Enquanto você está deitado de bruços na cama, vasculhando a mente para ver se encontra um feriado que lhe permita não ir trabalhar, com aquela cueca de elástico frouxo com um furo na nádega, que deixa passar uma bola, pensando se a feijoada com o resto de miojo de ontem cai bem como café da manhã pra não ter de buscar pão, indiferente ao cachorro raspando a porta com a pata há três horas atrás de comida, o Rodrigo Hilbert já acordou, deu aula em um projeto social de uma favela violenta, foi de ônibus até praia, nadou de sunga branca um crawl perfeito, ajudou a puxar a rede de pescadores artesanais, voltou pra casa a tempo de preparar o café da manhã da família, com pão feito de trigo orgânico cultivado por pastores cegos do Nepal, amassado cuidadosamente por suas mãos fortes, assado no forno que ele mesmo fez com barro tirado do serviço de resgate que ele participou em Brumadinho e frutas orgânicas colhidas na horta.
Enquanto você finge dormir para que a esposa não lhe peça sexo e lhe faça vomitar o excesso de álcool do churrasco de domingo, o Rodrigo Hilbert conversa animadamente com sua esposa e filhos e, depois de despachar os fofinhos pra escola, no carro solar que ele mesmo inventou para zerar as emissões de CO2, dá aquela piscada sacana de olho pra esposa que sai correndo pro quarto com ele no encalço, naquele clima juvenil de começo de relação e, quando ele a imprensa na porta, os lábios se encontram naquela paixão desejosa, a razão dá lugar à carne, os corpos dançam freneticamente ao som de gritos primitivos, um vez, duas vezes, três vezes…
Enquanto você procura aquele aromatizante extraforte de pingar no vaso, tentando mitigar os efeitos daquela mistura de caipirinha, cerveja, feijoada, churrasco e Cebolitos, e sentado no trono segura a cabeça prometendo que nunca mais vai beber assim de novo, repetindo o mantra da semana passada, e retrasada, etc.., o Rodrigo Hilbert, depois do amor selvagem, deixa a mulher dormindo naquela cama imaculadamente branca, que ele mesmo construiu de madeira recolhida na praia, sem fazer um barulho e se dirige ao banheiro pra evacuar e tomar sua ducha, deixando na sua saída um perfume de alfazema selvagem da Floresta Negra.
Enquanto sua esposa te chuta na cama pra levantar, dar comida pro cachorro e arrumar as crianças pro colégio, o Rodrigo Hilbert saiu nu do banho e beijou docemente a esposa dizendo: “-Tá na hora de trabalhar, preguiçosinha”. Depois, sentou-se na cama enquanto ela provava as roupas do dia, dizendo verdadeiramente interessado o que pensa de cada uma delas, a acompanhou até o carro, lhe entregou um pacote de linho com lanche que ele mesmo fez com legumes da horta e uma costela com pouca gordura assada lentamente na churrasqueira solar que ele fez nas últimas férias, e que dentro há um bilhete escrito a mão: “-Eu te Amo, Luz da minha vida”.
Enquanto você só lembra do ano novo por causa das propagandas no supermercado e a contagem regressiva da Globo, o Rodrigo Hilbert construiu uma capela com material sustentável nos fundos de casa para renovar os votos no aniversário de casamento, fez uma serenata surpresa com o Maroon 5 pra comemorar o dia em que se conheceram e plantou árvores de reflorestamento na Amazônia com o nome dela para comemorar a data da primeira comunhão da amada.
Enquanto você vasculha ofertas no ifood pra não ter de cozinhar, o Rodrigo Hilbert fez uma fogueira no pátio pra assar lentamente o bisão selvagem morto por eutanásia depois dele diagnosticar uma doença incurável, aquele que morreu com a cabeça encostada na sua coxa musculosa, sorrindo e com uma lágrima de agradecimento no olho esquerdo, numa campina verde ao pôr-do-sol, e servirá a iguaria em uma tenda que ele montou no pátio com tecidos tramados por órfãos curdos.
Enquanto você compra um Ipad no Mercado Livre pra não ter de ouvir a voz dos seus filhos quando chega do trabalho, o Rodrigo Hilbert vai buscá-los na escola em uma descolada bicicleta de 3 lugares, chega em casa e revisa a matéria dada durante o dia, estuda com eles, conversa olhando nos olhos pra saber dos seus medos e expectativas e depois os leva no pátio de olhos vendados pra conhecer a montanha-russa que ele fez com latinhas recolhidas na praia.
Enquanto você manda a mulher se tratar quando ela vem reclamar que você chega em casa e se enfurna nos xvideos, o Rodrigo Hilbert recebe a mulher no portão com um beijo apaixonado, pergunta se quer que ele lave o carro e pede para ela uns minutos para discutirem a relação depois dela contar detalhadamente como foi seu dia.
Houve um terremoto no mundo masculino quando Rodrigo Hilbert nasceu, como um sinal da extinção da espécie como até então o mundo a conhecia, um salto evolutivo como Darwin jamais sonharia.
O Rodrigo Hilbert é encarnação do anticristo, veio ao mundo pra destruir a família tradicional, com sua beleza, masculinidade, fidelidade, habilidades manuais, artes culinárias, ou seja, empurrou a régua de exigência em um patamar inexequível, induzindo as esposas a fazerem cobranças desmedidas, abusivas e desarrazoadas!
Quantas separações podemos colocar na conta desse Galego? Quantos homens deixaram de descascar laranja e tirar cera do ouvido com a unha cumprida do dedinho pra evitarem a crítica injusta de suas mulheres? O mundo está se tornando cada dia mais tóxico por causa dele e logo teremos de lembrar de aniversários de casamento, dar rosas no aniversário e dizer eu te amo quando sairmos de casa.