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Eu costumava resistir ao uso da palavra “polarização”, porque, por exemplo, não consigo ver “polarização” quando falamos de um terraplanista em contraposição a alguém que sabe da esfericidade do nosso planeta. Isso não são polos. É ignorância versus lucidez. O mesmo se dá entre detratores e defensores das vacinas e entre quem entende a importância de Israel e o antissemita que se esconde na capa do “antissionismo”.
Logo, faço a ressalva: quando falo em “polarização”, refiro-me a opiniões distintas, que precisam ser respeitadas, mesmo que incompreendidas. Preconceito e ignorância não são “polo”.
Então, agora que está bem claro, vamos lá: a polarização está minando a convivência humana e precarizando o diálogo em diversos setores, da política ao futebol, passando pela saúde.
Enfim, tudo.
Peguemos o futebol. Nos debates com outros gremistas, eu costumo reclamar da absurda desídia da CBF com o Grêmio, que está pagando o preço por ser vítima da maior tragédia ambiental já ocorrida talvez no país (com certeza no RS). Como escrevi na coluna “Futebol é coisa séria?” (7/7/2024), é como se o clube tivesse sido punido por algo grave que provocou – e é o contrário, está sendo punido duplamente e de forma pesada, pela natureza e pela estupidez do futebol brasileiro.
Mas onde entra a “polarização” nisso? Ora, ao reclamar com razão de o meu time ter de jogar todas fora, como se tivesse sido punido a ficar sem o mando de campo num campeonato maratônico de turno e returno (o time viajando permanentemente é um problemão) com descenso, vem alguém contaminado pela lógica da polarização e diz que sou um “passador de pano” nos eventuais erros da diretoria do clube.
Percebem? Mesmo que eu veja erros na forma de conduzir a situação, ao reclamar do fato de o clube estar sendo punido, passo a empunhar uma bandeira, defender uma tese.
A polarização não admite meios tons ou tons intermediários.
A polarização se impregnou nas nossas vidas!
Você defende o direito de Israel existir e se defender? Pronto, você é contra a existência do Estado Palestino e concorda com a violência em um conflito complexo, repleto de contextos.
Você diz que é escandaloso o Bozo homenagear torturador e glamourizar a ditadura, negar a vacina, desprezar minorias e merece ser chamado de “Bozo”? Pronto, você é “comuna”.
Você reclama do sectarismo e do dogmatismo petista e se queixa da leviandade com que o conflito de Israel com o Hamas é tratado? Pronto, você é um direitoso eleitor do Asmodeus.
Você é um social-democrata que acha importante o Estado regulador que diminua as desigualdades sociais e permita a verdadeira livre iniciativa? Pronto, você é um “coletivista”.
Você defende que o conceito de família se abra para incluir casamentos homoafetivos e permitir que crianças órfãs tenham um lar? Pronto, você é contra a família (e é todo o contrário).
Você (voltando ao futebol) pondera que determinado jogador é bom de grupo, domina os conceitos da técnica e muitas vezes é eficiente. Pronto, você passa a ter uma procuração do atleta.
Os exemplos podem ser citados em diversos contextos, não apenas na política. A polarização da sociedade obstaculiza a convivência, desumaniza os interlocutores, precisa ser detida.
Quando a polarização lhe atinge, ela enfia uma bandeira na sua mão, e você passa a supostamente empunhá-la. Você passa a ser visto como defensor de uma tese que normalmente até rejeita.
A polarização precisa ser analisada num enorme divã imaginário. Ela nos afasta e nos brutaliza. Ela nos emburrece. Ela nos isola. Ela nos afasta. Ela é algo absolutamente infernal!
Shabat shalom!
Foto da Capa: Freepik
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