Numa pesquisa realizada com brasileiros acima dos 18 anos em 2018, 92% das pessoas afirmaram ter medo de chegar à velhice. Problemas com a saúde foram o principal motivo, com 70% dos votos. Em seguida, estavam as limitações físicas, com 64%. No terceiro lugar, com 55%, ficaram os problemas de memória.
Vai triplicar o número de casos
O número de pessoas com mais de 65 anos no mundo deve dobrar, passando de 761 milhões em 2021 para 1.6bilhão em 2050, conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS). À medida que a população global de pessoas idosas continua a aumentar, espera-se também que o número de pessoas que vivem com demência cresça, atingindo aproximadamente 139 milhões de casos até o ano 2050. Os casos de demência devem aumentar proporcionalmente mais em nações de média e baixa renda – na América Latina vão triplicar –, sobrecarregando os sistemas de saúde e as famílias. Considerando os dados do último Censo, o Brasil conta com 32.113.490 pessoas de 60 anos ou mais. Atualmente, cerca de 1,2 milhão pessoas vivem com alguma forma de demência e 100 mil novos casos são diagnosticados por ano no país.
Afinal, o que é mesmo?
O Alzheimer é uma síndrome degenerativa e irreversível, que resulta em perda progressiva ou persistente de memória e capacidade de raciocínio. A demência é todo estado de deterioração mental, geralmente de caráter progressivo e com causas variadas, ainda não completamente explicadas.
No caso do Alzheimer, a doença é progressiva e os sintomas podem ser divididos em três “fases”:
– Leve: falhas de memória e esquecimentos constantes; dificuldades em realizar tarefas complexas (como cuidar das finanças);
– Moderada: o paciente já necessita de ajuda para realizar tarefas simples, como se vestir;
– Avançada: o paciente necessita de auxílio para realizar qualquer atividade, como comer, tomar banho e cuidar da higiene.
Por causa de suas características, são fundamentais a atenção para identificar os sintomas em sua fase inicial, pois quanto mais cedo o diagnóstico mais instrumentos se terá para administrar e buscar conter a doença, e o cuidado da família ou de um/a parceiro/a de cuidado em suas fases.
A ciência ainda não encontrou tratamentos para curar ou regredir a condição da pessoa com a doença de Alzheimer ou demência, mas grandes investimentos continuam sendo feitos na área.
Adivinha quem cuida?
Conforme a Pesquisadora Emérita da Fundação Oswaldo Cruz – Fiocruz, Maria Cecilia Minayo, que conduziu o Estudo Idosos Dependentes – Desafio para a Família, a Sociedade e a Estado, ela identificou que as cuidadoras familiares são 84,5% do sexo feminino, na faixa dos 40 aos 80 anos, em geral filhas, irmãs, sobrinhas, netas e cônjuges da pessoa dependente, sobrecarregadas e, muitas vezes, precisando abandonar suas próprias vidas para realizar o cuidado. Muitas passam a sobreviver da renda da pessoa cuidada, ficando com uma enorme dificuldade de retornar ao mercado de trabalho e retomar suas carreiras.
O estigma atrasa
Um importante aspecto a ser levado em consideração é o estigma social sobre a doença. Muitas vezes por causa dos preconceitos e estereótipos que cercam a doença de Alzheimer e as demências, as pessoas demoram a buscar o diagnóstico, atrasando o tratamento. Essas dificuldades acontecem com a população em geral, que por falta de conhecimento, estigmatiza o Alzheimer e as demências como uma “maldição”, “um fim”, “a morte em vida”, “tragédia”, “tortura”… Assim, por causa do medo, não se informa adequadamente e não se previne.
Outro aspecto do estigma são as aparentes ações bem-intencionadas, quando a pessoa com a condição de Alzheimer ou demência é tratada, inclusive pelos profissionais de saúde e seus próprios familiares, de forma infantilizada, tolhendo sua independência ou autonomia, tratando-a como menos capaz e inteligente, passando a enxergá-la como um diagnóstico em vez de se relacionar com ela como a pessoa que é. Enfrentando este preconceito, a autora britânica Wendy Michell é um exemplo maravilho. Ela foi diagnosticada com Alzheimer há uma década: “Um diagnóstico de demência não é o fim da sua vida, mas o início de uma nova e diferente vida. De fato, não uma escolha que alguém faria, mas se você pensar nela como uma vida diferente, uma vida de adaptação, isso fará com que ela valha a pena ser vivida”, disse quando lançou no fim de abril 2023 seu livro “O que eu gostaria que as pessoas soubessem sobre demência”
Bem-estar e felicidade fazem diferença
No Relatório Mundial da Felicidade 2024, um capítulo inteiro foi dedicado para apresentação de estudos a respeito do envelhecimento e associações entre bem-estar e demência. Nele, constata-se que “um conjunto crescente de evidências sugere que o bem-estar pode ser um alvo promissor para os esforços de prevenção da demência, dadas as suas associações com uma melhor saúde cognitiva e menor risco de demência. No entanto, a ciência da prevenção da demência ainda está muito longe de prevenir todos os casos. Assim, é também crucial avaliar e implementar estratégias para apoiar o bem-estar das pessoas que vivem com demência e dos seus parceiros de cuidados”. Importante salientar que temos aqui claramente apontados três públicos: Quem precisa se prevenir, quem já está acometido pela doença, quem cuida.
O preço é alto
No Brasil existe o Projeto Caad – Análise de Custos Associados à Demência, iniciado em 2011, que é o primeiro estudo do gênero, coordenado pela professora Ceres Ferreti, onde se faz uma análise monetária dos custos diretos e indiretos das famílias de pacientes com demência. Conforme a professora Ceres nos conta, “os primeiros resultados, publicados em 2015, revelaram que 60% desses custos estão atrelados ao pagamento de um cuidador profissional ou de uma instituição de longa permanência. Já os últimos resultados, de 2018, mostraram que a média mensal de gastos por paciente entre as três fases da doença é de US$ 1.379,02”. Com a desigualdade brasileira, como garantir um cuidado adequado para a pessoa com a doença de Alzheimer ou demência, considerando esse valor alto e a previsão de que os casos triplicarão nos próximos anos?
Essa realidade reforça não só a importância da existência de políticas de Estado para apoiar a amparar famílias cuidadoras de pessoas com demência, como também políticas para desmistificar, educar e implantar ações não farmacológicas como as citadas pelo Relatório Mundial da Felicidade 2024 que promovam o bem-estar e atuem na prevenção e, inclusive, no tratamento de casos de Alzheimer e demências.
O medo de envelhecer é grande entre os brasileiros. E, uma das razões é porque nele pode estar o risco da doença do Alzheimer e das demências. Mas qual é a melhor forma de lidar com o medo se não encarando e lidando com ele de frente? Em que medida isso se aplica a você?
Leia mais textos de Karen Farias aqui.
Foto da Capa: Freepik