Quando falamos da dupla Grenal, na maioria das vezes, nos remetemos às nossas paixões clubísticas, discussões acirradas com parentes e amigos, os jogos memoráveis e as grandes conquistas e derrotas sofridas sem explicação. O futebol, como os esportes de massa de forma geral, tem um papel muito importante nos aspectos de cidadania, educação, do impacto social e, agora, também nas questões ambientais. Aqui no Rio Grande do Sul, o Sport Club Internacional, há 14 anos, desenvolve uma iniciativa pioneira no Brasil na questão envolvendo os resíduos produzidos pelo clube e sua destinação correta.
No ano de 2010, foi criada a Central de Resíduos, no pátio do Estádio Beira-Rio, onde os recicláveis eram separados e destinados à Redecatapoa (Central de Cooperativas de Catadores de Materiais Recicláveis de Porto Alegre). A partir de 2022, a Cooperativa Ascat (Cooperativa de Trabalho dos Catadores de Materiais Recicláveis da Cavalhada), gerenciada por mulheres, foi contratada para recolher os resíduos produzidos pelo clube diariamente e nos dias de jogos, além da coleta no Centro de Treinamento em Alvorada e do Parque Gigante.
O material é alocado na Central de Resíduos e, depois de separado, embalado e pesado, a Cooperativa leva tudo para a sua sede para a comercialização. A renda vinda desse comércio é um acréscimo ao pagamento que já recebem pelo serviço prestado, incrementando o ganho de cerca de 23 cooperados e suas famílias. Além dessa separação, as podas do gramado são compostadas pelo clube e os resíduos de saúde e considerados perigosos são recolhidos por uma empresa especializada.
Toda essa prática rendeu ao Internacional, em 2023, o título de primeiro clube de futebol a obter a Certificação de Gestão de Resíduos da PCN (Ponto de Contato Nacional), organismo de Certificação de Produtos, que é concedido pela Coordenação Geral de Acreditação (CGCRE) do INMETRO.
Pelo lado do Grêmio Football Porto Alegrense, a partir de 2022 os gestores da Arena, estádio do Tricolor, têm uma parceria com a TRASHIN, empresa que implementa e opera programas de gestão de resíduos e logística reversa para instituições que levam a sustentabilidade a sério. Mas desde antes disso o Grêmio já jogava limpo com o ambiente, o que já rendeu ao Tricolor o Selo T Carbono Neutro.
Assim como o rival em campo, a coleta na Arena é realizada diariamente, no setor administrativo, e em dias de jogos é programada, e os resíduos de saúde e com algum perigo são recolhidos por uma companhia especialista.
O destino dos materiais recicláveis é dividido entre o espaço Trashin e a Associação Reciclando Pela Vida, formada por catadores em regime associativo. Nesta parceria, há um aumento substancial na renda de 20 famílias diretamente. Os restos de poda são compostados e devolvidos ao gramado como adubo.
Encontramos aqui dois modelos de gestão de resíduos distintos, um com uma Central de Resíduos construída pelo Clube, contratação direta de uma Cooperativa de Catadores para prestação de serviços e que impulsiona e abre espaços para novos contratos, expandindo o negócio dos catadores. O outro modelo é a contratação de organização privada especializada, que faz a operação e encaminha em torno de 50% dos resíduos recicláveis para uma Associação de Catadores.
O objetivo não é traçar comparativos, isso deixamos para os torcedores e comentaristas do esporte. O que importa aqui, como um dos focos de ação do Coletivo POA Inquieta, é que os dois modelos são eficientes e trazem impactos socioambientais tanto de uma forma direta como indireta, envolvendo direta e ativamente a participação dos catadores. São dois clubes multicampeões em uma mesma cidade, que buscaram práticas sustentáveis e de impacto social, engajados em promover o direcionamento correto dos resíduos e praticando a logística reversa na sua gestão.
Simone Pinheiro é mestra em Ciências Sociais, assessora técnica de associações e cooperativas de catadores e articuladora do POA Inquieta
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