Quando vejo enredos que mostram a força da natureza se rebelando contra a estupidez humana, volto lá no Noé, no Jonas, no Pinóquio, na Moby Dick, na tragédia ambiental muito real que ainda nos atinge aqui no extremo sul do Brasil…
Ou seja, a vida é um enorme clichê.
Certo estava o gênio Renato Russo quando indagava sobre “quais as palavras que nunca são ditas”.
O clichê muitas vezes se torna clichê por ser verdadeiro e, sendo verdadeiro, se repete até ganhar o sobrenome de “surrado”.
Por ver muito fascínio nessa simbologia toda, da natureza que se rebela contra a estupidez humana (fala, profeta Spinoza!), me senti atraído pelo filme Under Paris (Sob as águas do Sena).
Gostei bastante e só depois vi que ele está sendo comparado ao Tubarão, o espetacular clássico do Spielberg.
Mas, pessoal, Sob as águas do Sena é muito mais que um filme-catástrofe. Tem muitos simbolismos atualíssimos ali.
Vamos a alguns, incorrendo em clichês surrados que, infelizmente, são devastadoramente verdadeiros.
A eles.
1 ) O tubarão enorme que percorre os escaninhos subterrâneos do Sena é um animal que se modificou (se adaptou) para sobreviver em meio à poluição e se tornou um monstro muito assustador, com uma capacidade mortífera.
2 ) As autoridades aparecem cegadas pela ganância, pelos dividendos financeiros e eleitorais, e, além de serem cínicos cúmplices dessa devastação ecológica, abusam do negacionismo, com as previsíveis consequências desastrosas.
3 ) As pessoas em geral, incluindo atletas que se preparam para uma competição de alta relevância (e por isso o foco da mídia é enorme), ignoram o que está sob seus pés e levam uma vida normal, despreocupada. São os alienados de sempre.
4 ) A protagonista, Sophie, viveu no passado uma tragédia familiar que se assemelha ao avanço das figuras monstruosas representadas pelo tubarão, e aqui não falo só de ecologia. O marido dela e amigos foram devorados anos antes por tubarões.
5 ) Sophie sofre durante todo a filme alertando o público para o perigo de tubarões transformados em monstros implacáveis. Mostra que eles estão presentes entre nós. Enfrenta a incredulidade das pessoas diante do perigo iminente.
6 ) Ecologistas desavisados, ingênuos e idealizadores defendem os direitos dos tubarões e sustentam que são animais inofensivos. Quando veem, a vida real impôs a necessidade do Muro da Mauá e da contenção de monstros assassinos.
7 ) Com uma linha vermelha do sangue derramado, o filme mostra os monstros se alastrando pelas grandes metrópoles mundiais, além de Paris, em uma tragédia que partiu do drama local e se espalhou pelo mundo, devastando nossa existência.
Sete pontos, o cabalístico sete.
Pense nesses símbolos.
Reflita sobre quão poderosas são as mensagens e quão verdadeiros são os clichês, surrados de tão reais.
E perceba, a moral da história vai muito além do Sena, do Muro da Mauá ou de Gaza. É tudo isso e muito mais.
O bom senso urge por lucidez.
…
Shabat shalom!
Foto da Capa: Reprodução do Youtube
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