso é meio raro
É raro porque reza a tradição
Que os países dialogam
Na convergência da mesma visão
Entre Brasil e Argentina
Sempre se reparou
Que a repetição era uma sina
Ou entre Argentina e Brasil
As coisas se repetiam
E esse era todo um perfil
Logo acima fui imparcial
Variando a ordem da repetição
De maneira intencional
Ressalvo que sou brasileiro
Mas a temporada em que lá morei
Me fez argentino por inteiro
Você verá logo adiante
Que essas péssimas rimas
Têm a parcialidade do amante
Ou seja, não serei isento
E aqui vai uma xarada
Pois paridade é o que eu tento
São tantas coincidências
Que da política à música
Sobram as influências
Lá teve o histórico 1816
E, meia dúzia de anos depois,
O 7/9 foi a nossa vez
Já já citarei Raúl Alfonsín
Sem antes lamentar
Não termos um San Martín
Mas desde Perón e Vargas
Passando por JK e Frondizi
As coincidências são largas
Com o cruzado nos demos mal
E não foi muito diferente
A Argentina do Plano Austral
Veja o caso do Corralito
O Collor também reteve grana
E deixara o povo aflito
Aldo Rico e a Semana Santa
Tiveram aqui o 8 de janeiro
Como a réplica de uma anta
Mesmo na tragédia houve bis
A Cromañon foi antes
Mas não evitou o Caso Kiss
Até na seminal “La Balsa”
Ouvi Lito Niebba revelar
Que rolou uma bossa falsa
Mas aí teria que explicar
E o espaço é curto
Para tanta coisa a contar
Lito, Nito, Andres, Charly, Flaco, Fito
São uma constelação que me faria
Falar e falar e falar até o infinito
Vamos ao ponto, à luz do Sol
Porque adianto que
Misturo política e futebol
Estou chegando ao ponto
E você talvez não saiba
O cúmulo daquilo que conto
As coincidências entre os países
Se deram em episódios lindos
Bem diante dos nossos narizes
Na passagem del diez al once
Vivemos os mais lindos
Dias pátrios do “entonces”
Perdão pelo “portunhol” acima
Recorri a ele de propósito
Pra que coubesse na minha rima
Foram os ápices das nações
Os momentos mais marcantes
De todos os nossos corações
Protagonistas de mesmas iniciais
Fizeram duas nações
Vibrarem como antes jamais
Ambos começam com “erre”
E já estou quase te fazendo
Saber a que este poema se refere
De Ricardo até Renato
Dezembro de 1983
Teve dois dias e um fato
A explosão linda da democracia
Foi seguida no dia seguinte
Do mundo que a gente merecia
Então agora vou revelar pra vocês:
Foi lindo demais o que ocorreu
Entre 10 e 11 de dezembro de 1983
Sacou a brincadeira tricolor?
Muito azul, no céu, na Terra, aqui e lá
E peço aos rivais: não me tenham rancor!
…
Shabat shalom
Todos os textos de Léo Gerchmann estão AQUI.
Foto da Capa: Reprodução de Redes Sociais